A declaração de Juliana Paes e o feminismo que precisa ir além do argumento raso

O feminismo é uma luta social e coletiva. É sobre cada mulher, é sobre todas nós.

Por Stephanie Ribeiro, do HuffPost Brasil

Juliana Paes e Fábio Assunção em cena da novela “Totalmente Demais”, exibida em 2016.

Em recente entrevista para a revista Veja, a atriz Juliana Paes disse:

Não quero queimar sutiãs. Gosto de sutiãs! Não quero quebrar saltos de sapato em busca de liberdade. Gosto de me enfeitar, e nós, mulheres, não fazemos isso para o macho. Fazemos porque dá prazer cuidar de si e cuidar do outro. Sou uma feminista de saia, sutiã, salto alto e batom vermelho.

Eu não queria criticar mais uma mulher, mas acho realmente que alguém tem que escrever sobre o que Juliana Paes e tantas outras mulheres acreditam e dizem sobre o que é ou não feminismo. Ano passado, quando escrevi sobre Fernanda Torres, eu disse:

Chega de mulheres brancas sendo perdoadas facilmente por opiniões que recaem mais drasticamente sobre mulheres pobres e negras. Chega de achar que esse desfavor não tem um impacto grande no feminismo. É só perceber como gastamos tempo e energia em rebatê-la. E chega de colocar o selo de “feminista” em qualquer famosa com uma postura mais “diferente”.

Mantenho minha opinião e acredito que mulheres famosas deveriam usar mais seus privilégios econômicos e seu espaço midiático para se posicionar sobre assuntos que envolvam toda a sociedade sem achismos rasos, mas com conhecimento e leitura.

Mas a questão que muda tudo é que não vejo Juliana Paes como uma mulher branca. Juliana Paes recentemente esteve na capa da revista Estilo com Taís Araújo e Camila Pitanga e ali estavam a três únicas mulheres não brancas que fazem constantemente capas de revistas, protagonistas de novelas Globais e são fortemente influentes na mídia.

Juliana não estava ali com duas mulheres que se identificam como negras à toa: ela é uma mulher, da mesma maneira que elas, mestiça; no caso de Juliana, ela tem cabelos cacheados e pele “brown”, como diriam norte-americanos. É só olhar algumas fotos pessoais da atriz para compreender isso.

Não quero definir e declarar o que a Juliana Paes é, até porque não encontrei ela falando sobre sua identidade racial. Porém, quero demarcar que ela não é uma mulher branca. Então é um fato: ela é evidentemente mestiça. É tão mestiça que, como muitas atrizes que não são brancas, começou em novelas da Globo interpretando a empregada doméstica. Não esqueci da Ritinha de Laços de Família, a personagem que ficou marcada na nossa memória pelos constantes assédios que sofria do “patrão”.

No mesmo dia em que li a fala de Juliana Paes sobre mulheres no mercado de trabalho, li também que empresas brasileiras evitam contratar “pessoas bonitas” segundo uma pesquisa da Enlacers. O presidente Cezar Tegon tentou explicar os motivos:

“Os próprios executivos descartam profissionais mulheres muito bonitas, pois temem que essas contratações possam trazer problemas ao casamento, o que já vimos acontecer algumas vezes.”

Antes que digam que ser bonito é sofrer, eu me antecipo: evidentemente a questão aqui não é estética, mas de gênero. Não são homens e, sim, mulheres, que são vistas como bonitas, que podem gerar o interesse de homens e consequentemente não são contratadas.

Então, Juliana Paes, que começou na Globo em um papel de funcionária que sofria assédio, e tantas outras mulheres, precisam entender que machismo é quando um homem deixa de contratar uma mulher qualificada, por acreditar que não é capaz de “conter suas atitudes”, seus interesses e relacionamento corporativo apenas por ser mulher. Portanto, o feminismo ainda é uma luta que se faz necessária e presente.

Somos o País das ‘Ritinhas’

A Ritinha, primeira personagem de Juliana Paes, era, além de tudo, doméstica. Vivemos no País que mais possui empregadas domésticas no mundo. Dentro da ocupação, 92 % dos empregados domésticos do Brasil são mulheres, o que torna o trabalho doméstico a ocupação de 5,9 milhões de brasileiras, o equivalente a 14% do total das ocupadas no Brasil. Os dados são da pesquisa sobre inserção das mulheres no mercado de trabalho do Ministério do Trabalho e Previdência Social (MTPS) e Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).

