No Governo Dilma as mulheres estão reclamando de barriga cheia?!

Fátima Oliveira

Estela e Gracinha tomavam uma fresca na calçada enquanto conversavam sobre os festejos de Natal da Chapada do Arapari. Na frente da casa, as meninas brincavam de roda e os meninos de “aventura”, que nada mais era do que brincar de esconde-esconde.
– Lembra Estela como tu gostavas de brincar era com os meninos?
– …
– Donana sempre que precisava ir lá dentro de casa, recomendava: “Olho em Estela, pucardiquê se descuidar ela larga a roda e vai brincar com os meninos…”
Estela gargalhou que se engasgou. E Pedro, o marido dela, também rindo, falou: “Ah, era Dona Estela? Eu nunca soube disso. Quer dizer que…”
– Nada! Absolutamente nada Pedro. Apenas que eu achava de uma mesmice entediante todo dia brincar de roda, comportadamente. As brincadeiras dos meninos eram mais atraentes. Com uma semana aqui eu não aguentava mais cantar “Terezinha de Jesus”… “O cravo brigou com a rosa”… Mas hoje em dia menino também brinca de roda! Naquele tempo, não!

Nisso chega Cesinha esbaforido…
“Que foi menino, viu ‘visage’, e foi?” Indagou sua mãe Gracinha. Ele calado estava, calado ficou. Pedro insistiu: “Desembucha correio da má notícia, como diz Dona Lô”.
– Nada, não! Vocês sabem a lista todinha das mulheres que vão pra posse de Dilma em Brasília no ônibus de Dona Lô? Sabiam que na hora do sorteio, Dona Nem, a professora, deu uma “sapituca”, que caiu durinha no chão e a saia ficou levantada?
– Hem-hem… Conta mais, conta mais Cesinha…
– Ora mãe, só isso!

– Viiiiiixe, foi mesmo, mulher! Esqueci Mas isso foi cedo da tarde. E só agora à noite esse moleque me aparece… E aí Cesinha, mais alguma lorota?
– Bem, hem-hem. Dona Lô e Mãe Zefinha não entraram pra sorteio nenhum. Quer dizer, as duas estavam com a viagem garantida. Outra garantida, aí completam três, quer dizer, garantidonas, foi “Gracinha, que Dona Lô precisa de um adjutório na viagem. Melhor levar Gracinha que está acostumada com as manias dela”…
– O quê? Disseram assim mesmo Júlio César?
– Foi o que ouvi, viu Estela! Posso ter ouvido errado, né? Mas é certo que Gracinha foi a terceira escolhida…
Pedro, se lavando de rir: “E aí Gracinha, você queria ir? Ganhou a viagem como dama de companhia de Dona Lô. Você né mole não, hein?! E o quê mais Cesinha? Lasca aí o lance de Dona Nem dando “sapituca”?
– Rapaz, foi feio, viu? Até fechei meus olhos… Aquilo é uma maluca. Não suportou ficar de fora. Todas as mulheres disseram que ela se arrependeu tarde demais. Votou em Serra nos dois turnos. Agora, na hora de viajar no bem bom, vem dizer que agora ela é Dilma? Não colou de jeito maneira. A mais danada contra ela foi Mãe Zefinha, que até levantou “ligerim”, “ligeirim” daquela cadeira dela e foi bem “pertim”, quase com o dedo nas ventas, da professora e disse: “Traíra, traíra, traíra! Xô traíra!”
– …
– Aí entrou a turma do “deixa-disso” puxando Mãe Zefinha e pedindo calma, quando Dona Nem “pá-pum”, caiuuuuuuuuuuuuuu!
– Valei-me! Se fosse uma das mulheres mais velhas daqui, de certeza estaria sem calcinha! Cê sabe né Estela que antigamente, há uns cinquenta anos, as mulheres só vestiam calcinha pra sair… Em casa, não precisava… Continue Cesinha!
– Enfim, resolveram não fazer sorteio. Levantaram quantas casas criavam porcos e galinhas de meia. Deu um total de quarenta. E fizeram o seguinte: cada casa escolheu a mulher representante dela. Aí deu quarenta e três passagens, contando com Mãe Zefinha, Dona Lô e minha mãe Gracinha, que nem sei se vai, se vai querer ir e me deixar aqui sozinho, tantos dias, né?
– “Quêquisso” Júlio César, virou bebê agora, e fooooi?
– Nada, não mãe! É que eu pensei…
– Pois todo penso é torto. Fique frio, porque eu não vou perder essa viagem por nada no mundo, está me ouvindo? Quero ver Dilma receber a faixa presidencial de Lula!
Nisso toca o celular de Estela, que diz agoniada: “Pááááára aí Cesinha. É Dindinha! Deixe eu falar com ela depois cê continua, tá?”
– “Bença” Dindinha! Tudo bem por aí? Chegamos hoje. Pedro decidiu ser o Papai Noel da meninada e comprou brinquedo para todas as crianças daqui. Ah, sim, pela primeira vez deixou a “canhenguice” de lado e meteu a mão no bolso, sem dó! Sim, até eu fiquei espantada… Pedro, ela está agradecendo.
– Diga que depois quero falar com ela. Preciso saber o que ela achou do ministério de Dilma…
– Hem-hem… Hem-hem. Chegamos cedo. Já conversei com todas as mulheres. Tudo no jeito! As bebidas e a sobremesa por conta da casa. Gracinha já organizou tudo. Faremos aqui dez perus assados no forno e o restante, quer dizer, arroz, farofa e uma salada, todo mundo trás de suas casas, como sempre foi – de acordo com o número de pessoas que vierem de cada casa pro almoço.
– Estela, diga pra ela que Memélia ganhou um cabrito, que vai fazer no “bafo” pra trazer também pro almoço.
– Ouviu o quê Gracinha disse? Está bem! Ótimo, não preciso repetir! As mulheres se dividiram entre si e trarão cinco leitoas, assim de uns dez quilos cada. Acho que dá, não? Se sobrar a gente divide quando terminar o almoço. Sim, teremos mais ou menos cem a cento e vinte pessoas em nosso almoço comunitário de Natal. No ano passado deu cento e cinquenta? Olhe tem comida demais. Dá pra quem chegar. Fique fria… Agora espere que Pedro vai falar…
– E aí Dona Lô, como vai? Pronta pra enfrentar a Belém-Brasília de buzão? Já vi que por Dilma a senhora faz qualquer coisa! E aí, que tal o ministério? Poucas mulheres? “Quêquisso”, Dona Lô? Nove mulheres em trinta e sete, é muita coisa, senhora! E nós, quer dizer o PMDB, ainda perdemos o Ministério da Saúde… Achou foi bom? A senhora conhece o Alexandre Padilha? De onde Dona Lô pra ficar assim toda, toda, hein? Só de ouvir dizer? Ah, deu pra emprenhar pelo ouvido também?

