A morte do jovem negro Michael Brown pelas mãos de um policial no estado de Missouri e os protestos que ocorreram desde então voltaram a evidenciar como os Estados Unidos não conseguiram se livrar de suas tensões raciais.
Brown estava desarmado quando um policial atirou nele há uma semana na pequena cidade de Ferguson, um subúrbio de St Louis de maioria negra, mas com uma polícia majoritariamente branca.
Nos dias seguintes, Ferguson tornou-se palco de uma batalha entre as autoridades e dezenas de manifestantes que reprovavam o comportamento da polícia, enquanto vigílias e minutos de silêncio foram realizadas em várias cidades.
Na madrugada deste domingo, houve confrontos entre a polícia e um grupo de 150 pessoas que se recusou a obedecer um toque de recolher estabelecido pelo governo do estado. Sete pessoas foram presas e um homem, segundo a polícia, foi baleado – as circunstâncias ainda não foram esclarecidas.
O presidente Barack Obama, o primeiro presidente negro do país, falou diversas vezes sobre o ocorrido, ordenou investigações independentes sobre a morte “de partir o coração” do adolescente e revelou sua preocupação com a “guinada” que tinham tomado os acontecimentos no Missouri.
A magnitude do caso e seu amplo impacto econômico, social, político e midiático se explicam porque reflete uma das questões mais sensíveis do país: a desigualdade racial.
De acordo com diferentes estudos, os negros nos Estados Unidos têm menos riqueza e menos renda do que os brancos, são mais suscetíveis de serem presos e têm menos chances de concluir um curso universitário.
A BBC Mundo aponta cinco áreas que refletem a desigualdade racial nos Estados Unidos.
Para cada US$ 6 com os brancos, os negros têm US$ 1
“Há uma desigualdade de renda extraordinária entre as raças.” Esse é um dos pontos-chave de um estudo apresentado em 2013 pelo Instituto Urban, especializado em análise econômica, com sede em Washington.
A análise concluiu, com base nos valores relativos a 2010, que os brancos têm, em média, seis vezes mais patrimônio do que negros e hispânicos (US$ 632 mil ante US$ 103 mil), uma relação que aumentou quando comparada com a média de 1983.
Ao mesmo tempo, a renda dos brancos em 2010 foi de US$ 89 mil em média, enquanto os negros obtiveram a metade, US$ 46 mil.
A isso se soma o fato de que as famílias negras foram afetados de forma “desproporcional” durante a recente crise econômica: sua riqueza caiu 31%, enquanto a dos brancos foi afetada em 11%, de acordo com o estudo.
Há 20 vezes mais condenações de negros por casos parecidos
Segundo a Comissão de Sentenças dos Estados Unidos, uma agência independente na área de Justiça, os homens negros receberam sentenças 19,5 vezes maiores que os brancos em situações semelhantes entre 2007 e 2011.
Comparado a outros períodos, essa diferença foi consideravelmente mais perceptível: entre 2003 e 2004 a disparidade foi de 5,5%, enquanto entre 2005 e 2007 foi de 15,2%, de acordo com a comissão, que enviou seu relatório ao Congresso dos EUA em 2012.
Apesar de os negros serem 12% da população do país, representam 40% das pessoas presas dos EUA, segundo informou em agosto a Universidade de Stanford, na Califórnia.
Além disso, os homens negros têm seis vezes mais chances de serem presos que os brancos e 2,5 vezes mais que os hispânicos, de acordo com um relatório do The Sentencin Project, uma instituição que pede um sistema criminal mais justo.
Três vezes mais expulsões e suspensões escolares
O Escritório de Direitos Civis do Departamento de Educação dos Estados Unidos descobriu que estudantes negros são suspensos e expulsos três vezes mais do que os brancos (16% ante 5%) nas escolas.
Além disso, as meninas negras são suspensas mais do que as meninas de qualquer outra cor ou etnia, de acordo com estatísticas do escritório, apresentado em março deste ano.
Apesar destes números, a distância entre negros e brancos diminuiu quando considerados os níveis escolares do ensino médio.
Agora, para cada dez brancos que recebem este diploma, nove negros também se formam, segundo dados analisados pelo Pew Research Center, com sede em Washington.
A diferença, no entanto, é visível no desempenho nas universidades: os brancos com mais de 25 anos têm mais chances do que os negros de concluir uma licenciatura (34% ante 21%).
Percepção de tratamento injusto pela polícia
A maioria dos negros considera que os negros são tratados mais injustamente pela polícia.
Desde a morte de Michael Brown, centenas de pessoas protestavam para pedir um tratamento policial mais justo.
Parte desse desejo está ancorada na percepção de que a polícia geralmente trata os negros pior do que os brancos.
De acordo com uma pesquisa do Pew de 2013, 70% dos negros e 37% dos brancos acreditam que isso ocorre.
É um número que se repete em outras áreas: 68% dos negros acreditam que eles são tratados mais injustamente nos tribunais, 54% no trabalho e 51% nas escolas públicas.
Brancos também consideram que alguns negros são tratados de forma mais injusta, mas em uma porcentagem muito menor: 27% dos brancos acreditam que os negros se saem pior nos tribunais, 16% no trabalho e 15% em escolas.
Isso mostra que a desigualdade racial nos Estados Unidos é um problema que também é influenciada pela percepção.
Os que menos têm casa própria
Uma análise de julho deste ano do Census Bureau mostrou que a população negra é a que menos tem casa própria, abaixo da média nacional.
Enquanto 73,4% dos brancos tinham uma casa no final do ano passado, esse número foi de apenas 43,2% para os negros. A taxa para os hispânicos foi de 45,5% e a média nacional era de 65,2%.
Estes números são importantes porque a compra de imóveis é um dos elementos mais importantes para acumular riqueza.
Para os negros, o problema é duplo: não só é menos provável que comprem um bem, mas os bens adquiridos se valorizam menos, de acordo com um relatório de fevereiro de 2013 da Universidade de Brandeis, em Massachusetts.
A universidade descobriu que casas de negros são menos valorizados por fatores como a segregação residencial, ou porque os brancos são mais capazes de ajudar financeiramente a família.
O estudo destaca que os negros são mais propensos a ter hipotecas de alto risco e são mais vulneráveis a execução de hipotecas e à volatilidade dos preços.
Fonte: BBC Brasil