Entidades financiam projetos comunitários de combate à violência contra a mulher

Programas de rádio em comunidades de pescadoras artesanais, postagens em blogs e redes sociais e conversas em terreiros de candomblé e aldeias indígenas estão entre os projetos de combate à violência contra a mulher que serão desenvolvidos ao longo deste ano com financiamento do Elas – Fundo de Investimento Social e do Instituto Avon. Trinta e três iniciativas foram selecionadas entre 658 inscritas e receberão, juntas, R$ 2 milhões.

Do Jornal do Brasil

Com uma série de estratégias para influenciar as políticas públicas, os projetos propõem mudanças de cultura em âmbito local, em cada comunidade, trabalhando as particularidades de cada público. Um exemplo dessas ações são as oficinas de gastronomia e costura oferecidas no Ilê Omolu Oxum, do Rio de Janeiro, que se transformaram na campanha Mulheres de Axé pelo fim da violência doméstica e familiar. Agora, com o financiamento, a iniciativa terá alcancenacional.

“Na edição passada, em 2015, tivemos a oportunidade de chegar a 350 mulheres. Mas não é apenas chegar. É chegar com regularidade, falar, entregar material, sabendo que 80% já presenciaram situação de violência, e atuar na quebra do ciclo de violência”, explica a historiadora e pesquisadora Wania Santanna, uma das coordenadoras do projeto ao lado de Mãe Nilce Naira.

“É a experiência da outra [mulher] que já disse não [à violência], experiência da outra mulher que deu certo quando disse não, que empodera para enfrentar a violência e a discriminação”, completou Wania, referência em estudos sobre gênero e raça.

Projetos

No Parque Indígena do Xingu, em Mato Grosso, o projeto da Associação Yamarikunã das Mulheres Xinguanas vai promover encontros de diversas etnias para definir estratégias de combate a um tipo novo de violência: a exposição virtual indevida. A chegada às aldeias dispositivos móveis de acesso à internet como tablets e celulares facilitou a difusão de imagens de rituais e do modo de vida das tribos, mas também trouxe um tipo de violência que elas não conheciam: a exposição indevida de fotos, em especial de suas partes íntimas, de forma descontextualizada.

A presidente da associação, Kuiaiu Yawalapiti, disse que o contato com a tecnologia talvez tenha motivado os homens das aldeias a exporem suas mulheres na rede. “Às vezes, eles pegam a foto, manipulam, publicam com frases que não tem nada a ver. Teve um vídeo, do Projeto Vídeo nas Aldeias, que usou a foto de um ritual dizendo que as mulheres xinguanas obrigavam os homens a fazer sexo. Isso machucou muito a gente, ficamos preocupadas, porque não é verdade”, desabafou.

Nas cidades, um projeto voltado para as trabalhadoras domésticas pretende empoderá-las para enfrentar a violência da qual são vítimas dentro de casa, mas também no ambiente de trabalho, como o racismo.

“Sabemos que existe sexismo e racismo, na manutenção deste status [de mulheres negras como empregadas domésticas]. A sociedade brasileira tem em sua história o trabalho doméstico como um trabalho de pequeno valor, de menor relevância social e que vai sendo constituído [mão de obra] por uma classe de desfavorecidos”, destacou a professora universitária Nicea Quintino, da Casa Laudelina de Campos Mello. A organização fará seminários esclarecendo lideranças e todo o país sobre a violência, discriminação, direitos trabalhistas e políticas públicas.

Defesa e empoderamento

De acordo com a coordenadora executiva do Fundo Elas, KK Verdade, apesar de avanços recentes, ainda é preciso esclarecer as mulheres sobre seus direitos e encorajá-las a denunciar as diversas formas de violência das quais são vítimas. Os projetos escolhidos, segundo ela, dão oportunidade de reverberar a defesa das mulheres e de mostrar que as vítimas não estão sozinhas.

“Hoje temos a Lei Maria da Penha que faz Justiça a essa violência. Mas mudanças para interromper o ciclo na cabeça das pessoas, na casa das pessoas, no bairro das pessoas, isso só os grupos de mulheres, as organizações de base é que vão fazer”, disse. A ativista espera que os 33 projetos selecionados este ano alcancem cerca de 20 mil pessoas diretamente e cerca de 1 milhão indiretamente.

Entre as organizações selecionadas também estão algumas que prestam assistência jurídica em âmbito nacional, como o Geledés – Instituto da Mulher Negra, a Articulação de Organizações de Mulheres Negras Brasileiras e o Centro Feminista de Estudos e Assessoria. “Precisamos ter projetos que articulem políticas, defendam novas e façam o controle social”, explicou KK.

Na lista de projetos que serão financiados pela Avon e o Fundo Elas também há ações de equidade e empoderamento para mulheres jovens, com deficiência, lésbicas, transexuais e prostitutas.

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