Gilberto Gil, que afirma que a luta tem sido um contraponto à sua carreira musical de sucesso, embarca em uma viagem no filme Viramundo para buscar suas origens musicais no Brasil, na África e Austrália. O documentário do cineasta suíço Pierre-Yves Borgeaud, que usa a lente das comunidades indígenas que lutam para preservar a sua identidade cultural após o domínio colonial, estreou na noite de sábado no “Visions du Reel”, um festival internacional de documentário, em Nyon, na Suíça.
– Por meio de encontros musicais, nós estávamos avaliando as ligações entre os países e seus povos submetidos à dominação e colonização, que foi o caso do Brasil, Austrália e África do Sul – disse Gil a um grupo de jornalistas antes de uma sessão lotada no festival.
No filme, o produtor Emmanuel Getaz acompanha Gil e seu fiel percussionista Gustavo Di Dalva em todo o hemisfério sul, da Bahia aos Territórios do Norte da Austrália e África do Sul antes de retornar para a Amazônia.
A obra começa em Salvador, onde Gil nasceu há 70 anos. Vestido com o traje tradicional azul dos Filhos de Gandhi, ele participa do Carnaval.
Em seguida, ele voa para Sydney, onde encontra-se com Peter Garrett, ministro da Educação da Austrália e ex-vocalista da banda de rock Midnight Oil. Gil relembra como manteve sua música enquanto foi ministro da Cultura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva 2003-2008.
A parada seguinte é em um centro comunitário em Redfern, um subúrbio da cidade de Sydney, onde o aborígene Patrick Dodson conta que “nunca houve qualquer reconhecimento de nossa cultura única”. O objetivo de cristianizar e ocidentalizar era tamanho que nada restou do que somos como povo aborígene.”
Gil simpatiza devido à sua experiência, mas ele observa que tem havido algum progresso.
– Em meu país, onde os negros foram trazidos como escravos, eles sofreram e foram humilhados e separados e todas as coisas ruins que você possa imaginar – disse Gil a Dodson. “O tempo passou e as coisas mudaram. Agora podemos ter um ministro negro.”
A jornada musical continua para Johanesburgo, na África do Sul, onde um trompetista negro jovem na favela de Soweto é justaposto com uma mulher branca violinista vivendo em uma casa murada.
Os dois jovens músicos tocam na orquestra racialmente mista Miagi, mas suas histórias pessoais perdem a importância para uma performance de Gil e o cantor e ativista sul-africano Vusi Mahlasela.
Os dois homens executam um belo dueto de “Tempo Rei”, e Mahlasela então canta “Say Africa”, explicando o conceito Zulu de “ubuntu”, que ele traduz como “uma pessoa é uma pessoa por causa de outras pessoas”.
A última etapa da odisseia se passa na cidade fortemente indígena de São Gabriel da Cachoeira, aqui no Brasil. Um cantor que se descreve como metade índio e metade brasileiro canta a última canção comovente sobre a degradação do meio ambiente frágil da Amazônia.
Gil vê suas dificuldades como uma força motriz em sua vida.
– Desde a minha adolescência, eu fui um ativista na política e na luta social – disse à plateia do filme. “Eu me envolvi no movimento contra a ditadura militar e fui preso por três meses e expulso. A luta também é uma parte essencial da minha história, um elemento de entusiasmo e um motor.”
O filme estreia na França e na Suíça no início de maio, e será exibido em outros lugares na Europa, no Brasil, na África do Sul, e nos Estados Unidos ainda este ano.
Fonte: Correio do Brasil