Carta de Marcos Dias, pai da aluna Luana Dias ao Reitor da PUC-Rio

Carta à Vossa Magnificência Reitor da PUC-Rio

Magnífico Reitor Pe. Josafá Carlos de Siqueira, S.J.

Eu me chamo Marcos Dias, pai da aluna, melhor dizendo ex-aluna, Luana Aparecida Souza Dias, do curso de pós graduação Comunicação e Imagem oferecido pela Coordenação Central de Extensão.

de Luana Dias via Guest Post para o Portal Geledés

Lendo sua mensagem de saudação em que expressa os sentimentos de pertencimento das pessoas à PUC e manifesta à sociedade valores que norteiam esta instituição. E, em um dos valores, o segundo valor, diz respeito à abertura para o diálogo interdisciplinar e interdepartamental com a abertura de perspectivas futuras para um diálogo mais estreito entre os diferentes saberes científicos.

Minha filha excedeu o número de faltas à aula de Leitura de Imagem I. As faltas foram por conta de duas viagens a trabalho (BH) e participação na abertura e encerramento do Encontro de Cinema Negro.

As justificativas e declarações das atividades sequer foram analisadas; o professor foi irredutível e disse que “não estava pedindo justificativa e sim comunicando a reprovação”. Em reunião com a coordenação, a coordenadora, por sua vez, também foi irredutível, insensível e informou que ela deveria solicitar o cancelamento do curso.

É de estranhar que uma instituição que tem projetos de inclusão coloque barreiras e regras inflexíveis que impedem que alunos que queiram estudar prossigam em sua caminhada. Não se solicita privilégios mas que se leve em conta as justificativas apresentadas. A aluna foi diretora de produção do curta metragem “Vó Leontina” que narra a saga de uma mulher negra e sua família na preservação da cultura e saberes tradicionais; e para esta aluna, também negra, mulher, bolsista era de fundamental importância participar do evento Encontro de Cinema Negro no qual cineastas negros produzem cinema, valorizando a identidade da cultura brasileira e africana a fim de tirar da invisibilidade a riqueza da cultura, herança dos nossos ancestrais tão pouca conhecida no Brasil. Ademais, em uma mesa de debates pós sessão, a aluna se apresentou como aluna da PUC, demonstrando aquele sentimento de pertencimento expresso em sua mensagem.

Creio que o valor para o diálogo interdisciplinar e interdepartamental pressupõe também diálogo com cada interessado; pois nos dizeres da aluna “a coordenação e a PUC estão cortando alunos injustamente e que querem estudar. E deveriam rever o regimento do curso. Afinal, uma instituição de ensino deve se atentar às particularidades de cada discente e rever seus regimentos, analisar caso a caso e tentar, da melhor forma, manter o aluno na instituição. A escola e universidade (a educação como um todo), deve incluir o aluno e não excluir.”

E convenhamos , não há absoluto diálogo quando se ouve “não vão aceitar sua matrícula mais, para mim você está desligada do curso” e, há um impedimento de assistir as aulas.

Ontem li em artigo da Folha de São Paulo algo sobre ‘gentrificação’ que funciona como um filtro social expulsando legalmente, pelas leis de mercado, antigos moradores. Desculpe-me, mas me veio à mente uma analogia com a PUC, neste momento, onde percebo uma ‘gentrificação’ educacional e cultural excluindo aqueles, mesmo com acometimento de deslizes às regras, que querem efetivamente agregar saberes outros.

Senhor Reitor, embora eu esteja escrevendo-lhe, na verdade, o destinatário desta carta é a minha filha; como forma de amparo e solidariedade pois quando recebi seu ‘e-mail’ relatando o ocorrido, interpretei como um pedido de socorro e apoio e senti que ela estava sem ‘chão’; entretanto, digo, mantenha-se de pé estou aqui como base de sustentação. É tarefa básica de um pai estar junto quando um filho precisa.

Cordiais saudações.
Marcos Dias,

** Este artigo é de autoria de colaboradores ou articulistas do PORTAL GELEDÉS e não representa ideias ou opiniões do veículo. Portal Geledés oferece espaço para vozes diversas da esfera pública, garantindo assim a pluralidade do debate na sociedade.

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