Itaú Cultural leva exposição sobre a literatura e a militância de Conceição Evaristo ao Centro de Artes da Maré, no Rio de Janeiro

A vida, obra, influências e referências da escritora podem ser conferidas em fac-símiles de documentos, textos, fotografias, audiovisuais, cartas e manuscritos de poemas e contos; lambe-lambes com trechos de textos e poemas dela serão distribuídos para o público

Enviado para o Portal Geledés 

A trajetória pessoal e profissional de Conceição Evaristo, escritora e ativista do movimento negro – para o qual dá voz com a sua literatura e atuação – é apresentada ao público do Rio de Janeiro a partir do dia 30 de setembro (sábado), no Centro de Artes da Maré. Produzida em parceria pelo Itaú Cultural e a Redes da Maré, a exposição Conceição Evaristo é um desdobramento da Ocupação Conceição Evaristo, realizada pelo Itaú Cultural em sua sede, em São Paulo, entre maio e junho deste ano. Com curadoria da própria escritora e dos Núcleos de Audiovisual e Literatura e de Educação e Relacionamento do instituto, a mostra transpira as “escrevivências” de Conceição, como ela mesma se refere ao seu trabalho – uma escrita que nasce das vivências, vivendo para narrar, narrando o que vive.

Toda a obra da mineira Conceição Evaristo é permeada por questões raciais, de gênero e de classe, explorando, sobretudo, a condição e a complexidade da mulher negra. Seus romances, contos e poemas revelam a condição do afrodescendente no Brasil, e podem ser considerados como grandes ferramentas na luta contra o racismo e contra o machismo tão presentes na sociedade.

 

Assim como em sua obra, o olhar poético e a militância da autora permeiam o espaço interno e externo da mostra no Centro de Artes da Maré. Textos, obras de referência, audiovisuais e fac-símiles de fotografias, manuscritos de poemas e contos, e cartas de familiares e amigos conduzem o visitante por esse caminho iniciado em uma favela mineira, onde Conceição Evaristo cresceu cercada por palavras, graças à sua mãe, a lavadeira dona Joana Josefina Evaristo Vitorino. Com 10 filhos, a matriarca começou a escrever os seus próprios textos inspirada em Carolina Maria de Jesus (1914-1977) em cadernos que resgatava na rua, muitos em branco. Ali, ela depositava os seus pensamentos sobre o dia a dia, as dificuldades da vida na favela, poemas e frases soltas.

Da obra de Conceição Evaristo, o público pode manusear exemplares de publicações reconhecidas, como Ponciá Vicêncio, seu primeiro romance, Becos da Memória, Poemas da Recordação e Outros Movimentos e os livros de contos Insubmissas Lágrimas de Mulheres, Olhos D´Água e Histórias de Leves Enganos e Parecenças, ao lado de obras referenciais para ela. Os livros ficarão à disposição do visitante em um espaço com mesas e cadeiras, no qual estará também fac-símile de um dos cadernos escritos por dona Joana. Ao final da exposição, os livros serão doados à biblioteca do Centro de Artes da Maré.

Em telas instaladas nas paredes do espaço expositivo, os visitantes podem ainda assistir a três vídeos produzidos para a mostra. Um deles traz a imagens de Conceição Evaristo em diferentes situações e recortes, sobreposta por um áudio com a voz da autora declamado trechos de obras suas e falando sobre a sua vida. Outro, registra a leitura feita por ela de trechos do livro Becos da Memória, explicando o contexto em que o livro foi criado e revisitando o lugar em que ficava a favela onde ela nasceu, enquanto um último leva a público depoimentos de professoras e alunas em uma escola do Rio de Janeiro sobre a literatura da escritora mineira.

Impressa em um tecido transparente, uma grande foto de Conceição Evaristo paira no espaço, que conta, ainda, com a imagem da escrava Anastácia, por quem ela tem devoção. Para além da exposição, trechos de textos e poemas da escritora compõem lambe-lambes, que podem ser levados pelo público.

Sobre Conceição Evaristo

Nascida em 29 de novembro de 1946 em uma favela em Belo Horizonte (MG), Maria Conceição Evaristo de Brito é filha de dona Joana, lavadeira que criou 10 filhos em meio a muitas dificuldades. Inspirada por Carolina Maria de Jesus, dona Joana não tinha estudo, mas colecionava cadernos que achava pelas ruas e os recheava com seus escritos sobre a vida, pensamentos, poemas. Conceição costuma dizer que, pelo hábito de dona Joana, ela cresceu cercada por palavras, mesmo que não tenha crescido cercada por livros. A mãe certamente é uma grande influência para Conceição, que no futuro adotaria e defenderia o conceito de “escrevivências” – a escrita que nasce das vivências. Viver para narrar. Narrar o que se vive.

