Uma intervenção radical sobre as formas tradicionais de observar negritude e branquitude procura subverter o olhar branco hegemônio e suas objetificações
Por Rosane Borges, Do OutrasPalavras
MAIS:
Este texto é o prefácio da edição brasileira de:
Olhares Negros — raça e representação
Bell Hooks — Editora Elefante — R$ 49,90
Lançamento: 12/3, terça-feira, às 19h
Tapera Taperá — Av. São Luís, 187, 2º andar — São Paulo
Debate com Rosane Borges, Mariléa de Almeida, Natália Neris | Mediação: Camilla Dias
Costuma-se afirmar que cada tempo possui configurações e desafios políticos específicos. O século XIX, pedaço da história em que o homem ocidental se afirma como sujeito que conhece e pensa por meio das representações do mundo, colhe os frutos da revolução tecnocientífica: foi uma época de crença entusiasmada na noção de progresso e na filosofia da consciência. Um tempo em que certa concepção de humanismo apostava na civilização, na felicidade e na realização individual. O sintoma de que algo não ia bem num contexto tão alvissareiro vem com a psicanálise, fundada por Sigmund Freud.
O século XX é visto como o século tanto do átomo e do cosmos quanto da linguagem, momento em que as promessas do projeto de modernidade, tão em voga no XIX, passaram por duras reavaliações. A barbárie, vista na versão edulcorada do XIX como algo soterrado em camadas distantes da nossa história, volta assustadoramente com as duas grandes guerras mundiais, reacendendo os faróis do desamparo e do horror. Os filósofos da decepção diriam que o céu de brigadeiro pintado pelo Iluminismo fora uma ilusão. Mais do que uma ideia linear de progresso, o século XX, pelo triunfo do capitalismo e da tecnociência, nos ensinou que o projeto de modernidade carrega em seu germe a ideia de perpétua crise, que se fez sentir por todos os terrivelmente outros, não contemplados por uma concepção de humano e humanismo: negros e indígenas, asiáticos e africanos.
Seguindo a tarefa de etiquetar os momentos históricos, eu arriscaria dizer que a nossa época, o século XXI, está sendo marcada por embates na ordem do imaginário, por uma guerra de imagens e signos, por uma sede de representação e visibilidade — até análises sobre o Estado Islâmico buscam no estatuto da visibilidade e da sociedade do espetáculo as chaves de compreensão desse fenômeno complexo. Não sem motivos, entre as certezas que cultivamos, ainda que provisórias, em tempos tão voláteis, seguro-me a essa ideia de modo ferrenho, como um horizonte epistêmico.
Não podemos desconsiderar que a proeminência desse traço reacendeu uma discussão bizantina, que se perde sob os lençóis do tempo: as supostas altercações entre universalistas e particularistas — ou identitaristas, para alguns.
Presos a uma concepção (decadente) legada pela modernidade, os que caem nessa armadilha (universalistas versus identitaristas) reduzem as reivindicações dos grupos historicamente discriminados a uma questão específica, identitária, como se identidade fosse coisa pouca. Pior: acusam esses grupos de desviarem a luta fundamental (contra o capitalismo, contra as estruturas) para caminhos curtos, adiando ou inviabilizando as mudanças necessárias, que ganhariam força quando levadas adiante por sujeitos indistintos, sem marcadores de raça, gênero ou orientação sexual, entre outros.
As discussões em torno das novas ordens de representação e novos regimes de visibilidade habitam o coração da política global contemporânea, que tem como um de seus principais fundamentos a indissociabilidade entre política e representação. Nessa chave, é preciso defender uma ação transformadora capaz de encontrar maneiras de (re)inventar um mundo possível, numa perspectiva estética, ética e política. As antigas ordens de representação, agora em crise, mostram-se incapazes de abarcar o “mosaico possível de acepções do humano”, o que supõe a tarefa de fundar uma nova gramática política, livre das orientações de um pensamento oxidado. Não se deve reduzir a questão ao par universalismo e particularismo, no qual muitos querem alocá-la.