Essas mulheres têm a média de estudo de seis anos e meio, e um salário de aproximadamente R$ 700. Até o ano de 2015 mais de 70% dessas pessoas não tinha nem sequer carteira assinada. Então por mais que queiramos estar em cargos de chefia e que muitas pessoas pautem suas questões nos “problemas da mulher empresária”, não somos o País das empresárias, somos o país das Ritinhas.

Uma carreira distinta não é facilmente dada a mulheres. Nós somos maioria pobre e mão de obra de trabalhos precarizados. Nem sequer temos a possibilidade de estudar pois, para muitas, não trabalhar significa morrer de fome junto com filhos, mesmo as mais jovens. E pensando nas empresárias e/ou mulheres bem sucedidas, ainda aquelas que estão em grandes empresas e com anos de estudos ganham menores salários e sofrem com o que chamamos de Síndrome do Impostor.

Então o mercado de trabalho nos exclui, marginaliza e oprime. E mesmo quando a sua carreira é de empresária de sucesso, se você olhar para o lado, quantas mulheres bem sucedidas nunca tiveram que passar por nenhuma agressão, humilhação ou ajuda psicológica para chegar onde estão?

E no caso da Juliana e tantas outras que carregam traços como os dela é comum começar sendo faxineira, doméstica, marginalizada, pobre na vida real ou na ficção. Nada contra ser doméstica, mas é inegável que alguns papeis sociais (assim como na ficção) são definidos pela estética e características físicas. O filme Cidade de Deus 10 anos discute essa temática muito bem. Tanto que eu, uma feminista noveleira, não vejo mulheres com o perfil da Débora Bloch interpretando a “barraqueira”, a “periférica”, a “filha da empregada”. Ela é constantemente a “mulher sensual”, a “poderosa”, a “empresária”. Portanto, mulheres como Taís Araújo, Camila Pitanga e Juliana Paes discutindo ou não questões da nossa sociedade, são representativas e podem mudar a vida de mulheres só por serem esteticamente como são.

Lembro até hoje da forma como a Helena da Taís Araújo, na novela Viver a Vida, de Manoel Carlos. Mesmo sendo uma personagem mega criticada, ela ajudou a mudar a forma como eu lidava com meu próprio cabelo e me fez inclusive usar roupas do mesmo tom que ela usava na novela. Pensem na enorme população de mulheres pretas, pardas, mestiças que se veem em uma das atrizes citadas acima e que as têm como exemplo em um contexto em que raramente a beleza não branca é reverenciada.

É fato que mulheres de pele negra escura como Cris Vianna, Isabel Fillardis e Adriana Alvez precisam de mais espaço pois mulheres negras de pele escura como elas e/ou gordas são totalmente inviabilizadas. Mas é preciso destacar que Juliana, Taís e Camila acabam sendo de extrema importância para nosso contexto estético e de representatividade.

Então realmente eu preciso explicar que as falas de Juliana Paes foram muito equivocadas, quando a atriz falou sobre batom vermelho. Em inúmeros grupos feministas negros, mulheres negras dizem ter vergonha de usar batom vermelho pois algumas tem lábios grossos e desde a infância são severamente criticadas e, então, elas aprenderam a “esconder” essa característica já que chamar atenção significa ser ofendida e sofrer racismo. Do outro lado, parceiros abusivos proíbem mulheres de usar batom vermelho, pois é coisa de “puta” e muitos recorrem a agressão psicológica e até física para garantir que sua imposição seja seguida.

O que quer o feminismo

Então, o feminismo está longe de proibir que mulheres se enfeitem e é óbvio que você pode ser uma feminista de salto, saia e batom. A questão é que nós, mulheres feministas, lutamos para que mulheres possam fazer ESCOLHAS e não sofrer IMPOSIÇÕES culturais e sociais por serem mulheres.

Nós, mulheres feministas, devemos lutar não só pelas nossas escolhas e vida plena, mas pela possibilidade de outras fazerem suas escolhas e terem uma vida plena com direitos garantidos. O feminismo é uma luta social e coletiva, é sobre cada mulher, mas é principalmente sobre todas nós. Então que tenha mulheres usando saia e batom, mas que tenha mulheres não usando caso elas não queiram e não sendo taxadas de sem feminilidade e perseguidas, afinal o que é feminilidade?

