Paul Tudor Jones, o bilionário que quer repensar o capitalismo

Empresário alerta que ganância dos mercados e desigualdade de renda levarão a guerra ou revolução nos Estados Unidos

Do Cartaca Pital

Paul Tudor Jones é um gestor de fundos hedge (que oferecem proteção contra oscilações mais drásticas do mercado) popular nos Estados Unidos. Ele raramente dá entrevistas, mas algumas semanas atrás, ele esteve no palco da conferência sobre inovação TED Talk, na Califórnia, onde comparou a sociedade americana a um viciado em drogas.

“O primeiro passo é perceber que você tem um problema”, disse Jones, acrescentando que a obsessão pelo lucro se tornou algo tão normal que a sociedade deixou de perceber como, aos poucos, está destruindo a si mesma.

Ele afirmou estar preocupado com a crescente desigualdade de renda. Nos EUA, 1% da população recebe cerca de 20% da renda total do país. Até o final da década de 1970, ainda era menos do que a metade disso.

“O fosso entre os mais ricos e os mais pobres será fechado”, continuou Jones. “Seja através de revolução, impostos mais altos ou guerra.”

As palavras de Jones são especialmente notáveis, porque ele mesmo deve sua fortuna, de 4,6 bilhões dólares, principalmente à economia de livre-mercado, embora tenha se mostrado nos últimos anos extremamente altruísta, através de vultosas doações e da criação de fundações de utilidade pública.

A palavra “revolução” dita por Jones foi muitas vezes citada pela imprensa, especialmente por ter saído da boca de um bilionário. Pois, de fato, tem havido cada vez mais movimentos e protestos de cidadãos nos EUA nos últimos anos.

Há o Occupy Wall Street, organizado, em 2011, por estudantes que não querem mais se endividar excessivamente para terem acesso a educação. Trabalhadores do setor de serviços exigem um salário mínimo mais elevado. E a rebelião contra a violência policial e o racismo é mais forte nas regiões mais pobres.

“Muitos consideram tumultos como algo politicamente sem sentido e sem objetivo”, diz David Huyssen, professor de história dos EUA da Universidade de Yale, em New Haven. “Mas isso é completamente errado”, avalia.

Segundo ele, os protestos são, muitas vezes, o resultado e a reação a décadas de negligência econômica, discriminação e falta de investimento.

“Os distúrbios são a linguagem dos que não são ouvidos”, disse o ativista dos direitos civis Martin Luther King. Na história, tumultos e protestos foram muitas vezes o começo de uma revolução ou de uma nova ordem. Huyssen lembra que os movimentos trabalhistas do fim do século 19 e início do século 20 começaram de forma parecida.

“Propriedades foram destruídas, minas e ferrovias foram dinamitadas. Houve uma série de greves famosas em 1916”, ressalta Huyssen, autor de um livro sobre as revoluções trabalhistas do final do século 19, com foco especial em Nova York. “As pessoas gostam de esquecer que a violência foi um meio fundamental para os movimentos trabalhistas. E na época os trabalhadores reclamavam de desigualdade de renda, más condições de trabalho e baixa remuneração dos trabalhadores da indústria.”

Mas o historiador David Huyssen não acredita que os EUA estejam diante de uma nova revolução, até porque a violência na vida cotidiana há cem anos tinha um papel mais forte do que hoje. Ele diz que os ativistas da atualidade vão demorar a perceber que são unidos pelo mesmo interesse próprio, “como opositores de um sistema que os oprime e discrimina”.

O bilionário Paul Tudor Jones afirma que as empresas deveriam se engajar mais para o bem comum. Uma organização sem fins lucrativos fundada por ele tem a missão de, através de pesquisas, descobrir como isso pode ocorrer.

Ao mesmo tempo, Jones tem sido tradicionalmente um partidário dos republicanos, que são contra o aumento do salário mínimo. Segundo Huyssen, isso já existiu antes na história. “É o chamado filantro-capitalismo”, comenta.

Segundo essa ideia, homens ricos ou empresários ricos e suas empresas devem ter o poder de decidir como o dinheiro deve ser distribuído. Através de suas doações, eles devem impedir movimentos políticos que possam se tornar caóticos ou incontroláveis.

“Se você pensar bem sobre isso, vê que essa é uma variante fundamentalmente antidemocrática para combater a desigualdade de renda”, frisa Huyssen. “Especialmente vindo de alguém que, ao mesmo tempo, é contra pagar salários mais altos.”

Nos EUA, o financiamento de assuntos públicos tem tradicionalmente desempenhado um papel muito maior do que na Europa, particularmente na promoção cultural e educacional.

“Essa generosidade tornou possível a existência de algumas grandes instituições culturais que existem até hoje. A sala de concertos Carnegie Hall, a Universidade de Chicago, a Universidade de Stanford, na Califórnia”, diz Huyssen.

Todas são instituições estabelecidas e mantidas com dinheiro de industriais. “Mas, durante todo este tempo, os ricos se tornaram, mesmo assim, ainda mais ricos. Se o objetivo é reduzir a desigualdade de renda, não vamos chegar muito longe com filantropia e caridade.”

Assim, resta talvez a terceira das opções indesejadas por Paul Tudor Jones para fechar o fosso entre ricos e pobres: impostos mais altos. Mas um imposto sobre a fortuna tem apoio de muitos economistas, porém não dos lobistas em Washington.

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