Espetáculo da Companhia de Teatro da Ufba tem direção de uma negra

Pela primeira vez, uma mulher negra dirige um espetáculo da Companhia de Teatro da Ufba: Pele Negra, Máscaras Brancas.

Por Flavia Azevedo, do Correio 24 Horas 

Onisajé (Fotos: Adeloyá Magnoni)

A montagem

Com elenco 100% composto por pessoas negras, a Companhia de Teatro da Universidade Federal da Bahia estreia, em março, espetáculo que traz a temática do racismo. Um momento histórico para o grupo. Ao conduzir essa equipe para a encenação de “Pele Negra, Máscaras Brancas”, Onisajé (Fernanda Júlia) se torna a primeira mulher negra a dirigir um espetáculo da companhia que já tem quase quarenta anos de existência. A dramaturgia (de Aldri Anunciação) se baseia em obra homônima de Frantz Fanon, leitura obrigatória para aqueles que discutem, estudam e lutam contra o racismo.

 

O espetáculo passeia por três períodos (1950, 2019 e 2888) e, nessa viagem, fala sobre processo de colonização e a construção de sofrimentos psicológicos em corpos negros. A montagem traz o próprio Frantz Fanon como personagem no ano de 2019 para, novamente, defender a tese de doutorado rejeitada pela banca examinadora no ano de 1952:  Pele Negra, Máscaras Brancas, obra que se tornou referência mundial sobre o tema.

A diretora

Onisajé é Yakekerê (mãe pequena, segunda sacerdotisa do terreiro) no Ilê Axé Oyá L´adê Inan, graduada no Bacharelado em Direção Teatral da Escola de Teatro da UFBA e mestre em Artes Cênicas pelo Programa de Pós graduação em Artes Cênicas – PPGAC – UFBA. Atualmente, é doutoranda no mesmo programa e professora substituta da Escola de Teatro da UFBA nos cursos de Direção, Interpretação e Licenciatura. É também Diretora Fundadora do Núcleo Afro brasileiro de Teatro de Alagoinhas – NATA, fundado em 1998. É dramaturga, preparadora de atores, educadora e pesquisadora da cultura africana no Brasil com ênfase nas religiões de matriz africana.

A experiência

“Dirigir o espetáculo Pele Negra, Máscaras Brancas à frente da Companhia de Teatro da UFBA, que é importante para o cenário artístico e teatral soteropolitano, é muito importante e significativo, principalmente por uma questão da ampliação de narrativas. Frantz Fanon é um autor importantíssimo para o processo de ‘poderamento’ do homem e da mulher negra, para a consciência do racismo como prisão e fator de adoecimento, de impedimento do indivíduo negro(a) de ascender nos espaços. A Escola de Teatro da UFBA – que tem reconhecidamente um título de pioneira – precisava diversificar, ampliar, olhar a diversidade cultural do povo e responder isso na cena. Todas as reivindicações dos estudantes pretos da graduação e a mobilização de artistas negros engajados dentro da escola, incluindo professores e a realização do FNAC contribuíram para que esse momento chegasse. Depois de Gusmão – que foi o primeiro espetáculo com essa temática, sendo pensado, produzido e encenado por artistas negros – o Pele Negra é mais um espetáculo que vem manter aberta essa porta, que vem marcar e disputar espaços de narrativas.
É importante que a gente entre nesses espaços, que mostremos outros pontos de vista e que nós pretos e pretas a partir da nossa visão de mundo, experiência e da nossa herança possamos evidenciar nossas contribuições no processo formativo de nosso país. O teatro é um espaço midiático, de criação, de plano simbólico, de referências e reconhecimento. Ver-se e ser visto é muito importante. A universidade acaba tendo uma única narrativa eurocentrada ou norte americanizada. Então essa fala de uma encenadora mulher, negra, lésbica, do interior do estado, de periferia, que fez parte e faz dessa universidade, afirma e comprova que é necessário colocar as nossas questões em todos os espaços.”

 

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