Eis que a Editora Elefante, com apoio da Fundação Rosa Luxemburgo, traz ao público brasileiro uma obra inescapável para pensarmos tais questões, que afligem e fraturam o mundo contemporâneo. Olhares negros: raça e representação, da pensadora e feminista negra norte-americana bell hooks. Por diversos motivos, essa publicação é motivo de celebração e ampla difusão.
Considerando a nova configuração do mundo, conforme esbocei brevemente acima, bell hooks se dedica a empreender uma crítica dos produtos e dispositivos da indústria cultural (filmes, livros, programas televisivos, ícones da cultura pop) que circulam na atmosfera do tecnocapitalismo planetário, da cultura-mundo, das trocas comunicativas que se intensificam por força da ubiquidade das redes de comunicação e expressão.
Oportunamente, podemos questionar: o que uma crítica ainda pode realizar se, desde a dissolução dos movimentos de emancipação, vivenciamos uma monotonia da teoria? O que ela ainda tem a nos dizer em tempos tão cansados de teoria?
Se “cada crítica é um trabalho pioneiro na dor do tempo e um pedaço de uma cura exemplar”, como anunciou o filósofo alemão Peter Sloterdijk, Olhares negros é uma obra que incide nas dores do nosso tempo ao mesmo tempo que oferece a cura. De maneira arguta, a autora esclarece qual o objetivo e a quem o livro se destina: trata-se, segundo ela, de reflexões que levam, antes, a questionar os pontos de vista, a perspectiva que recorta e orienta nossa visão de mundo, principalmente quando a tela é emoldurada pelas pessoas negras e pelos signos da negritude. O foco se desloca das práticas costumeiras que se dedicam a pensar apenas nos bons e maus conjuntos de imagens. Em suma, o livro se volta a espectadores, na síntese de bell hooks.
Necessário se faz estacionarmos um pouco mais neste tópico (do ponto de vista, do espectador, de sua perspectiva), pois ele fundamenta todas as escolhas e opções teóricas e analíticas do livro, ao mesmo tempo que se presta para dimensionar a centralidade dos dispositivos do olhar para os modos de existência contemporâneos. Num mundo em que o olhar se tornou o neovalor do capital, como pensar as políticas da imagem, as relações de poder em torno dos regimes de visibilidade? Qual a potência de Olhares negros para promover deslocamentos nos sistemas de representação numa sociedade profundamente centrada na visão, na imagem e na tela?
É de dentro do edifício moderno que bell hooks aponta as bases carcomidas deste, convidando-nos a desertar dele. Mas o convite não é feito sem consequências: ao apontar o caráter traumático da experiência colonial, realçando o laço indissolúvel entre dominação e representação, ela nos oferece outro lugar, o lugar dos gestos de desobediência, da atitude revolucionária, para laborarmos em prol da emergência de outras ordens de representação que supõem a adoção de outros olhares.
Essa atitude revolucionária a que ela se refere tem, megalomania à parte, o estatuto da revolução copernicana, uma vez que bell hooks não apenas reivindica uma transformação nos modos de ver, mas questiona que olhar é esse que vê. Ao fazê-lo, nos põe em uma das veias por onde pulsa o projeto moderno: ao sujeito racional, senhor de si que pensa pela sua própria consciência, corresponde um sujeito que organiza a cena do mundo, que se institui como onividente universal.
Sabe-se que a função do olhar sofre uma mudança significativa na sociedade moderna. Para os povos antigos, o olhar tinha relação com o conhecimento e o desejo. A desconcertante História do olho, de Georges Bataille, nos leva a perceber, por meio de uma composição metafórica, que o olho passa por variações, adotando certo número de objetos substitutivos, conservando sempre seu aspecto voraz.
Voracidade que se pode perceber na “dimensão maquínica” (fotografia, cinematógrafo, televisão/vídeo e imagem da informática) que produz e articula os discursos contemporâneos. As invenções tecnológicas da modernidade impactaram diretamente a construção do visível, modificaram a cultura e os sujeitos, constituíram um universo visual congestionado. O apelo à transparência e à visibilidade, a tirania da vigilância eletrônica (câmeras, imagens a partir de satélites, internet e redes virtuais), reposicionaram várias questões alusivas à função do olhar na contemporaneidade.
