Por que não superamos o trabalho escravo?

Livro da Editora Unesp analisa como a exploração forçada e trabalhos análogos à escravidão são pilares do capitalismo brasileiro. Para o autor José de Souza Martins, tal forma é parte essencial da reprodução desse sistema econômico.

Desde o fim do século XIX, o Brasil se orgulha de ter abolido a escravidão, com a promulgação da Lei Áurea, em 1888. No entanto, já não é novidade que a abolição não significou exatamente liberdade e boas condições de vida para os ex escravizados, formas disfarçadas de escravização continuam a existir, revelando a complexidade e a persistência dessa questão histórica.

Frequentemente nos deparamos com notícias denunciando trabalhadores em situações precárias e desumanas. Em setembro de 2022, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) estimou que mais de 27 milhões de pessoas no mundo ainda viviam em condições análogas à escravidão, sendo 4 milhões delas localizadas nas Américas. 

O sociólogo José de Souza Martins, em sua obra Capitalismo e Escravidão na Sociedade Pós-escravista, lançada pela Editora Unesp, examina a escravidão contemporânea não como um resquício do passado, mas como um componente estrutural do capitalismo brasileiro, cujas raízes atravessam séculos de desigualdade e exploração.

“Ao se falar em escravidão atual está se falando, necessariamente, numa anomalia resultante das contradições sociais de um modelo de sociedade que tem nome: a sociedade capitalista mutilada e insuficientemente realizada, como a brasileira, atravessada pelo primado de interesses econômicos e consequentes irracionalidades que negam o capitalismo e crucificam a sociedade.”

– trecho retirado da introdução de Capitalismo e Escravidão na Sociedade Pós-escravista. Leia a introdução na íntegra clicando aqui

No livro estão reunidos uma série de artigos independentes, mas conectados por uma observação sociológica e interpretativa em comum.

Com base em uma rigorosa análise sociológica, Martins reflete sobre a relação entre o capitalismo subdesenvolvido e a continuidade da escravidão. Para ele, o trabalho forçado não é um anacronismo, mas sim uma peça fundamental para a reprodução do sistema capitalista.

Ao explorar as contradições dessa estrutura econômica, o autor revela como o trabalho escravo se perpetua, sendo peça chave para maximização dos lucros, especialmente em áreas onde o Estado é ausente ou ineficaz.

Ademais, na visão de Martins, a questão fundiária é essencial para compreender a realidade brasileira. “O capitalismo brasileiro levou mais de um século para se tornar um capitalismo de capital subsumido pela renda fundiária e subsidiado pelo Estado. E constitutivamente subsidiado por formas não capitalistas de relações de trabalho, como a da ‘escravidão contemporânea’”, aponta o professor.

A obra de Martins vai além das explicações superficiais sobre o tema, oferecendo uma leitura crítica, aprofundada e embasada sobre o funcionamento das relações de trabalho no Brasil e no mundo.

Sua tese, de que a escravidão moderna é uma prática necessária ao capitalismo, desafia noções simplistas e joga luz nas condições socioeconômicas que mantêm essa tragédia viva até os dias de hoje, ressaltando a necessidade de repensarmos as estruturas que sustentam a exploração do trabalho e a distribuição de riquezas.

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