Dizem que feminilidade é inerente à mulher, o oposto da masculinidade associada à força, virilidade e sagacidade. A feminilidade nos coloca como frágeis, submissas e intelectualmente incapazes em relação a homens. Para ser uma mulher com femilidade se impõe uma série de coisas para mulheres em geral, mas será que todas nós mulheres somos iguais? Somos distintas, pensamos e agimos diante de uma mesma situação de forma diferente, somos portanto muito diferentes para o padrão de feminilidade ser único. Além disso se associa a possibilidade de feminilidade a consumir produtos que nos levam a tal. Só que nós, mulheres em geral, ganhamos menos que homens e a maioria dos produtos destinados para atingir a “feminilidade perfeita” são caros, os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram que a renda média nacional do brasileiro é de R$ 2.043, mas os homens continuam recebendo mais. Enquanto eles ganham, em média, R$ 2.251, elas recebem R$ 1.762 (diferença de R$ 489).

Se pensarmos em pessoas negras, homens negros ganham menos que mulheres brancas no mesmo cargo e com a mesma qualificação. Porém, as mulheres que menos ganham no País, atrás de homens brancos, negros e mulheres brancas são mulheres negras que ganham 60% menos que um homem branco. Esse é um dos motivos pelos quais o feminismo questiona alguns padrões de feminilidade impostos, que nos aprisiona em inseguranças e nos faz gastar recursos financeiros, tempo e vitalidade para alcançá-los. O nosso dinheiro que já é menor e foco sendo gasto não para nossa alegria, mas sim para alcançar metas que estão sempre se tornando mais inalcançáveis, faz com que nos tornemos mulheres psicologicamente inseguras, economicamente dependentes e socialmente inferiores.

O mundo machista e patriarcal entende padrões e estética não como bem estar, mas como formas de controle. Nem a própria Juliana Paes poder “sair mal” numa foto, pois sempre tem uma matéria maldosa que diz: “Com a roupa errada, Juliana Paes aparece gordinha em aeroporto”. Quantas vezes você já viu essa mesma chamada com um homem na foto? Ainda mais numa situação em que você segurava seu filho no colo. Já viu acontecer como acontece com você e com suas colegas de profissão? A ditadura da beleza existe até para quem já foi eleita uma das mulheres mais bonitas do mundo, imagina para as demais que não estão nessas listas e capas de revistas.

Eu duvido que Juliana Paes não seja insegura consigo mesma. Eu duvido, pois nós mulheres somos ensinadas a sê-lo e não acreditar em nós. A insegurança estética nos machuca demais. Somos taxadas de feias por conta dos nossos traços, ainda mais nós mulheres não brancas. Juliana Paes, ao deixar de alisar o cabelo, foi muito criticada. Esse não é um processo fácil pois envolve racismo e machismo. A intelectual e feminista bell hooks analisa essa situação com o devido recorte racial em Alisando Nosso Cabelo:

Independentemente da maneira como escolhemos individualmente usar o cabelo, é evidente que o grau em que sofremos a opressão e a exploração racistas e sexistas afeta o grau em que nos sentimos capazes tanto de auto-amor quanto de afirmar uma presença autônoma que seja aceitável e agradável para nós mesmas. As preferências individuais (estejam ou não enraizadas na autonegação) não podem escamotear a realidade em que nossa obsessão coletiva com alisar o cabelo negro reflete psicologicamente como opressão e impacto da colonização racista.

Portanto as escolhas individuais de como usamos o cabelo, batom e o a cor deles e até como nos vestimos, por mais que sejam pessoais, são afetadas pela estrutura social que estamos inseridas. E algumas mulheres ainda não conseguem fazer escolhas que condizem com o que elas querem, todavia com o que elas acreditam que é melhor para sofrerem menos. Então muitas alisam os cabelos para serem amadas, vistas como bonitas ou conseguirem um emprego, tal como muitas não usam roupas curtas nas ruas ou saias no trabalho com medo de assédios. E isso não pode ser esquecido quando falamos da sociedade, mesmo que individualmente eu às vezes aliso o cabelo para ficar diferente, não esqueço que me foi imposto como forma de ser menos ofendida na escola e que ainda vejo meninas negras ainda criança alisando pois querem se sentir incluídas.

