“Passa só um batonzinho”: pressões de ser mulher em um ambiente corporativo

A imprensa francesa divulgou nessa semana os gastos do presidente Emmanuel Macron com serviços de maquiagem: 26 mil euros, cerca de 97,5 mil reais, em pouco mais de três meses de mandato.

no Estilo UOL

As altas cifras refletem a hipervalorização da beleza sustentada pela sociedade. Se para um presidente, homem, isso soa absurdo, a situação muda de figura quando a cobrança é direcionada às mulheres em ambientes corporativos.

Eu tinha me formado há dois anos e tinha duas estagiárias de Direito abaixo de mim. Uma delas, Bruna*, era loira, magra e classe média alta. A outra, Priscilla*, era negra, gorda e classe média baixa. No fim do ano, meu chefe me deu a missão de escolher uma das duas para efetivar, já que, por ter mais contato com elas, eu conhecia melhor o trabalho de cada uma. Recomendei a efetivação da Priscilla, que era mais proativa e entregava suas tarefas com mais qualidade. Na semana seguinte, fui informada que quem seria efetivada era a Bruna. A justificativa foi que ela se portava melhor e tinha ‘valores’ que eram mais alinhados com as políticas do escritório, um dos mais respeitados da cidade. Engoli a seco” Juliana*, 27 anos, advogada

Há sete anos, eu trabalhava como vendedora na sessão infantil de uma loja de departamento bem famosa em um shopping em Belo Horizonte. Uma vez, minha chefe passou por mim e disse que ‘esperava pelo dia em que eu me arrumasse para ir trabalhar’. Não entendi muito bem o que ela quis dizer com aquilo, já que eu usava as roupas que eram vendidas na própria loja no dia a dia, como era recomendado, e sempre prendia meu cabelo num rabo-de-cavalo perfeito. ‘Como as pessoas vão pedir conselhos fashion para você, se não te enxergam como exemplo?’, dizia ela. Meu trabalho realmente não era prestar consultorias de moda e beleza, mas vez ou outra ajudávamos quando nos pediam. Eu sempre bati minhas metas de vendas e nunca recebi reclamações de clientes. Além disso, eu trabalhava na sessão infantil” Fernanda*, 31 anos, gerente de loja

Eu era estagiária de uma grande editora em São Paulo. Lá eles tinham uma avaliação anual de feedback, onde sentavam o funcionário e o chefe para conversar sobre o desempenho. Elogiaram bastante meu trabalho e disseram que tinham apenas uma crítica a fazer: que eu me vestia muito mal. Continuaram dizendo que ali era uma vitrine de jornalistas e que eu estava sempre circulando em redações de veículos que um dia poderia vir a querer trabalhar, e que as roupas que eu usava não passavam uma imagem de respeito e maturidade. Saí de lá me sentindo mal e comentei com uma das minhas editoras o ocorrido. Ela sugeriu levar-me ao shopping para comprarmos umas roupas melhores. E foi isso que fiz” Marcela*, 29 anos, jornalista

As situações acima são comuns em ambientes corporativos pelo Brasil. Mas isso não significa que esteja dentro da lei. “Todo tipo de discriminação e preconceito não é legal. Na grande maioria das empresas ainda existe esse tipo de atitude machista. Reclamações sobre roupas ou maquiagem podem se expandir para outros níveis, como disparidade de salários entre homens e mulheres”, afirma Ana Claudia Athayde da Costa, diretora regional da Associação Brasileira de Recursos Humanos. “Por mais que a mulher se cuide, sempre haverá alguém que acha que ela deveria ser melhor”.

Assédio moral é crime, denuncie

“Assim como o sexual, o assédio moral é crime”, ressalta Ana Claudia. Com o UOL, ela compartilha algumas orientações sobre o que fazer nesses casos.

  • Nos exames periódicos, peça ao médico da empresa ou terceirizado que registre as queixas dos assédios;
  • Faça uma denúncia ao sindicato sobre o comportamento da empresa e de seus funcionários. Alguns instauram processos de investigação de forma anônima;
  • Registre e anote todas as ocorrências e encontre testemunhas, caso precise ser levado para a Justiça posteriormente;
  • Converse com familiares e amigos. Não guarde os fatos para si. Esse peso pode desencadear problemas psicológicos ou até de saúde.

*Os nomes foram trocados a pedido das entrevistadas

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