Insistir no Brasil pode ser o fim de uma carreira
Por Alex S. Lima, Da Folha de S.Paulo
Estamos acompanhando um desmanche na nossa principal agência de fomento de pesquisa do Brasil, o CNPq, a mesma que possibilitou o início da realização do meu sonho e de muitos outros jovens de se tornar um cientista. Os cortes de verbas das universidades federais, e a escassez de concursos para a contratação de docentes e pesquisadores, estão deixando toda a comunidade científica indignada.
A formação de um cientista envolve aproximadamente 15 anos de investimento do Estado. Esse cenário de devastação limita as perspectivas de jovens cientistas. A não absorção deles pelo mercado de trabalho brasileiro, seja em empresas ou universidades, dificulta a sua contribuição e o retorno desse investimento estatal para a sociedade na forma de desenvolvimento da nossa educação, ciência e tecnologia.
A consequência direta desse descaso com a nossa ciência, que vinha crescendo e produzindo muitas coisas boas, é o colapso de pesquisas que estão diretamente ligadas ao bem-estar da população.
Todo o investimento na busca de curas para diferentes tipos de câncer, doenças neurodegenerativas, dores crônicas, pesquisas na área de energia e no aumento da produção de alimentos sem provocar desequilíbrio ambiental, dentre outras aplicações e avanços que a ciência nos traz, poderá ser perdido.
A ciência atualmente é muito dinâmica, e um ano de congelamento pode levar muito tempo para sua recuperação. Outra consequência é o aumento das chamadas pseudociências, tais como os movimentos que acreditam que a terra é plana ou que vacinas não funcionam —filósofos de boteco influenciando milhares de pessoas, entre tantos outros absurdos que em um “mundo ideal” não seriam aceitos.
As informações sobre a situação da ciência no Brasil não estão restritas a nós. Frequentemente, os mais renomados jornais e revistas científicas internacionais veiculam artigos sobre a atual situação do nosso país. De certa forma, todos estão preocupados conosco, seja por interesses específicos ou por conhecerem o nosso potencial. A insistência de um jovem cientista em permanecer no Brasil pode custar o fim de sua carreira. É por isso que há um processo conhecido como “fuga de cérebros”, onde pessoas altamente qualificadas começam a migrar para outras nações em função da carência de posições no seu país de origem.
É economicamente viável para esses países que recebem esses jovens, pois não precisam de nenhum investimento, apenas de posições para que possam usufruir de mão de obra altamente especializada.
O Brasil investiu na minha formação durante 15 anos. Pagou meus estudos no exterior por pouco mais de um ano. Retornei para ser professor, montar um grupo de pesquisa e compartilhar o conhecimento que adquiri lá fora e aqui durante todos esses anos, mas as oportunidades no nosso país estão cada vez mais raras. Procurando alternativas, fui contratado na Suécia.
Infelizmente, sou mais um jovem cientista que deixa o país para dar continuidade a um sonho iniciado na infância e viabilizado pelas agências de fomento à pesquisa brasileira.
Fui, mas espero um dia voltar!