Alegria, alegria – por Fernanda Pompeu

Quando se fala em envelhecimento, vem sempre alguém enumerando suas muitas desvantagens: flacidez da pele, dor nos joelhos, vista cansada, dentes amarelados, facilidade para engordar, baixa imunidade. Solidão, perda de ilusões, proximidade da morte dos amigos e pessoal.

Mas o envelhecimento também traz seus biscoitos finos, seus perfumes franceses, suas flores raras. Por exemplo, a alegria de lembrar. Recordar o vivido não deixa de ser uma forma de ressurreição. Uma volta a fragmentos de tempos e até a sonhos felizes. Como observou, outro dia, minha mãe: “Os jardins antigos são os mais bonitos, pois mantêm a memória úmida.”

Memória úmida é aquela que ainda está suando suas cores, cheiros, palavras dentro de nós. Provavelmente deva existir uma memória seca – quando fatos, nomes, versões, canções, livros fogem de nós. Ou talvez seja a gente mesmo que fuja deles. Agora deixo de filosofia e abro uma gavetinha bem prosaica.

Copa do Mundo de 1970. É certo que todo mundo sabe que o Brasil se tornou tricampeão ao derrotar a Itália por 4×1 na pujante Cidade do México. Pois é. Todo mundo sabe, mas nem todos viveram a emoção da grande final. Desconfio até que a maioria dos leitores desta crônica nem eram nascidos.

Vivi a aquela Copa na beleza florescente dos meus quatorze anos. Morávamos no bairro Canto do Rio, em Niterói. Precisamente em um prédio chamado Moema. Não esqueço que a cada gol a explosão de vivas fazia o edifício tremer inteiro. Literalmente. Todo mundo embalado na canção: Noventa milhões em ação / Pra frente Brasil / Salve a seleção!”

Depois de testemunhar o capitão Carlos Alberto Torres erguer a Taça Jules Rimet – agora definitivamente brasileira, no Estádio Azteca com lotação completa – o povo saiu às ruas. Recordo da multidão na praia de Icaraí. Famílias, solitários, paqueradores, maníacos, normalíssimos. Uma corrente humana irmanada por uma alegria doida. Dessas alegrias espontâneas e gratuitas. Comemorávamos o caneco!

Hoje, 44 anos depois de 1970, somos 201 milhões de brazucas. Mudou tudo! Minhas perguntas são: será que mudou também a alegria de torcer pela seleção? Estamos menos ingênuos? Estamos mais tristes? Será que o país do futebol aposentou as chuteiras? Em menos de dez dias, conheceremos as respostas.

Imagem Régine Ferrandis, ©L’Equipe.

+ sobre o tema

Presidente de Portugal diz que país tem que ‘pagar custos’ de escravidão e crimes coloniais

O presidente português, Marcelo Rebelo de Sousa, disse na...

O futuro de Brasília: ministra Vera Lúcia luta por uma capital mais inclusiva

Segunda mulher negra a ser empossada como ministra na...

Desigualdade ambiental em São Paulo: direito ao verde não é para todos

O novo Mapa da Desigualdade de São Paulo faz...

Foi a mobilização intensa da sociedade que manteve Brazão na prisão

Poucos episódios escancararam tanto a política fluminense quanto a...

para lembrar

Desemprego diante da pandemia tem alta de 27,6% em quatro meses no país, aponta IBGE

O Brasil encerrou o mês de agosto com cerca...

Intérprete da Viradouro é preso por não pagar pensão alimentícia

Fonte: G1 - Wander Pires foi detido após show...

TSE forma maioria para tornar Bolsonaro inelegível por mentiras e ataques ao sistema eleitoral

O TSE (Tribunal Superior Eleitoral) formou maioria nesta sexta-feira (30) para...

Esmola geral abre ritos da Boa Morte em Cachoeira neste sábado

Fonte: A Tarde - Os rituais que antecedem...

MG lidera novamente a ‘lista suja’ do trabalho análogo à escravidão

Minas Gerais lidera o ranking de empregadores inseridos na “Lista Suja” do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). A relação, atualizada na última sexta-feira...

Conselho de direitos humanos aciona ONU por aumento de movimentos neonazistas no Brasil

O Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH), órgão vinculado ao Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, acionou a ONU (Organização das Nações Unidas) para fazer um alerta...

Brizola e os avanços que o Brasil jogou fora

A efeméride das seis décadas do golpe que impôs a ditadura militar ao Brasil, em 1964, atesta o apagamento histórico de vários personagens essenciais...
-+=