Negros estrangeiros buscam Mama África paulistana

Segundo relatório da Polícia Federal de dezembro de 2013, 3.836 africanos moram legalmente na capita

Por: Eduardo Athayde

A principal cidade do país com mais negros fora da África tem poucos imigrantes vindos daquele continente. Segundo relatório da Polícia Federal de dezembro de 2013, 3.836 africanos moram legalmente na capital. A Secretaria Municipal de Direitos Humanos diz que, com os ilegais, o total passa dos cinco mil.

Mesmo assim, o número é muito inferior ao da imigração vinda de nações europeias, sul-americanas e asiáticas (ver tabela ao lado). São 78 mil os portugueses que vivem em São Paulo, bolivianos, 63 mil e japoneses, 36 mil. Os nascidos em Camarões, país adversário do Brasil hoje em jogo pela Copa do Mundo, são apenas 114.

Por serem poucos, os africanos moradores de São Paulo concentram-se em espécies de guetos localizados, principalmente, no Centro, em bairros como Campos Elíseos, Bela Vista, Brás e Liberdade. Na Zona Leste também existem redutos africanos. Guaianases e Mooca destacam-se. Ainda há a presença de africanos em Santana e Tucuruvi, Zona Norte, e Raposo Tavares, na Zona Oeste.

Pobreza nacional

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Uma das possíveis explicações para a ainda reduzida presença de africanos no Brasil pode ser obtida com as palavras de Adama Konate, de 33 anos, que veio do Mali para São Paulo em 2012. “Na África, o que se fala do Brasil, além do futebol, é sobre a pobreza. Só que quando a gente chega no país percebe que não é assim. O Brasil é um país desenvolvido, rico, com muita coisa moderna. Eu fiquei impressionado. A Copa está valendo para reverter ainda mais essa visão errada.”

Segundo Paulo Illes, coordenador de políticas para imigrantes da Secretaria Municipal de Direitos Humanos, São Paulo costuma ser local de trânsito de imigrantes africanos. Vem do Senegal a onda imigratória africana que atualmente preocupa Illes. “De 2010 para cá, a quantidade de senegaleses que vieram para São Paulo aumentou numa proporção bem maior do que a de outras nacionalidades africanas”, disse.

Segundo ele, a anistia aos imigrantes ilegais concedida pelo governo federal em 2009 fez com que muitos africanos  regularizassem a sua situação. “Por outro lado, os que vieram depois disso, como é o caso dos senegaleses, muitas vezes ficam na cidade clandestinamente.”

Metrô, religião e sensualidade geram estranheza ao africano

Quando chegam a São Paulo, muitos nascidos na África costumam estranhar algumas características brasileiras. Nascido no Mali, país africano que atualmente vive uma guerra civil, Alpha Sidibe, de 27 anos, há nove meses em São Paulo, é um dos africanos que chegou à capital sem jamais ter  pego Metrô. “Eu estava meio perdido quando cheguei na estação pela primeira vez. Mas os brasileiros me explicaram tudo direitinho.”

O malinês Adama Konate, de 33 anos, é muçulmano, assim como a maioria absoluta dos malineses. De acordo com o calendário islâmico, sexta-feira carrega a sacralidade máxima da semana, diferentemente do tempo cristão, que tem no domingo o dia de rezas mais importantes. “No meu país, na sexta-feira fecha tudo. É como o domingo por aqui.  Demorou para eu me acostumar com isso.”

O camaronês Vitor Macaia, de 47 anos, é dono de um  restaurante  no Centro (leia na pág. 2).  Para ele, a sensualidade brasileira foi uma das diferenças comportamentais que ele mais estranhou quando chegou ao Brasil, há nove anos. “Em Camarões não convém  mulher grávida andar com a barriga de fora. Por aqui, é comum. Os homens camaroneses também não costumam andar na rua sem camisa, como os brasileiros. Os pequenos shorts das mulheres também me chamaram a atenção.”

Comida do continente virou moda no Centro

Os restaurantes africanos estão deixando de ser um ponto exclusivo de imigrantes do continente para se transformarem em espaços visitados por um público brasileiro jovem, de classe média alta, que quer experimentar as delíicias da “mama África”.

Na última sexta-feira, a produtora cultural Aline Damásio, de 29 anos, esteve pela primeira vez em um restaurante africano. “É uma comida que me lembra algo da culinária nordestina: bastante mandioca, banana, galinha. A textura dos pratos é maravilhosa.”

Aline pediu prato típico da culinária senegalesa chamado tiep, composto por arroz temperado, carne, cenoura, batata-doce e mandioca.

A professora universitária Alessandra Lima, de 36 anos, pediu fumbua, prato típico de Angola, Congo e Tanzânia. “Vai pasta de amendoim forrada com azeite de dendê, camarão moído, fumbua (folha típica da África), mandioca e galinha frita. É sempre bom ter contato com novas culturas e a gastronomia é um dos modos mais eficazes de ter acesso ao jeito de ser de um povo” disse.

Os preços dos pratos são acessíveis e dificilmente custam mais do que R$ 20.

Tempero/ A senegalesa Mariana Ba, de 26 anos, é uma das cozinheiras de um dos mais movimentados restaurantes africanos no Centro, localizado na Alameda Barão de Limeira. “Na culinária africana vai muita especiaria, batata, banana, frango, milho”, afirmou. Mariana disse sentir falta de peixes nos pratos brasileiros. “Em Senegal come-se muito peixe. Em São Paulo, nem tanto.”

De acordo com Mariana, um dos destaques da culinária africana é a presença de pimenta. “A gente gosta de pimenta, que pode ser usada diretamente no prato depois de pronto ou durante a sua elaboração. Fica a gosto do cliente”, disse a senagalesa.

ENTREVISTA 

O camaronês Vitor Macaia, de 47 anos, é dono de um restaurante camaronês que faz o maior sucesso no Centro. Tanto que a mulher dele, cozinheira do restaurante, é a cozinheira chefe da delegação de Camarões na Copa do Brasil. Veja abaixo os principais trechos da entrevista com ele.

DIÁRIO: Quais são os principais pratos de Camarões no cardápio do seu restaurante?

VITOR MACAIA: São dois. O DG, composto de banana-da-terra frita com legumes e galinha e o mbonge tchobi, feito com bagre ou corvina, tempero africano e mandioca.

DIÁRIO: Seu restaurante não é frequentado apenas por africanos, mas também pela classe média paulistana e por estrangeiros de outros continentes. Por quê?

VITOR MACAIA: As pessoas têm curiosidade de saber como é a culinária da África. O famoso boca a boca também tem nos ajudado.

DIÁRIO: Sua mulher é a chefe da cozinha da seleção de  Camarões durante a Copa no Brasil. Os jogadores camaroneses são muito exigentes?

VITOR MACAIA: (Risos) Minha mulher tem trabalhado bastante e está fazendo falta aqui no nosso restaurante. Eles são normais. Gostam do que todo camaronês gosta na cozinha.

DIÁRIO: E hoje seu coração vai torcer para o Brasil ou para Camarões?

VITOR MACAIA: O jogo para o Brasil seria mais difícil se Camarões ainda tivesse chances de passar para a próxima fase. Vou torcer para os dois.

Fone:Diario de S Paulo

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