Eduardo Alves, diretor do Observatório de Favelas e militante de partidos de esquerda desde jovem, escreveu artigo em seu Facebook questionando o lugar da “esquerda” e da “direita” nos dias de hoje, quando nas redes sociais pessoas “de esquerda” se posicionam de forma conservadora. Em vez de tentar modificar esses conceitos, Eduardo aponta o grupo social que vê como principal protagonista de transformações: “O grupo social ao qual pretendo me aproximar, aprender, ensinar, dialogar, modificar ao ser modificado, contribuir ao incorporar contribuições, me misturar, é esse: os pobres, negros, moradores de territórios populares, principalmente favelas e periferias. E isso não foi sempre assim”
Por Eduardo Alves, publicado em sua página no Facebook
Em busca do protagonismo perdido
Duas formas de ver o mundo, entre as outras várias, me chamaram atenção desde cedo em minha vida. Uma a que identificava aquilo que era sempre igual. Outra, que buscava identificar a diferença. A primeira juntava pessoas que afirmavam: olha como nada mudou! O mesmo grupo que ou afirmava que assim sempre será, ou que defendia ordens naturais, ou mesmo que quando identificava algo que apresentava indicação de mudança, queria mesmo era manter o que existia e como existia. A segunda, com o olhar voltado para as diferenças e mudanças, juntava pessoas que identificavam quem eram os protagonistas das transformações. Esse grupo, em geral, era os que mostravam que nada era natural, que as alterações da realidade ocorriam como produto da ação de homens e mulheres, não como queriam, mas como era possível frente a correlação de forças dos grupos sociais com distintos interesses.
Durante muito tempo achei que essas duas visões sociais de mundo dividiam direita e esquerda, respectivamente. Mas com a chegada das redes sociais, nunca vi tanta gente que se autoproclama de esquerda e é tão atenta ao que se mantém e desconsidera as mudanças. Mais que isso, apresentam ideias que prescindem dos setores sociais que conquistaram as transformações no tempo e não se preocupam em identificar os protagonistas da história. Justamente o ponto de apoio para que as mudanças ocorram, as que já existiram e as futuras, são os construtores, os protagonistas principais; são, portanto, o setor que se precisa aproximar, com o qual se precisa aprender (e não só ensinar, como indica a arrogância que afasta), com quem é necessário se reunir, ouvir, dialogar, para inclusive, construir um projeto mais qualitativo e com potência hegemônica.
Verdade que, no outro grupo, o que já era identificado de direita, permanece a mesma estética predominante. Já no segundo, predomina tanta arrogância, tanto desrespeito, tanta preocupação em demarcações que se sustentam em estéticas auto proclamatórias e bolsões de verdade, sem respeitar a vida dos grupos sociais com potência de protagonismo para transformações. Tenho a intuição que isso é uma característica desse momento no Brasil, ainda que sempre tenha impregnado o pequeno mas diversificado grupo se se considera de esquerda.
Sobre isso, especificamente, para mim, sobra algumas opções: a) alterar a visão que há muito me acompanha; b) recombinar os atos entre esquerda e direita; c) modificar o conceito de direita e de esquerda para identificar os grupos com seus projetos e programas. Bom, mas essa é uma reflexão para a vida e periférica, ainda mais no momento que nossas atenções precisam se voltar para constituir um diálogo que aproxime a maioria da população, principalmente os pobres; um diálogo que possa ampliar a potência para um brasil com mais democracia e menos desigualdades. E o grupo social, hoje do meu ponto de vista, que é o principal protagonista de transformações, são os pobres, negros, moradores de favelas e periferias. Há outros com potenciais para contribuir em processos de transformação; que podem colaborar para que exista um aprofundamento desses dois pontos (democracia e superação de desigualdades) que, ao meu ver, são hoje centrais. Mas o grupo social ao qual pretendo me aproximar, aprender, ensinar, dialogar, modificar ao ser modificado, contribuir ao incorporar contribuições, me misturar, é esse: os pobres, negros, moradores de territórios populares, principalmente favelas e periferias. E isso não foi sempre assim.