Entre a fome e o gato

Relatório inédito evidencia como a pobreza energética aprofunda desigualdades

Já pensou no que você faria se tivesse de escolher entre comprar comida e pagar a conta de um serviço essencial como o fornecimento de energia elétrica? Esse é o tipo de dilema que assombra cotidianamente a vida de milhões de brasileiros privados de direitos básicos.

A pobreza é um fenômeno complexo, que sustenta a exclusão e a vulnerabilidade e ultrapassa a questão da renda. Não por acaso a chamada “pobreza energética” remete à insegurança alimentar, falta de acesso à informação e à educação – entre outros direitos da cidadania.

Considerando que a perspectiva interfere no diagnóstico de problemas sociais, a Rede Favela Sustentável e o Painel Unificador das Favelas decidiram assumir o controle da narrativa sobre esse tema nas comunidades do Rio de Janeiro.

Vista aérea da favela da Rocinha, no Rio de Janeiro – Florian Plaucheur – 14.mar.23/AFP

Assim surgiu o primeiro relatório Eficiência Energética nas Favelas, que expõe detalhes até então inéditos a respeito do impacto da ineficiência do serviço e do uso de luz sobre a pobreza e o aprofundamento das desigualdades. No cenário retratado, as políticas públicas não chegam aos destinatários de maneira eficiente.

A maioria (55,2%) das famílias representadas encontra-se abaixo da linha da pobreza (vive com renda per capta mensal de até R$ 497), sendo que 68,7% dizem desconhecer a Tarifa Social de Energia Elétrica. O que faz com que 90,4% dos que atendem ao critério de renda para ter tarifa social não recebam o benefício.

Segundo o relatório, 41,5% das famílias que ganham até meio salário mínimo e 23% das que recebem de dois a três mínimos ficaram sem luz por mais de 24 horas no último trimestre! Ainda assim, poucas formalizam reclamações, pois o recurso usado para ter acesso à energia elétrica é, muitas vezes, uma conexão irregular.

Longe de mim fazer apologia da fraude, mas, aos olhos de quem tem de escolher entre comer e pagar a luz, o famoso “gato” pode ser mais um mecanismo de luta pela sobrevivência do que um pressuposto de desonestidade.

+ sobre o tema

O pardo e o mal-estar do racismo brasileiro

Toda e qualquer tentativa de simplificar o racismo é um tiro...

Quem ganha ao separar pessoas pretas e pardas?

Na África do Sul, o regime do apartheid criou a...

Justiça manda soltar PM que matou marceneiro negro com tiro na cabeça na Zona Sul de SP

O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) concedeu nesta quarta-feira...

Promotor é investigado por falar em júri que réu negro merecia “chibatadas”

Um promotor de Justiça do Rio Grande do Sul é...

para lembrar

O pardo e o mal-estar do racismo brasileiro

Toda e qualquer tentativa de simplificar o racismo é um tiro...

Quem ganha ao separar pessoas pretas e pardas?

Na África do Sul, o regime do apartheid criou a...

Justiça manda soltar PM que matou marceneiro negro com tiro na cabeça na Zona Sul de SP

O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) concedeu nesta quarta-feira...

Promotor é investigado por falar em júri que réu negro merecia “chibatadas”

Um promotor de Justiça do Rio Grande do Sul é...
spot_imgspot_img

O pardo e o mal-estar do racismo brasileiro

Toda e qualquer tentativa de simplificar o racismo é um tiro no pé. Ou melhor: é uma carga redobrada de combustível para fazer a máquina do racismo funcionar....

Quem ganha ao separar pessoas pretas e pardas?

Na África do Sul, o regime do apartheid criou a categoria racial coloured, mestiços que não eram nem brancos nem negros. Na prática, não tinham...

Justiça manda soltar PM que matou marceneiro negro com tiro na cabeça na Zona Sul de SP

O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) concedeu nesta quarta-feira (27) habeas corpus ao policial militar Fábio Anderson Pereira de Almeida, réu por assassinato de Guilherme Dias...