Segundo Jacques Lacan, “a função do olho pode levar quem procura esclarecê-la a longínquas explorações. Desde quando, por exemplo, a função do órgão, e logo de saída sua simples presença, apareceram na linhagem do vivo?”. É do conhecimento filosófico que provém um painel de referências sobre o olhar: a relação com o saber e o desejo, as distinções entre ver e olhar, os pontos de interseção entre o inteligível e o sensível, foram alguns dos temas recorrentes nas explorações filosóficas desde a Antiguidade.
Cotejando as concepções do olhar ao longo da história, Antonio Quinet diz que a investigação da Antiguidade tem algo a nos ensinar sobre o olhar da contemporaneidade, mas que foi apagado pela episteme da representação, marca do classicismo. O que seria esse algo que a filosofia antiga tem a oferecer e que foi apagado pela fenomenologia da percepção e pela óptica geometral? Sumariamente, seriam o desejo, o visível e o gozo, retomados pela psicanálise e rearticulados por bell hooks a partir de outras demandas.
Essa soberania do olhar não mais pelo viés do encantamento, mas pelo campo geometral, vai fazer com que a psicanálise opere aí também uma virada ontológica. O “cogito” do olhar cartesiano parte do entendimento de que o homem olha e organiza a cena do mundo, é um onividente universal. Retomando alguns princípios da filosofia antiga, Freud (com a pulsão escópica) e Lacan (com o objeto olhar) retomam a temática do olho não como fonte da visão, mas do desejo, da libido. Esse ponto de vista subverte os postulados da ciência moderna. Entre eles, destaco: “eu só vejo de um ponto, mas em minha existência sou olhado de toda parte […] para começar, preciso insistir nisso — no campo escópico, o olhar está do lado de fora, sou olhado, quer dizer, sou quadro”.
Essas ideias-estrela irão sustentar algumas subversões: não somos, por assim dizer, espectadores privilegiados dos fenômenos que nos rodeiam; ao contrário, há um olhar que vem de fora e que nos captura de forma inexorável. É na esteira da fenomenologia de Maurice Merleau-Ponty que Lacan vai postular uma preexistência do olhar, um dado a ver, tomando o olhar como um objeto — objeto “a”, objeto de instauração da falta, do desejo.
As capas de Olhares negros, em suas duas edições norte-americanas, incidem sobre essas questões: bell hooks esclarece que, na primeira edição, escolheu a fotografia de uma jovem nativa norte-americana de pele marrom. Na segunda, optou pela imagem de sua avó materna, uma mulher negra indígena, Sarah Oldham, filha de uma mulher cherokee.
Olhares negros e as novas epistemes visuais
Com essa operação, que é a um só tempo teórica, analítica e metodológica, bell hooks elabora um roteiro capaz de construir diques que contenham o reforço sistemático e a reescrita renovada da supremacia branca. Cada capítulo se mostra como uma plataforma potente para fazer surgir outro olhar e outros sujeitos. Não é à toa que a pensadora feminista intitula seu primeiro capítulo de “Amando a negritude como resistência política”. Também não é à toa que se alinha a verdadeiros faróis da reflexão e da ação política, como Malcolm X, Stuart Hall e James Cones (o teólogo que ousou elaborar um questionamento crítico da branquitude), o que se mostra suficiente para criticar os “monumentos brancos” que abordam o tema do reconhecimento do outro e da aceitação da diferença sem se desapegar das noções de semelhança, a exemplo do filósofo pragmatista e liberal Richard Rorty. A cultura de resistência requer uma avaliação de como a supremacia branca impacta coletivamente nossas psiques.
