Taís Araújo foi vítima de ataques racistas em sua página no facebook. Se isso me choca? Não mais, acho quase impossível ser negro e viver num país como o Brasil, que é altamente RACISTA, e não ser alvo desses ataques. Obvio que não desejo isso para ninguém, nem naturalizo esse fato. Apenas me irrita a forma imatura como as pessoas em geral tratam essas situações quando elas acometem figuras públicas. Novamente temos um caso de racismo sendo rebatido com hashtag #SomosTodos(coloque um nome aqui).
Por Stéphanie Ribeiro, do Imprensa Feminista
Queria muito saber quando as pessoas em geral vão parar de PERSONIFICAR racismo.
Vejo isso em vários movimentos: a necessidade do apoio pautada na desinformação, somada com a personificação, acabam só agravando a situação. Não estou dizendo que, nesse caso, Taís não mereça apoio. Estou dizendo que racismo é uma questão estrutural de uma sociedade que não debate esse assunto, e que prefere tornar isso algo pessoal. Se é pessoal, não é um problema coletivo, se não é coletivo nem todo negro sofre racismo, ou não estamos vivendo num contexto onde o racismo afeta a sociedade como um todo.
Ou seja, se é pessoal, podemos continuar vivendo o mito da democracia racial brasileira.
É lamentável quando casos de racismo como esse ganham a mídia, porém o debate sobre o assunto não é feito como deveria, inclusive garantindo o protagonismo negro. Perdemos a chance de falar o que é racismo e a quem ele atinge. A mídia, inclusive, prefere dar até o nome de “preconceito” . Fátima Bernardes em seu programa Encontro, vira e mexe resolve debater racismo (claro que ela chama de “preconceito”) de forma rasa e silenciando os negros convidados. Fazendo conclusões pacificas de uma situação que não sente na pele.
O negro brasileiro precisa deixar a passividade de lado e assumir que ou seremos mais combativos, ou vão continuar nos dizimando em todos os campos. Ou falamos o que realmente acontece, ou a Globo ainda vai noticiar casos de racismo nos EUA, dando o nome de racismo, e casos de racismo no Brasil, dando o nome de qualquer outra coisa, menos racismo.
Estamos em 2015 e se não quebrarmos o mito da democracia racial sempre que tivermos chances, espaço e voz, continuaremos sendo a maioria nas piores estatísticas. Não é com a Taís, é com todos nós, NEGROS.
É claro que do outro lado tem a branquitude festiva, que vai fazer textões de apoio, porém continuará segurando a bolsa mais forte quando avistar um negro na rua. Vai dizer que acha a Taís linda e que ela não merece isso, porém chamar negras de pele mais escura de “feias”. Vai dizer que não é racista e que o negro se vitimiza. Ou pior: vai dar conselhos de como agir. Quantas vezes não recebi indicações de pessoas brancas de como deveria lidar com racismo? Várias e várias, é sempre a mesma coisa: seja mais pacifica, mais contida, não fale dessa forma.
Depois partirá para o argumento do desvio de caráter: Eles são idiotas, não sabem o que estão fazendo.
Ninguém sabe o que está fazendo quando chama um negro de macaco? Quando amarra um negro num poste e surra ele até a morte? Não, ninguém nunca sabe o que está fazendo quando se é branco. Mas todo negro de 9 anos que comete pequenos delitos sabe o que está fazendo a ponto da mesma branquitude querer a diminuição da maioridade penal.
Quando cansam de ser parte de uma branquitude medíocre, vão fingir ser da branquitude empática: Tenho até vergonha de ser branco. Essa é a frase que mais falam.
Mas no fundo, ninguém que diz isso quer ser negro por um dia, ou realmente se importa a ponto de se aprofundar mais na questão racial e ler sobre os seus próprios privilégios. Textos sobre eles existem aos montes, porém o “branco empático” fica esperando tudo mastigado de um negro solícito.
As pessoas brancas que agem das formas citadas adoram a personificação do racismo, pois ele torna-se algo pontual. É mais fácil “resolver” aquela pequena situação do que assumir que eles, brancos, #sãotodosracistas.
A nós negros cabe a não personificação cômoda de quem vai lutar por nós, o militante mártir que resolverá todos os problemas, quase um Moisés. A gente precisa entender que o racismo é uma questão coletiva, contudo pequenas atitudes individuais tornam essa barreira gigantesca menor.
Eu sei que é muito complicado nosso discurso ser legitimado e nossa voz ganhar grandes proporções.
Entretanto, uma tempestade é feita de gotas. Seja na academia, na sua casa, nas rodas de amigos, nas redes sociais ou com o seu parceiro, fale de racismo, fale do que é ser negro, fale de nós.
Afinal nunca será demais lembrar que a verdadeira história dos mais de 500 anos de Brasil é marcada pelo sangue de quem tem cor.