– Só isso o quê menino “malino”? Toda vida malinando no que não deve… Quem te mandou ir à casa de Memélia, bem na hora em que as mulheres estavam resolvendo quem vai viajar? Me diiiiiiiiga?!
Estela, que não conseguia segurar o riso, saiu em defesa de Cesinha: “Ô Gracinha, lembra que você pediu pra ele ir lá em Memélia buscar folha de malva-do-reino para fazer o lambedor que Dindinha pediu pra levar na viagem?

– …
– Poucas? Não gostou? Queria paridade de gênero? Aí não dava, senhora!
– …
– Ou então queria um ministério só de mulheres? Assim também não, minha linda! Vocês querem é tomar conta de tudo, é? Calma… Muita calma. Saíram ganhando. Veja bem… Tão no lucro… Estão reclamando de barriga cheia! Dilma empurrou muito! Dá quase 30%, na cota de mulheres candidatas, né não? Reclamando por que de negra só tem a Luíza Bairros?
– …
– Ela, a Luíza Bairros, é a única negra em todo o ministério? Dilma ficou mal na fita com os negros? Acha que Dilma aí meteu o pé no jacá? Poderia ter colocado mais o pé na senzala? Acha mesmo que precisava? Ô Dona Lô, é ministério, não é frente minha amiga, mesmo sendo um governo de coalizão! A culpa é da agenda do racismo oculto? Que diacho é isso, senhora? A senhora né fácil não, viu Dona Lô? É difícil demais lhe agradar, senhora! O seu nível de exigência é alto demais! Dilma está é frita com uma amiga assim que nem você!

– …
– Machista meu PMDB porque não indicou nenhuma mulher pra ministra? Discordo! Só tivemos seis vagas, alías cinco, porque uma não conta. Sim, aquele! A Dilma o escolheu, não foi o partido! O PCdoB também? Mas como, se era só um ministério? Não deixou? O PSB, o PDT, o PR e o PP também são machistas? Você tá demais hoje, viu Dona Lô! Como que o partido que só tem uma vaga e escolheu homem para ocupá-la é machista? Poderia algum deles ter feito o “agá” e escolhido uma mulher? Sei não! (E colocando a mão no fone, disse: “Estela, ela é o cão! Está dizendo partido por partido quem é o ministro escolhido!”).

– Ah, então a senhora está satisfeita com as mulheres? Entendi! Embora sejam só nove, vão dizer a que vieram e mudar a cara do governo e o jeito de governar? Entendi! Sim, Estela conhece a Luíza Bairros. São colegas de profissão. Ambas são sociólogas. Estelinha tomou o maior porre quando saiu a confirmação da Luíza. A senhora também?! Estela, ela quer saber se você conhece a Iriny Lopes? Nããão? Nunca viu? Ouviu Dona Lô? Ela está dizendo que as Mulheres do PT garantem…

– …
– Então, tá! Vamos conferir: Mulheres do Ministério da Dilma – PT: Miriam Belchior (Planejamento); Ideli Salvatti (Pesca); Maria do Rosário (Secretaria de Direitos Humanos – SDH); Luiza Bairros (Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial – Seppir); Tereza Campelo (Desenvolvimento Social); e Iriny Lopes (Secretaria de Políticas para as Mulheres – SPM). As sem filiação partidária, são: Helena Chagas (Comunicação Social); Izabella Teixeira (Meio Ambiente); e Ana de Hollanda (Cultura). PMDB, PR, PDT, PP, PCdoB, PSB: nenhuma!

Fonte: Tá Lubrinando

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