A luta do movimento estudantil, para permanência de estudantes bolsistas da Universidade Federal de São Paulo

É sabido que com a PEC 55/2017 (Emenda Constitucional) aprovada em 15 de dezembro de 2016, os gastos públicos com saúde, educação, assistência e todas as políticas de cunho social foram congeladas por 20 anos, afetando em pequeno, médio e longo prazo a educação no Brasil.

Os movimentos sociais brasileiros foram até Brasília várias vezes na luta para barrar a aprovação desta PEC conhecida como “a PEC do fim do mundo”. O movimento estudantil da UNIFESP-BS (Universidade Federal de São Paulo – Baixada Santista) radicalizou esta luta ocupando os campi da universidade agregando-se as outras instituições de ensino. Infelizmente não conseguimos impedir a aprovação.

Ocupa Brasília contra PEC 55 (arquivo)

Durante décadas o perfil dos estudantes das universidades públicas majoritariamente eram da elite, filhas e filhos de trabalhadores não conseguiam adentrar nestes espaços visto a concorrência desigual. A partir de propostas e enfrentamentos dos movimentos sociais esta realidade foi mudando aos poucos, através de leis de inclusão como por exemplo a conhecida lei de cotas, Lei nº 12.711/2012, que garante a reserva de 50% das matrículas por curso e turno a alunos oriundos integralmente do ensino médio público, em cursos regulares ou da educação de jovens e adultos.

A partir deste novo perfil, criou-se mecanismos para permanência dos mesmos entre eles o Plano Nacional de Assistência Estudantil (Pnaes) visando a permanência de estudantes de baixa renda matriculados em cursos de graduação presencial das Instituições Federais de Ensino Superior (Ifes). Os critérios de seleção dos estudantes levam em conta o perfil socioeconômico dos alunos. Conforme Art. 2o os objetivos do PNAES são:

I – democratizar as condições de permanência dos jovens na educação superior pública federal; II – minimizar os efeitos das desigualdades sociais e regionais na permanência e conclusão da educação superior; III – reduzir as taxas de retenção e evasão; e IV – contribuir para a promoção da inclusão social pela educação.

A UNIFESP possui o programa de permanência estudantil intitulada de PAPE (Programa de Assistência e Permanência Estudantil) que utiliza a verba do PNAES para sua efetivação e a atribuição dos auxílios são realizadas de acordo com as necessidades dos estudantes, identificadas por perfis socioeconômicos e distribuídas da seguinte maneira:

Perfil I: caracteriza situação de extrema vulnerabilidade socioeconômica;

Perfil II: caracteriza situação de alta vulnerabilidade socioeconômica;

Perfil III: caracteriza situação de média vulnerabilidade socioeconômica;

Perfil IV: caracteriza situação de baixa vulnerabilidade socioeconômica;

Perfil V: caracteriza situação de vulnerabilidade financeira;

A grande maioria de estudantes que se enquadra nestes perfis são alunos negros e pobres que necessitam das bolsas PAPE para garantir sua permanência e o término do curso de graduação.

No dia 21 de março de 2018 foi publicado pela PRAE (Pró- Reitoria de Assuntos Estudantis) o resultado da análise documental dos estudantes, que tiveram suas solicitações de bolsas deferidas e indeferidas. Para surpresa do movimento estudantil houve cortes de aproximadamente 318 bolsas permanências dos perfis IV e V, sob alegação de falta de recursos. Não podemos aceitar que estes cortes sejam realizados, isso é inadmissível.

A partir destas informações C.A.s (Centros Acadêmicos) realizaram uma reunião no dia 22 de março de 2018, quando se declarou estado de greve e se discutiu atual conjuntura brasileira, formas e estratégias de permanência.  A assembleia estudantil realizada no dia 26 de março de 2018 deliberou pela greve estudantil, para que possamos nos unir como corpo discente e lutar juntamente com a reitoria contra este sistema neoliberal e perverso.

Foto: Luciana da Costa

Na data do dia 27 de março de 2018, foi realizado uma plenária com a reitora da universidade, ao qual vários estudantes expuseram suas condições de não conseguir permanecer na universidade caso estes cortes sejam efetivados. Os estudantes foram informados que a prioridade da UNIFESP é a permanência estudantil, mas, que os cortes se deram devido ao aumento de estudantes universitários em situação de vulnerabilidade social, assim como, a redução da verba do PNAES. Após a plenária, os estudantes se direcionaram as ruas de Santos como forma de protesto, com o objetivo de alertar a sociedade sobre o que está ocorrendo.

No próximo dia 04 de abril de 2018 ocorrera a reunião no CONSU (Conselho Universitário UNIFESP), onde terá como pauta única a situação da bolsa permanência e a possibilidade de reversão destes cortes. E após esta reunião o movimento estudantil da UNIFESP se reunira em Assembleia Inter Camp para traçar as próximas ações, formando uma unidade de luta, para que não seja permitido esta evasão compulsória da classe trabalhadora da universidade.

Reduzir as bolsas permanências ou aprovar qualquer sistema que impossibilite que estes estudantes permaneçam na universidade, legitima este governo neoliberal e exclui estudantes negros e pobres das universidades.

Acredito ser necessário realizar uma luta em conjunto com a reitoria da UNIFESP, como historicamente já fora realizado em outros momentos, para que estes cortes sejam revertidos e se necessário iremos até o MEC (Ministério da Educação) por entender que estes cortes são resultados de uma política de desmonte das universidades públicas. Lutaremos também no enfrentamento ao atual Governo Federal que paga os juros da dívida pública aos banqueiros internacionais as custas de nossa educação, saúde e assistência!

Nenhum direito a menos

Nenhum estudante a menos

REFERÊNCIAS:

http://portal.mec.gov.br/pnaes

http://portal.mec.gov.br/cotas/perguntas-frequentes.html

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2010/decreto/d7234.htm

http://www.unifesp.br/reitoria/prae/programas/programas/pape

Luciana da Costa
Militante do Movimento Estudantil UNIFESP
Participante do Grupo de Estudos Reflexo dos Palmares
Estudantes do Curso de Serviço Social UNIFESP

** Este artigo é de autoria de colaboradores ou articulistas do PORTAL GELEDÉS e não representa ideias ou opiniões do veículo. Portal Geledés oferece espaço para vozes diversas da esfera pública, garantindo assim a pluralidade do debate na sociedade.

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