De Viola Davis ao Brasil: websérie com mulheres negras em destaque

Discurso da atriz na cerimônia do Emmy vai de encontro a projeto que conta as histórias das mulheres negras sob a ótica das mulheres negras

Por  Djamila Ribeiro, da Carta Capital 

Foto: Gabo Morales

No domingo, 20, a atriz Viola Davis foi a primeira mulher negra a ganhar um Emmycomo melhor atriz em série dramática em 67 anos. Isso diz muito sobre como a mídia retrata a mulher negra.

Viola fez um discurso emocionante. Citando Harriet Tubman, disse “em meus sonhos e visões, eu via uma linha, e do outro lado da linha estavam campos verdes e floridos e lindas e belas mulheres brancas, que estendiam os braços para mim ao longo da linha, mas eu não conseguia alcançá-las”. E finalizou: “Deixem-me dizer uma coisa: a única coisa que separa as mulheres negras de qualquer outra pessoa é a oportunidade. Você não pode ganhar um Emmy por papéis que simplesmente não existem”.

O discurso de Viola, além de mostrar a falta de oportunidades para mulheres negras nos EUA, vai ao encontro do objetivo de um projeto muito interessante, o Empoderadas, criado por mulheres negras brasileiras.

Contar a história sob o nosso ponto de vista, talvez possamos definir assim o objetivo da websérie Empoderadas que pretende entrevistar e contar a história de mulheres negras de diversas formações e áreas de atuação. Um trabalho de protagonismo que, ao mesmo tempo que coloca a mulher negra num papel destaque, denuncia a invisibilidade dessa mulher na mídia hegemônica.

O projeto foi concebido pelas cineastas Renata Martins e Joyce Prado que se incomodavam com o modo como a mulher negra é retratada pela mídia. “Há uma construção histórica, ideológica, violenta e equivocada entorno do ‘ser mulher negra’. Essa construção passar por vários símbolos que se tornaram signos ao longo da história: tom de pele, textura do cabelo, largura do nariz, quadril, ausência de capacidade intelectual, entonação da voz, entre tantos outros. Estas significações sempre utilizadas de forma violenta tentam negar a nossa humanidade, subjetividade e individualidade, pois, nos forçam ser uma, quando na verdade, somos várias. No entanto o que se perpetua historicamente são os estereótipos reiterados por vários suportes midiáticos.”, explica Renata.

Leia Também 

Viola Davis é a primeira negra a ganhar o prêmio de melhor atriz no Emmy e faz discurso emocionante

Já foram produzidos diversos vídeos, sendo que um dos últimos com a MC Soffia, uma rapper de apenas 11 anos, viralizou na internet por mostrar a consciência e visão dessa jovem mulher negra.

“Comecei a perceber que a cumplicidade entre nós era muito grande e sinto que ela vem a partir das experiências que compartilhamos como mulheres negras. Não temos a mesma idade, os mesmos conhecimentos e experiências, mas mesmo assim compreendemos umas às outras e compartilhamos de algo que é meio indescritível que tem a ver com identidade e identificação. É mais forte do que empatia”, diz Joyce

Num país que teve quatro gerações de paquitas loiras, dizendo abertamente que meninas negras nunca poderiam participar daquele grupo, e que ainda insiste em manter mulheres na invisibilidade ou em papéis que reforçam estereótipos, o discurso emocionado e Viola e a websérie Empoderadas cumprem um papel importante.

“Pensar em imagens e em representação de mulheres negras é pensar de como eu gostaria de ser vista e o projeto tem possibilitado me apresentar para sociedade mediada por mulheres muito parecidas comigo; mulheres fortes, apaixonadas, sensíveis, frágeis, talentosas, feridas, resilientes, criativas, contraditórias, inspiradoras, enfim, humanas. O Projeto Empoderadas nada mais é do que uma forma de existirmos juntas”, finaliza Renata.

79ad7c67-8b80-469a-92e6-bdacabac30daA atriz Viola Davis é a primeira mulher negra a ganhar um Emmy como melhor atriz em série dramática em 67 anos. Foto: Valerie Macon / AFP

+ sobre o tema

A cor do pecado: no século xix, a sensualidade da mulher negra

______________________   Resumo Esta pesquisa tem por objetivo principal analisar a presença...

Bruna da Silva Valim é primeira negra a representar SC no Miss Universo Brasil

Bruna da Silva Valim, candidata de Otacílio Costa, foi...

A Mulher Negra Guerreira está morta…

Há poucas horas, enquanto lutava com a realidade de...

Elizandra Souza celebra 20 anos de carreira em livro bilíngue que conta a própria trajetória

Comemorando os 20 anos de carreira, a escritora Elizandra...

para lembrar

Fusão ministerial é “apagão histórico”, afirmam juristas e especialistas

O Instituto Patrícia Galvão ouviu juristas, especialistas, pesquisadores e...

Manifesto Coletivo Autônomo de Mulheres Pretas

Nós, ADELINAS - Coletivo Autônomo de Mulheres Pretas, da...

Programa Justiça Sem Muros do ITTC lança campanha sobre visibilidade ao encarceramento feminino

Inspirado na arte de Laura Guimarães, o programa Justiça Sem...

Professores, técnicos e alunos poderão usar o nome social na Uepa

A Universidade do Estado do Pará (Uepa) passa a...
spot_imgspot_img

Comida mofada e banana de presente: diretora de escola denuncia caso de racismo após colegas pedirem saída dela sem justificativa em MG

Gladys Roberta Silva Evangelista alega ter sido vítima de racismo na escola municipal onde atua como diretora, em Uberaba. Segundo a servidora, ela está...

O atraso do atraso

A semana apenas começava, quando a boa-nova vinda do outro lado do Atlântico se espalhou. A França, em votação maiúscula no Parlamento (780 votos em...

Uma mulher negra pode desistir?

Quando recebi o convite para escrever esta coluna em alusão ao Dia Internacional da Mulher, me veio à mente a série de reportagens "Eu Desisto",...
-+=