O feminismo é mais do que eu ou você

É sobre todas nós numa estrutura machista. Essa estrutura que privilegia homens que amamos ou não, que conhecemos ou não, que nós fazem bem ou não, que são ricos ou não. O machismo é uma ESTRUTURA e não um problema individual e pessoal. Portanto o feminismo NÃO É o oposto do machismo, é um movimento social político em resposta a essa estrutura que condiciona mulheres a subalternidade mesmo quando suas contas bancárias são positivas. Uma mulher bem sucedida não anula o fato de mulheres serem a maioria pobre e explorada no mundo.

O feminismo é importante, para nosso bem estar físico, emocional, social econômico e financeiro num contexto em que nossas subjetividades são negadas, nossas escolhas são questionadas ou impossibilitadas. O feminismo está longe de ser uma cartilha sobre usar ou não batom, queimar ou não sutiã. Aliás, feministas nunca queimaram efetivamente sutiãs… Essa história é um boato de pessoas que são antifeministas e que acham que o feminismo é ruim para nós mulheres pois se privilegiam com a desigualdade de alguma forma.

De fato em 1968, mulheres se reuniram em frente ao teatro aonde acontecia o concurso de Miss America, em Atlantic City, para protestar contra a ditadura da beleza. Além dos sutiãs, outros apetrechos que simbolizavam a feminilidade, como saltos altos, maquiagem e revistas femininas foram reunidos no protesto. Mas a queima não foi autorizada pela prefeitura e nunca aconteceu.

O fato é que queima desses objetos, era para simbolizar que elas não concordavam com as imposições sociais, o que não significa que todas as feministas negam saltos altos, maquiagem e revistas femininas, muitas inclusive até trabalham em revistas ou sempre usam salto e maquiagem. A cantora Alicia Keys escreveu quando parou de usar usar maquiagem:

“Escrevi uma lista de coisas que eu estava cansada. E uma delas foi o quanto as mulheres sofrem lavagem cerebral para que sejam magras, ou sensuais, ou desejáveis, ou perfeitas. Uma das muitas coisas que eu estava cansada era do constante julgamento das mulheres. […] Toda vez que eu saia de casa, eu ficava preocupada quando não usava make. E se alguém tirar uma foto? E se postar? Eram pensamentos inseguros, superficiais, mas honestos. E todos eles eram baseados no que os outros achavam de mim”

Um ano sem usar maquiagem Alicia voltou a usar, em entrevista disse que a maquiagem agora poderia ser uma escolha e não mais uma imposição:

“Não sou uma escrava da maquiagem. E também não sou uma escrava de não usar maquiagem. Eu posso escolher. É meu direito. Acho que todas nós devemos fazer o que queremos relacionado a nossa aparência, corpo e saúde. Qualquer forma de expressão que empodere você, você deveria fazer. Só não concordo com essas expectativas altas e irreais que as mulheres são obrigadas a atender.”

Hooks explica que é preciso criticar as obrigações surreais que mulheres têm que atender e tal crítica não significa ser contra o uso de maquiagem, impedir plásticas ou usar métodos para mudar a estrutura capilar. Essas críticas são anti-estrutura patriarcal. Para o patriarcado, nunca estaremos perfeitas e, como já dito, isto gera um impacto até em entrevistas de empregos.

O fato é que vivemos numa estrutura pensada para privilegiar homens e, infelizmente, muitas mulheres acreditam que se beneficiam dessa estrutura ao fingir que não existem esses privilégios e que o dinheiro garante o fim dos outros problemas estruturais para além de classe. Mas sabemos que não é verdade, já que mulheres, mesmo burguesas e, inclusive, opressoras, não estão livres de serem espancadas por maridos, roubadas, aliciadas, estupradas e até mesmo se tornarem “laranjas” de suas falcatruas.

