Mulher negra: tu és uma raiz sagrada

Contáramos estórias de negação. Açoitaram verdades sobre nós. Encobriram nossos traços para não reconhecer a nossa beleza. Demonizaram nossos rostos para não exaltar nosso sagrado. Legados históricos do que eu não sou.

Desnudar essa pele não é uma tarefa fácil. Há quem nos ensine sete passos de como recuperar o amor próprio. Mas não consideram que até o amor nos foi retirado. Toda uma subjetivação expropriada, mercantilizada, para esvaziar-nos do que é característico nosso. Nossa ontologia nunca foi (re)conhecida. Pelo contrário, aprisionaram-na em navios de aniquilamento existencial.

Impuseram-nos um jeito de não sentir. De resistir a dor. De sobreviver e não viver. De aceitar e não espernear. De ceder e não ser. De fincar e não atravessar. No entanto, esqueceram eles, que nenhum cativeiro, nenhuma senzala, nenhum mocambo, nenhuma periferia – e até mesmo nenhuma prisão – podem deter o esparramar das nossas raízes ancestrais.

E é essa raiz em nós que germinará a recomposição dos nossos afetos, do nosso próprio amor. O sopro intuitivo de olhar para si. De silenciar em meio aos ruídos polifônicos de uma sociedade que grita hipocrisia racial.

Podem verborragir receitas insossas de como se amar. Podem quebrar nossos corações com amores líquidos.

Podemos até nos tirar todos os espelhos concretos ao nosso alcance, para não nos enxergar.

Mas, jamais, conseguirão tirar a nossa capacidade de auto reflexo ancestral. De se olhar nas águas doces e se ver Oxum – a Deusa da Beleza e Amor – pois esse espelho nunca se quebra. E é com mel que ela cola os cacos do nosso coração partido e nos ensina que a delicadeza é uma espada.

Estou a(r)mada!

 


** Este artigo é de autoria de colaboradores ou articulistas do PORTAL GELEDÉS e não representa ideias ou opiniões do veículo. Portal Geledés oferece espaço para vozes diversas da esfera pública, garantindo assim a pluralidade do debate na sociedade.

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