O documento, encomendado pelo presidente francês, pode ter um grande impacto nos museus europeus
no Visão.Sapo
Está à vista de todos. Muitos museus europeus (sobretudo de antigas potências colonizadoras) estão cheios de obras de arte africanas. É um facto conhecido por todos que estes tesouros não foram propriamente oferecidos.
Agora, um relatório de dois académicos, a quem o presidente francês Emmanuel Macron pediu propostas para a restituição de peças de herança cultural africana, vem dizer inequivocamente que as obras que foram retiradas e enviadas para França sem o consentimento dos países de origem devem ser devolvidas se os mesmos países de origem as pedirem.
Este processo de restituição – continua o relatório dos académicos Bénédicte Savoy e Felwine Sarr, a que o jornal The New York Times teve acesso – deve ser feito de forma colaborativa, com a informação a ser recolhida e analisada, com trocas de conhecimento científico e formação de profissionais.
“Não posso aceitar que uma grande parte da herança cultural de vários países africanos deva estar em França. A cultura africana deve ser mostrada em Paris, mas também em Dakar, Lagos ou Cotonou. Essa será uma das minhas prioridades”, disse o presidente francês, há um ano, perante uma plateia de estudantes em Ouagadougou, capital do Burkina Faso.
Se as propostas do relatório forem levadas adiante, poderá isso significar o esvaziamento de alguns museus franceses como o Quai Branly, que expõe 70 mil peças de arte da África subsariana? “Essa não é a questão”, disse Bénédicte Savoy citada pelo The New York Times. “Trata-se de equilibrar a geografia da herança cultural africana no mundo, em que os museus europeus têm quase tudo e os museus africanos quase nada”, acrescentou. O relatório sublinha que 90 a 95% da herança cultural africana não se encontra em África mas em grandes museus ocidentais.
O relatório recusa ainda uma solução como a que está a ser negociada entre o British Museum, em Londres, e a Nigéria, para que sejam emprestados a este país africano importantes esculturas que foram retiradas do antigo reino do Benim. O relatório francês é categórico em afirmar que a restituição deve ser permanente. A concretizar-se a vontade de Macron, a decisão dos franceses pode ter implicações em muitos outros países, incluindo Portugal.