Já pensou no que você faria se tivesse de escolher entre comprar comida e pagar a conta de um serviço essencial como o fornecimento de energia elétrica? Esse é o tipo de dilema que assombra cotidianamente a vida de milhões de brasileiros privados de direitos básicos.
A pobreza é um fenômeno complexo, que sustenta a exclusão e a vulnerabilidade e ultrapassa a questão da renda. Não por acaso a chamada “pobreza energética” remete à insegurança alimentar, falta de acesso à informação e à educação – entre outros direitos da cidadania.
Considerando que a perspectiva interfere no diagnóstico de problemas sociais, a Rede Favela Sustentável e o Painel Unificador das Favelas decidiram assumir o controle da narrativa sobre esse tema nas comunidades do Rio de Janeiro.
Assim surgiu o primeiro relatório Eficiência Energética nas Favelas, que expõe detalhes até então inéditos a respeito do impacto da ineficiência do serviço e do uso de luz sobre a pobreza e o aprofundamento das desigualdades. No cenário retratado, as políticas públicas não chegam aos destinatários de maneira eficiente.
A maioria (55,2%) das famílias representadas encontra-se abaixo da linha da pobreza (vive com renda per capta mensal de até R$ 497), sendo que 68,7% dizem desconhecer a Tarifa Social de Energia Elétrica. O que faz com que 90,4% dos que atendem ao critério de renda para ter tarifa social não recebam o benefício.
Segundo o relatório, 41,5% das famílias que ganham até meio salário mínimo e 23% das que recebem de dois a três mínimos ficaram sem luz por mais de 24 horas no último trimestre! Ainda assim, poucas formalizam reclamações, pois o recurso usado para ter acesso à energia elétrica é, muitas vezes, uma conexão irregular.
Longe de mim fazer apologia da fraude, mas, aos olhos de quem tem de escolher entre comer e pagar a luz, o famoso “gato” pode ser mais um mecanismo de luta pela sobrevivência do que um pressuposto de desonestidade.