O segundo capítulo — “Comendo o Outro: Desejo e resistência” — faz morada no núcleo do livro: a diferença cultural e a Outridade como commodities para o usufruto de quem se reafirma hegemônico. bell hooks demonstra como a fascinação do Ocidente com o primitivo tem a ver com a sua própria crise de identidade: “do ponto de vista do patriarcado supremacista branco capitalista, a esperança é que os desejos pelo ‘primitivo’ ou fantasias sobre o Outro possam ser exploradas de modo contínuo, e que tal exploração ocorra de uma maneira que reforce e mantenha o status quo”.
A voracidade do olhar racista e sexista é exercida devorando corpos e culturas sem que haja uma redistribuição imaginária e real dos lugares dos sujeitos que têm o poder (os que olham e consomem) e dos que não têm (os que são vistos e são mercadorias de olhares).
Em “Mulheres negras revolucionárias: nos transformamos em sujeitas”, tema do terceiro capítulo, hooks se ocupa de ressaltar o protagonismo das mulheres negras para a construção de uma subjetividade negra radical. Antes, porém, delineia uma trajetória que flagra as dificuldades dessa construção, em virtude das narrativas de vitimização e auto-ódio que se tornaram predominantes para tipificar mulheres negras. bell hooks defende a ideia de que as experiências de luta das mulheres negras sejam consideradas para além do registro da dor e da falta. Pensar em termos plurais é a saída para que as nossas identidades sejam recuperadas fora do escopo das noções ocidentais de um ser unitário, como se fosse um bloco monolítico. As definições de um novo self das mulheres negras resulta de imagens que são constantemente reatualizadas nas narrativas ficcionais contemporâneas, sejam escritas ou visuais.
Tais reatualizações são escrutinadas no quarto capítulo, “Vendendo uma buceta quente: representações da sexualidade da mulher negra no mercado cultural”. De Josephine Baker, passando por Tina Turner e Naomi Campbell, a autora demonstra como o imaginário de uma sexualidade objetificada se encarna nas mulheres negras que compuseram as diversas esferas do estrelato em diferentes épocas do século XX. O corpo da sul-africana Sarah Baartman é o paradigma que oferece elementos para reafirmar uma sexualidade e uma corporeidade desviante ou exótica. Mas, como venho insistindo, não há rituais sem falhas, e os contradiscursos estão aí para estabelecer novos frames. bell hooks menciona os filmes Dreaming Rivers (1989) e The Passion for Remembrance (1986), produzidos pelo coletivo negro britânico Sankofa, como contrapontos importantes. Ela destaca ainda a produção fílmica de algumas diretoras como referências que se opõem a visões tradicionais da sexualidade das mulheres negras, tal como o filme de Kathleen Collins, Losing Ground (1982).
Como se vê, o trajeto percorrido por bell hooks é pontilhado de dificuldades, armadilhas, desafios. Uma das expressões dessas dificuldades é tratada no quinto capítulo, “Um desafio feminista: devemos chamar todas as mulheres de irmã?”, em que ela se detém, de maneira detalhada, nas denúncias de uma mulher negra, Anita Hall, contra o juiz Clarence Thomas. O episódio diz respeito às declarações públicas de Hall de que fora assediada sexualmente por Thomas, na época em que o magistrado foi indicado para a Suprema Corte dos Estados Unidos. O drama evidencia a força do patriarcado supremacista branco capitalista, que possibilitou a um homem negro, fora de sua lógica, integrar-se nele provisoriamente para deslegitimar uma mulher negra.
De que modo pensar, então, em outras projeções da masculinidade negra? Essa é a questão que orienta o capítulo seis, “Reconstruindo a masculinidade negra”, normalmente vista como rasa e unidimensional. Para bell hooks, as representações estreitas da masculinidade negra “perpetuaram estereótipos, mitos, e apresentaram relatos unidimensionais. Homens negros contemporâneos foram moldados por essas representações”. Desafortunadamente, ao tentar escapar dos estereótipos racistas, alguns homens negros não conseguem criticar as normas da cultura dominante sobre a identidade masculina, fazendo com que se tornem reféns de uma idealização falocêntrica de masculinidade.
