“Ao momento que ele põe a mão por baixo da minha blusa e abre meu sutiã.” O relato é de uma das vítimas de um professor da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, da Universidade de São Paulo (Esalq/USP). O docente, que atuava em Piracicaba (SP), foi exonerado pela instituição após denúncias de assédio moral e sexual contra alunas.
Com a mobilização de alunas e pesquisadoras que foram assediadas, a USP instaurou em setembro de 2019 uma sindicância e um processo administrativo contra o docente. Oito mulheres, todas ex-orientandas, depuseram contra ele na condição de vítimas, além de outras cinco como testemunhas.
Uma das vítimas, que preferiu não ser identificada, relatou que foi vítima de assédio sexual pelo professor e contou a situação:
“Eu fui mostrar os resultados que eu já tava tendo do mestrado pra esse professor e foi num fim de tarde, em março de 2016. Até que num momento ele falou assim: ‘parece que você tá muito tensa, vamos relaxar’ e começou a fazer massagem nos meus ombros. Ele encavalou atrás de mim, ele passou a perna atrás de mim e como eu tava sentada num banco, ele aproximou a carteira e começou a fazer massagem, e, nesse momento, eu me senti muito acuada. Ao momento que ele põe a mão por baixo da minha blusa e abre meu sutiã. E quando ele faz isso, eu travo as mãos no corpo, a ponto de não querer que ele venha pra frente e a única frase que eu consigo falar é: ‘para, professor!'”
A mulher disse que na época ficou com medo de contar o ocorrido para outras pessoas. “Eu passei muito tempo sem conseguir dormir direito. Eu dormia, sonhava com as situações. Eu mudei totalmente o meu relacionamento com meu marido. Você perde a confiança totalmente em homens.”
Ela não foi a única vítima do professor. Outra aluna conta que chegou a pensar em desistir do mestrado por conta dos abusos, mas um outro professor a orientou a denunciar.
“Eu peguei, cheguei no presidente da pós e falei: ‘não aguento mais, quero sair’. Aí ele perguntou: ‘por que você quer sair?’ Aí eu contei o porquê. Aí ele falou: ‘ó, então vamos resolver essa situação? Eu vou te transferir de orientação, você continua na pós, segue sua vida aqui na Esalq, e esse outro caso a gente resolve. A gente denuncia'”, contou.
“Esse presidente da pós que me incentivou a reunir as outras meninas pra gente abrir uma denúncia coletiva”, completou.
Assédio moral
Um aluno, que também não terá o nome revelado, não era orientando do professor, mas chegou a presenciar várias situações de assédio na universidade.
“É, era uma sucessão de horrores diários […] Acho que ele tinha o sentimento de impunidade, porque ele passava a mão no rosto, ele dava beijinho, ele via as meninas desconfortáveis e, mesmo assim, ele insistia, ele fazia piadinhas, ele passava a mão na coxa…”
Além disso, práticas de assédio moral também eram cometidas pelo professor. Segundo o aluno, o acusado parecia não se importar em fazer isso na frente de todos. “Eu, por exemplo, ele nunca me chamou na minha frente, mas todo mundo relatou que ele me chamava de ‘gayzinho’. Uma colega minha ele chamava de ‘a gorda’. Tinha uma outra menina que ele chamava de ‘songa-monga.'”
Ainda conforme a testemunha, o professor usava esses “apelidos” na frente de outras pessoas e até em reuniões.
Demissão
Em março de 2020, ainda com a sindicância em andamento, Claudio Lima de Aguiar foi forçado a pedir afastamento depois de um abaixo-assinado da comunidade acadêmica. Ele era coordenador do programa de pós-graduação e pesquisador do Departamento de Agroindústria, Alimentos e Nutrição.
Dois anos e meio após o início do processo interno, o reitor da USP assinou a exoneração de Claudio Lima de Aguiar, em 20 de dezembro. A demissão faz parte de uma decisão da congregação da Esalq por 62 votos favoráveis e três abstenções.
A USP informou em nota que o reitor acatou a decisão da comissão processante da Esalq de exonerar o professor, devido à gravidade dos fatos.
A Associação de Docentes da USP (Adusp) comemorou a demissão do docente por meio de nota e disse que esse deve ser o primeiro caso de demissão de professor por assédio sexual. Disse, ainda, que esse caso deve ser um grande marco na luta das mulheres pela fim da violência na USP.
A nota também ressalta a importância que as vítimas desses casos recebam orientação jurídica, médica e psicológica, e que a universidade tenha políticas públicas de combate à violência.
A reportagem entrou em contato com o professor Claudio Lima de Aguiar e sua defesa para um posicionamento, mas não teve retorno até a última atualização.