Conciliando os estudos com o trabalho como empregada doméstica, Conceição Evaristo concluiu o curso normal aos 25 anos, em 1971. Foi nessa época que se mudou para o Rio de Janeiro (RJ) para estudar letras na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Lá, também começou a dar aulas, aprovada em um concurso público.

Mestra em literatura brasileira pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC/RJ) e doutora em literatura comparada pela Universidade Federal Fluminense (UFF), Conceição começou a publicar em 1990, na série Cadernos Negros, no grupo Quilombhoje. Essa aproximação com a militância de causas sociais naturalmente levou a escritora para o movimento negro.

Ponciá Vicêncio, seu primeiro romance publicado, foi lançado em 2003 (também no exterior) e é até hoje um marco. Depois do romance de estreia, Conceição Evaristo lançou Becos da Memória (2006) e Poemas da Recordação e Outros Movimentos (2008). Há ainda três livros de contos: Insubmissas Lágrimas de Mulheres (Nandyala, 2011), Olhos D´Água (Pallas, 2014) e Histórias de Leves Enganos e Parecenças (Editora Malê, 2016). Também participou de inúmeras antologias. Toda a sua obra é marcada por questões raciais, de gênero e de classe.

 

Sobre Redes da Maré

A Redes de Desenvolvimento da Maré é uma organização da sociedade civil que se dedica a promoção de uma rede de desenvolvimento sustentável, voltada para a transformação estrutural do conjunto de favelas da Maré. O surgimento da instituição está ligado à constatação da necessidade de se criar uma alternativa que alie mobilização à elaboração de propostas para modificar a condição de vida nas comunidades da Maré. É em torno desta premissa que a Redes se organiza, fortalecendo o potencial profissional e intelectual existente na comunidade, a fim de elaborar um projeto integrado e duradouro de desenvolvimento. A Redes atua em seis eixos temáticos: Desenvolvimento local, Educação, Comunicação, Segurança Pública, Arte e Cultura e Memória.

 

SERVIÇO

Exposição Conceição Evaristo

Abertura: 30 de setembro (sábado), às 16h

Visitação: 3 de outubro a 10 de dezembro

Segunda-feira a sexta-feira, das 9h às 21h. Sábados, das 9h às 13h

Entrada gratuita

Local: Centro de Artes da Maré.

Rua Bittencourt Sampaio, 181.

Nova Holanda, Maré – Rio de Janeiro, RJ.

+ sobre o tema

Produtores sergipanos elaboram Mostra de Cinema Negro

“É preciso quebrar as barreiras impostas pelo modelo de...

Alessandra Santos de Oliveira

Alessandra Santos de Oliveira (2 de Dezembro de 1973),...

Lima Barreto, um Intelectual Negro na Avenida Central

Autora: CELI SILVA GOMES DE FREITAS Filiação Institucional: UERJ   }Suas crônicas...

Alfabetização: memórias de um escritor leitor…

Entrevista - Alfabetização: memórias de um escritor leitor... {xtypo_quote}As...

para lembrar

Tribos de Wakanda e suas inspirações na cultura Africana

O filme solo do rei de Wakanda, T’Challa, chegou aos...

Camila Pitanga protagoniza viagem incrível à África do Sul

Camila Pitanga embarcou recentemente para uma experiência incrível. Junto...

Filha mais velha de Obama, Malia atrai legião de fãs com seu estilo

Filha do dono da caneta mais poderosa do mundo,...

Minha Mãe, Minha Heroína?

“Ainda bem que ninguém saiu ferido, ninguém se machucou....
spot_imgspot_img

Comida mofada e banana de presente: diretora de escola denuncia caso de racismo após colegas pedirem saída dela sem justificativa em MG

Gladys Roberta Silva Evangelista alega ter sido vítima de racismo na escola municipal onde atua como diretora, em Uberaba. Segundo a servidora, ela está...

Uma mulher negra pode desistir?

Quando recebi o convite para escrever esta coluna em alusão ao Dia Internacional da Mulher, me veio à mente a série de reportagens "Eu Desisto",...

Da’Vine Joy Randolph vence o Oscar de Melhor atriz coadjuvante

Uma das favoritas da noite do 96º Oscar, Da'Vine Joy Randolph se sagrou a Melhor atriz coadjuvante da principal premiação norte-americana do cinema. Destaque...
-+=