Não me deem motivos

Maria Stella de Azevedo Santos

por Cleidiana Ramos Do Mundo Afro

Iyalorixá do Ilê Axé Opô Afonjá

Tim Maia cantava: “Me dê motivos para ir embora.” Eu digo: Não me deem motivos para ir embora! Por favor, construam e exponham para mim argumentos suficientemente convincentes para que eu deseje permanecer em um mundo onde os seres humanos disputam sem nem mesmo saber pelo que estão disputando; onde creio que tantas pessoas estejam diariamente realizando “o bom combate”, mas os meios de comunicação insistem em mostrar o que de ruim a humanidade produz.

Não entrarei no lugar comum de culpar os meios de comunicação. Também não culparei a atração natural que nós humanos temos pela tragédia. Aliás, não culparei nada nem ninguém. Culpa não é um sentimento que tendo a imputar aos outros, muito menos a mim. Como costumo dizer, seriamente brincando com a gramática: somos o que somos em progressão crescente.

Pesquisamos e descobrimos o pedido que o cantor da banda Charlie Brown Jr. fazia cantando, também pedindo insistentemente: “Me Dê Motivos Pra Sonhar.” Chorão morreu, ou melhor, buscou o mundo de sonhos onde, provavelmente, jamais encontraria: nas drogas. Seu companheiro de banda, Champignon, também se matou, desta vez com um tiro, em 9 de setembro de 2013. Quando Champignon perdeu dois de seus companheiros de música e poesia, o vocalista Chorão e o guitarrista Peu Sousa, declarou:

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“Os dois perderam a fé. Quando perdem a fé, perdem a vontade de viver. Foi mais um dia muito triste… Eu acho que as pessoas, em algum momento da vida, perdem a fé. Independentemente se morrem por droga, ou enforcadas. Se perdem a vida sem culpa de ninguém, acredito que em algum momento perderam a fé.” O que estamos fazendo ou faremos para que outras pessoas sensíveis não mudem de dimensão porque esta daqui está insuportável para elas? Acordei no dia 8 de setembro de 2015 com uma imensa vontade de escrever sobre a insensibilidade com que são tratadas as pessoas mais sensíveis; com uma “querência” enorme de não viver em uma “sociedade de poetas mortos”. As palavras iam sendo escritas na mente quando me lembrei que, durante a noite, tinha recebido um aperto de mão de meu pai já falecido.

Compreendi que os seres de outra dimensão desejavam falar comigo. Quem seriam eles? – perguntei-me. Foi só no decorrer do texto que um nome surgiu em minha mente: Chorão. Pensei que esta palavra simbolizava o choro pelas perdas por morte, mas uma de minhas filhas lembrou-se do cantor acima referido e pesquisando na internet descobriu que no dia 9 de setembro de 2015 faria dois anos de morte de seu companheiro Champignon.

Minhas bênçãos, então, a todos que se foram por que não suportaram a dureza dos moradores de nosso planeta, acompanhada de um pedido, ou melhor, de uma súplica: Não permitamos que o mundo em que vivemos se transforme, sem retorno, em uma sociedade de poetas mortos. Cumprindo minha parte, encerro com um poema de Pablo Neruda: “Desde então, sou porque tu és. E desde então és sou e somos… E por amor Serei… Serás… Seremos…”

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