“Luta contra racismo é necessariamente luta de classe”, diz Edson

FONTEPor Deborah Moreira, do Vermelho
Foto: Clécio de Almeida

Em entrevista à Rádio Vermelho, Edson França, presidente da União de Negros pela Igualdade (Unegro), antecipou os temas que serão destaque na 3º Conferência Nacional de Promoção da Igualdade Racial (Conapir), entre terça (5) e quinta-feira (7). “Não vamos ficar presos aos campos da política publica e da denúncia. Vamos refletir o país e suas complexidades. A luta contra o racismo é necessariamente uma luta de classe”, diz.

O militante do movimento negro e também historiador se refere ao tema da Conferência “Democracia e Desenvolvimento sem racismo: Por um Brasil Afirmativo”. Apesar dos 10 anos de avanços após a criação da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial da Presidência da República (Seppir), que promove a Conferência, o movimento negro aponta para uma guinada no debate sobre conceitos e temas caros à população negra como economia e democracia, mas que ainda não têm recebido a devida atenção do movimento.

“É um tema muito caro para nós da Unegro. Porque obriga o movimento negro, a partir de seu olhar, pensar na nação. Você não discute desenvolvimento e democracia pensando somente em uma parcela da sociedade. Portanto, obriga o movimento a avançar na pauta que é exclusivamente racial e pensar como maioria populacional já que somos 50,6% da nação e pouco temos contribuído para a estratégia nacional”, explicou.

Democracia sob a ótica do movimento negro

Discutir a questão racial de uma forma mais abrangente é um dos objetivos da Unegro durante a Conferência.”Nos acreditamos que o movimento negro sairá com um nível maior de entendimento, de como estruturar sua luta daqui para frente. Não vamos ficar presos ao campo da política publica e ao campo da denúncia. Vamos pensar um pouco o Brasil. Porém, com uma limitação obviamente porque o movimento social negro nunca fez essa reflexão. Se tem é algo individual, isolado. O movimento negro tem uma dificuldade crônica, por exemplo, de discutir um tema como Economia e de considerar esse debate importante para a questão. O movimento também subestima a discussão da democracia também, entende democracia de uma maneira muito limitada”, pondera Edson França que acredita que o racismo não será combatido somente com políticas públicas. “Nos temos que construir uma nação diferente, mais inclusiva, são outras dimensões de luta, de reivindicação de construção”, completa.

O principal gargalho do movimento negro é a representatividade nos espaços de representação: “Temos direito ao voto e tudo aquilo que a democracia formal oferece à população negra. Mas, precisamos avançar na representação de negros e negras nos espaços de poder. Vamos chamar a atenção, para um maior envolvimento do movimento com a reforma política, por exemplo”.

A sub-representação da população negra é absolutamente evidente. Apenas 8% dos parlamentares brasileiros são negros. Dos atuais 40 ministérios do Governo Dilma, somente um é liderado por uma mulher negra, que é justamente a Seppir. Das 50 maiores estatais brasileiras, apenas uma delas tem um negro na presidência.

Cotas

Outro ponto que será amplamente debatido na conferência são cotas raciais e sociais. Edson lembra que ainda não é uma luta vencida. “Apesar de haver uma lei federal, não temos em todos os estados, em todos os municípios. Além disso, precisamos dar condições aos estudantes que entram a partir da lei de cotas. Não adianta ter cota e não ter dinheiro para a condução ou para as refeições. Então é preciso consolidar essas políticas”, avalia.

A violência contra a juventude negra também é um tema bastante caro à Conferência. “Estamos com um problema grave que seremos cobrados pelos historiadores no futuro, que é o extermínio da juventude negra. A presidenta Dilma, inclusive, reconheceu esse problema recentemente”, destaca Edson, referindo-se ao assassinato do estudante Douglas Rodrigues, 17 anos, no domingo (27/10) por um policial militar na zona norte de São Paulo.

A questão quilombola também será abordada pelos militantes da Unegro durante a Conferência. “Atualmente, existem 2600 comunidades quilombolas. Dessas, nem uma dezena chegou a ser reconhecida. Tivemos um retrocesso”, lamenta Edson. Segundo o presidente da Unegro, a judicialização dos processos é o maior impeditivo para a regularização dos territórios quilombolas.

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