Mas o mesmo olhar que subjuga, aprisiona, reduz e destitui pode sofrer processos inversos e se converter em um olhar insurgente. Novamente bell hooks convoca o papel das mulheres na condição de sujeitas dos modos de ver. O sétimo capítulo, “O olhar opositor: mulheres negras espectadoras”, oferece o outro lado da moeda. Como pensar na agência de mulheres negras (e homens negros também) sob a regência do olhar, considerando que “as políticas da escravidão, das relações de poder racializadas, eram tais que os escravos foram privados de seu direito de olhar”. A imbricação entre as relações de poder, as políticas da imagem e o dispositivo do olhar ganha centralidade neste item, enredando-nos nas temáticas gerais sobre as quais o livro se movimenta.
Nos capítulos oito e nove, “Filmes de Micheaux: Celebrando a negritude” e “Paris está em chamas?”, respectivamente, bell hooks irá examinar as imagens que supostamente desafiam e rompem com as representações convencionais da negritude, abrindo um leque de possibilidades para as identidades provisórias fornecidas pela performance do crossdressing e da drag queen, e de que maneira isso significa, para homens negros, um cota menor de poder, uma falta.
Os três últimos capítulos nos levam por pautas de intervenção a partir de situações em que um eu hegemônico e um Outro subalternizado duelam em torno das apropriações culturais de ambos. Em “Madonna: Amante da casa-grande ou irmã de alma?”, bell hooks levanta questões pertinentes para o debate sobre o amor declarado de pessoas brancas à negritude. Mais do que amor, a autora fala de inveja (notemos: a expressão vem de invídia, que deriva do latim como noção de ver, videre), que é sempre capaz de destruir, apagar, dominar e consumir o objeto de seu desejo: “É exatamente isso o que Madonna tenta fazer quando se apropria de aspectos da cultura negra e os transforma em mercadoria”.
Mas, o que dizer quando o Outro subalternizado tenta assimilar os símbolos da branquitude? Como reposicionar a questão da alteridade nesse processo que advém de uma recusa de si? Provocações de ordem filosófica e política desfilam no capítulo 11, denominado “Representações da branquitude na imaginação negra”.
O último capítulo apresenta, como era de se esperar, um roteiro propositivo para o combate da supremacia branca capitalista. Adequadamente, bell hooks aponta os fios de conexão que poderão aproximar os não hegemônicos: americanos nativos, afro-americanos e indígenas negros.
Ao percorrer essa variedade de reflexões, não há como negar que Olhares negros é um livro que nasce clássico, desafiando as políticas de visibilidade e as noções de representação, levando em conta o que significou e significa o processo de colonização e de dominação nos países marcados pela pior tragédia da humanidade: a escravidão transatlântica. bell hooks reafirma sua vocação de intelectual negra feminista que, de onde vê e intervém no mundo, oferece ferramentas teóricas e práticas para reescrever a história dos dominados. Tal reescrita não terá êxito se não implodir as formas de organização do olhar que esculpiram as pessoas negras e os símbolos da negritude como objetos que se prestam à espoliação e ao consumo.
Este livro é, portanto, uma referência obrigatória para os estudos visuais, as teorias da representação e do reconhecimento e os tratados sobre política global. Nas reivindicações por outras incidências do imaginário, é preciso requerer que os sentidos e os significantes asfixiados pela lógica da dominação ganhem vida e circulem socialmente como discurso, pois, como bem lembrou o psicanalista Alain Didier-Weill, “o significante não detém somente o poder de anular o sentido do código, como nos imprevistos, ele é também a pedra angular que pode ser substituída pelo rebotalho, pela escória: no lugar onde o real não teve acesso ao simbólico, jaz, prescrito, o significante, que pode voltar e recuperar aquilo que, um dia, deixou cair”.
Olhares negros é um regresso em busca daquilo que as narrativas hegemônicas “deixaram cair” ao longo da história. Consolida-se como uma obra que nos impõe um compromisso ao mesmo tempo epistemológico e ético.