CIDH condena ação policial que resultou na morte de 9 pessoas em Paraisópolis, Brasil, e chama o Estado brasileiro a reformar seus protocolos de segurança

A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) manifesta sua preocupação a respeito da informação de que 9 pessoas perderam a vida e outras pessoas ficaram feridas após uma ação policial na Favela de Paraisópolis, São Paulo, Brasil. A esse respeito, a Comissão insta o Estado a investigar forma imediata e imparcial e punir os responsáveis ​​por esses atos, bem como a reparar às vítimas e seus familiares.

Da OAS

Logo da CIDH
(Foto: Imagem retirada do site ANADEP)

Segundo informações obtidas pela CIDH, uma ação da polícia militar do estado de São Paulo, em 1º de dezembro, teria gerado pânico e tumulto entre os frequentadores de uma festa popular de rua – “baile funk” – na Favela de Paraisópolis. Na tentativa de evacuar o local, as pessoas teriam pisoteado as outras, resultando em 9 pessoas mortas, incluindo dois adolescentes de 14 e 16 anos, e ao menos 7 feridos.

Segundo a Secretaria da Segurança do Estado de São Paulo, a ação da polícia militar ocorreu durante uma operação na Favela de Paraisópolis, quando dois homens de motocicleta dispararam contra as tropas e fugiram para uma festa popular, ainda atirando, gerando tumulto entre os frequentadores do evento. Por outro lado, vítimas e testemunhas da tragédia afirmam que os policiais teriam fechado a rua onde estava ocorrendo a festa, utilizando gás lacrimogêneo e balas borracha contra as pessoas presentes, sem que houvesse um confronto. Segundo informações públicas e vídeos disponíveis, os policiais cometeram maus tratos e abusos de maneira indiscriminada contra jovens que se dispersaram na área de atividades culturais. Da mesma forma, a CIDH tomou conhecimento de que o serviço de atendimento médico de emergência que havia sido acionado para prestar atenção imediata às vítimas teria sido cancelado em seguida, a pedido dos agentes do Corpo de Bombeiros, com um forte indício de omissão que deve ser rigorosamente investigado.

A Comissão condena categoricamente essa ação policial e insta o Estado a iniciar, sem demora, uma investigação séria, imparcial e eficaz dos fatos, orientada a determinar a verdade, assim como a individualização, julgamento e eventual sanção dos responsáveis por esses fatos. Além disso, a Comissão lembra ao Estado o seu dever de reparar às vítimas de violência e suas famílias.

A CIDH, por diversas vezes, manifestou preocupação sobre o uso excessivo da força policial, particularmente no que diz respeito aos altos níveis de letalidade policial, seu impacto desproporcional sobre as pessoas afrodescendentes e o uso da força policial em contextos de protestos pacíficos. No mesmo sentido, durante sua visita in loco ao país, em novembro de 2018, a Comissão identificou que, em um contexto de discriminação estrutural, as forças policiais também realizam operações focadas em comunidades pobres e com alta concentração de pessoas afrodescendentes sem a observância das normas internacionais de direitos humanos e sem a existência de mandatos judiciais.

Nesse sentido, a Comissão chama o Estado a adotar as medidas necessárias para reformar o direito interno, em âmbitos federal e estadual, e harmonizá-lo com os padrões interamericanos e universais de direitos humanos relativos ao uso da força em intervenções policiais, observando os princípios de excepcionalidade, necessidade, proporcionalidade e legalidade.

Da mesma forma, a CIDH recorda que o Estado deve garantir a participação das comunidades no desenho de estratégias e mecanismos de supervisão que visem melhorar a atuação dos agentes policiais, bem como empenhar esforços e adotar medidas legislativas para reverter a militarização da polícia. Finalmente, a CIDH chama o Estado brasileiro a revisar seus protocolos de segurança com um foco em direitos humanos.

A CIDH é um órgão principal e autônomo da Organização dos Estados Americanos (OEA), cujo mandato surge a partir da Carta da OEA e da Convenção Americana sobre Direitos Humanos. A Comissão Interamericana tem como mandato promover a observância e defesa dos direitos humanos na região e atua como órgão consultivo da OEA na temática. A CIDH é composta por sete membros independentes, que são eleitos pela Assembleia Geral da OEA a título pessoal, sem representarem seus países de origem ou de residência.

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