De uma viagem à África, o rapper paulista Emicida, 31 anos, concebeu o elogiado álbum Sobre Crianças, Quadris, Pesadelos e Lições de Casa. E, com ele, aproveitou para afiar ainda mais o discurso sobre identidade negra, desigualdade social, miscigenação. Mas, o disco lançado em 2015 já não é mais o mesmo no palco, como você verá no show que o artista faz domingo na Concha Acústica do TCA, com abertura de OQuadro. Em entrevista rapidinha ao CORREIO, Emicida explica o motivo e fala sobre a cena rapper no Brasil e em Portugal.
Você já está rodando há tempos com a turnê de Sobre Crianças…, cujo show inclui também versões pra faixas de Glorioso e coisas do início da carreira. Como é que esse show foi amadurecendo? Está muito diferente do projeto original ou você é daqueles que segue um script?
Eu diria que ele segue com o mesmo pano de fundo, que é o disco, a viagem para a África, mas você tem razão, o show foi mudando bem desde a estreia, lá em 2015. Eu não sigo scripts, gosto muito de sentir a energia do público para decidir o que apresentar. Então, muita coisa acaba sendo resolvida na hora mesmo. Isso é muito importante para mim, estar conectado com quem está à minha frente.
No meio do caminho, ainda trabalhando com Sobre Crianças, você está para lançar Língua Franca, projeto coletivo com Rael e os portugueses Capicua e Valete. Como foi essa interação com o rap português? A cena por lá é forte?
Saíram 2 singles até agora, o disco deve sair até o fim do mês. Há uma cena forte em Portugal e o rap brasileiro conhece os artistas de lá, assim como os portugueses conhecem alguns artistas do rap daqui. Em minhas turnês pela Europa sempre pensei porque é que não estamos mais conectados, já que falamos a mesma língua…
Por falar em cena, o rap no Brasil entrou num outro patamar, desde o estouro dos Racionais, né? E tem alcançado um público mais amplo graças a artistas como você, Criolo, Karol Conka… Para além de um mercado que se abre e fortalece, na sua opinião, qual a importância disso no Brasil de hoje?
É importante os artistas da música rap poderem viver com dignidade de sua arte fazendo aquilo em que acreditam e da forma que querem. É bonito ver o rap em grandes festivais, tocando em eventos com boa estrutura. Acho que este é o caminho.
Eu venho de uma geração que viveu a abertura política nos anos 80 e o rock nacional como agente de conscientização social da garotada da época. Curioso é que agora, com a retração do rock como movimento, esse papel parece estar na mão do rap. Você concorda?
Não concordo. Existe um ponto em que as duas coisas se cruzam em razão dessa origem do rap nas quebradas, mas não que precise estar necessariamente nas mãos do rap ou do hip hop fazer essa conscientização. Acho que essa responsabilidade é de todos como cidadãos. É perigosa essa associação porque nos coloca naquela prateleira que estabelece que nossa música pode ser isso mas não pode ser aquilo, e acima de tudo o rap também é música, arte. Não concordo com a ideia de aprisionar a arte, acho que o rap pode ser sobre o que ele quiser.
Que tal tocar na Concha? Conhece OQuadro, que fará a abertura da noite neste domingo?
Conheço, já nos apresentamos juntos outras vezes. Estou feliz porque amo tocar em Salvador. Junto de amigos que fazem um som bacana é melhor ainda, estou ansioso.
Serviço: Concha Acústica do TCA (Campo Grande). Domingo, às 18h. Ingresso: R$ 40 | R$ 20. Vendas: bilheteria do TCA, SACs Barra e Bela Vista.