Educação dos ricos também preocupa

Quando olhamos de perto, vários deles contribuem muito pouco para a sociedade

FONTEFolha de São Paulo, por Michael França
O economista Michael França - Foto: Bruno Santos/Folhapress

É difícil imaginar o desenvolvimento de uma nação sem a participação ativa dos mais abastados. Aqueles que, por capricho do destino, nasceram em ambientes muito privilegiados carregam consigo vastas possibilidades de ajudar na construção de melhores oportunidades para os menos afortunados.

Alguns decidem agir nessa direção. Eles se engajam em atividades filantrópicas e utilizam seus talentos e recursos, muitas vezes herdados do trabalho de gerações passadas, para beneficiar aqueles ao seu redor. Esses indivíduos representam agentes de mudança que reconhecem, mesmo que marginalmente, suas vantagens hereditárias e buscam contribuir para a formação de uma estrutura social mais inclusiva.

Contudo, como em qualquer grupo, as atitudes individuais variam consideravelmente, e nem todos ultrapassam os limites de seus próprios interesses. Essa diversidade de comportamento é moldada pela educação.

O constante processo de transferência de conhecimento, valores e culturas de uma geração para outra influencia não só em que medida a conduta de um indivíduo varia ou se integra em relação ao seu grupo como também à sociedade.

Guia de filantropia para quem deseja se engajar e dedicar recursos a causas sociais – Divulgação

Em países muito desiguais, a segregação socioeconômica cria um profundo fosso nas possibilidades de interação e compartilhamento de conhecimento, valores e culturas entre os distintos subgrupos populacionais. Parte daqueles que não enfrentaram limitações financeiras em suas vidas frequentemente possui uma compreensão muito limitada das lutas diárias enfrentadas pela classe trabalhadora.

Indivíduos criados em famílias abastadas têm suas necessidades prontamente atendidas, o que não apenas impacta a quantidade de esforço que escolherão investir em diferentes etapas do jogo da vida, mas também tende a contribuir para uma falta de empatia em relação aos mais pobres e às dificuldades daqueles que dependem do trabalho para garantir o mínimo de subsistência.

Além disso, tem-se que as prioridades das pessoas são moldadas por seus valores. Em muitos círculos sociais considerados de “alta classe” há uma cultura que valoriza o consumo de luxo e a ostentação de riqueza, e isso não ocorre por acaso.

O exibicionismo frequentemente transmite uma imagem de sucesso, criando uma falsa associação entre riqueza e valor. Muitos, equivocadamente, relacionam riqueza à posse de habilidades excepcionais, ignorando que, em diversos casos, o indivíduo pouco fez para atingir uma posição elevada além de ter nascido em uma família com considerável privilégio material.

O valor de uma pessoa não deveria estar vinculado à sua condição financeira. Apesar de ser uma visão reducionista de humanidade, é exatamente isso que parte daqueles considerados como bem-sucedidos procuram promover.

A ênfase excessiva em aparências, bens materiais e status social acaba obscurecendo uma compreensão mais profunda de questões fundamentais da condição humana. A incessante busca pela promoção da própria imagem desvia a atenção de assuntos mais substanciais, contribuindo para uma visão superficial da realidade.

Nesse contexto, a associação da riqueza a valor cria uma miragem na qual vários ricos se escondem. Pois, quando observamos um pouco mais de perto, percebemos que muitos deles contribuem muito pouco, ou quase nada, para a sociedade. Sua posição privilegiada é mantida, em grande parte, porque ainda existe uma construção cultural que tolera isso.


O texto é uma homenagem à música “Money”, composta por Roger Waters, interpretada por Pink Floyd.

-+=
Sair da versão mobile