É fato que elas terão um tratamento totalmente diferenciado do que a maioria pobre e ou negra, como, por exemplo, a prisão domiciliar de Adriana Ancelmo, esposa do ex-governador Sérgio Cabral. Este é um exemplo desses tratamentos distintos. O feminismo é feito de diversos recortes, análises e contextos. Na tão polêmica entrevista, Juliana Paes questionou de forma banalizada a questão em relação a igualdade: “Acho errado esse desejo de igualdade com os homens a todo custo.”

Essa fala também não faz muito sentido quando “recortada, analisada e contextualizada”. Nós, mulheres, não queremos igualdade, queremos equidade. A igualdade só seria possível se negassem que realmente somos diferentes de homens. Existem “feminismos” que caminham paralelamente com seus recortes pela equidade. Um exemplo de equidade é lutar para que mulheres se aposentem mais cedo do que homens, tendo em vista que nossa carga horária de trabalho é de 5 até 7 horas maior que de homens pois o trabalho doméstico nos é imposto.

Em uma sociedade “justa” não precisamos disso. Mas não é essa a sociedade em que vivemos. No nosso contexto atual, para que se tenha igualdade e justiça parcial é preciso de adaptações que considerem as especificidades dos grupos socialmente oprimidos. Esse é um dos motivos para que mulheres aposentem mais cedo. Como Chimamanda Adichie diz:

“A questão de gênero, como está estabelecida hoje em dia, é uma grande injustiça. Estou com raiva. Devemos ter raiva. Ao longo da história, muitas mudanças positivas só aconteceram por causa da raiva.”

A raiva levou mulheres a quase queimar seus sutiãs. Deste modo a raiva, em muitas situações, nos protegeu e nos fez continuar. Então, podemos não concordar com as mulheres que vão às ruas com seios de fora e se intitulando “vadias”, mas não podemos ignorar que medidas que soam extremas garantiram mudanças e são importantes, e que nem todas as vezes vamos concordar com atitudes de feministas, mas temos que garantir um mundo onde feministas podem ser atuantes de forma plena em suas diferenças de ativismo e foco de luta.

Nós, mulheres, ainda estamos sendo punidas por lutarmos por direitos básicos como, por exemplo, estar no mercado de trabalho. E pode ser que queiramos, portanto, com motivo queimar sutiãs e mais coisas se necessário. No caso de nós, negras, nunca deixamos de estar no mercado de trabalho pois a exploração da nossa mão de obra quando escravizada e depois como trabalhadora livre, fez o alicerce desse País. Porém, todas nós, de formas diferentes e com intensidades diferentes, estamos sendo punidas por sermos mulheres e pelas poucas conquistas que tivemos. A punição vem com violência, com salários desiguais, com mais cobranças e por não sermos vistas como iguais e dignas de direitos: espancamentos, estupros, assassinatos se tornam parte de nós; somos estatísticas ora por sermos a regra, ora por sobrevivermos de forma digna sendo então a exceção.

A questão é que se a gente estivesse vivendo o “excesso de feminismo” como Juliana Paes disse, não precisaríamos dela sendo defensora para o fim da violência contra as mulheres da ONU Mulheres Brasil, pois não teríamos dados sobre o Brasil que indicam que:

503 mulheres são agredidas a cada hora (63% delas são negras/pardas);

Uma mulher é estuprada a cada 11 minutos e esse número provavelmente é maior, sendo que negras jovens tem três vezes mais chances de serem estupradas;

50,7 dos estupros no país acontece com crianças até 13 anos, sendo provavelmente por prováveis conhecidos;

A cada sete minutos uma denúncia de violência contra a mulher é feita e nem sempre é levada adiante pois a vítima pode ser coagida ou não ter o apoio devido.

O Brasil está entre os cinco países onde a violência contra a mulher é maior do mundo, não temos nem tempo para queimar sutiã pois temos que sobreviver. Nós, feministas, vivemos preocupadas demais com nós mulheres e com os números de feminicídios, estupros e violências que só aumentam.

Então, Juliana Paes, não fique mais confusa sobre nós feministas e os feminismos. Eu sei que você já diz ser uma de nós, então, não caia nas armadilhas das falas curtas e com dupla interpretação. Como diz a autora Chimamanda Ngozi Adichie, em Sejamos todos Feministas:

A cultura não faz as pessoas. As pessoas fazem a cultura. Se uma humanidade inteira de mulheres não faz parte da nossa cultura, então temos que mudar nossa cultura.

 

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