Promoção da equidade racial por meio da educação é urgente

Cabe ao Estado implementar leis e formas de enfrentamento ao racismo

As ações afirmativas no Brasil foram e são fundamentais para o alcance de avanços significativos no país quando o assunto é promoção de equidade racial e enfrentamento ao racismo, em especial no campo da educação.

É notório o aumento de pessoas negras e indígenas no ensino superior, assim como em cargos públicos. E, obviamente, as cotas raciais e as bancas de heteroidentificação foram e são estratégicas para isso acontecer.

Entretanto, o acesso e a permanência de pessoas não brancas em espaços de formação e poder ainda são insuficientes, sendo assim pautas urgentes a serem debatidas e resolvidas.

São vitórias importantes leis como a 10.639/03 e a 11.645/08, de obrigatoriedade do ensino da história e cultura afro-brasileira e de ensino da história e da cultura afro-indígena. Porém, quando não há efetividade, ficam aparentes as falhas da sociedade e dos gestores e das gestoras públicos, que precisam internalizar o combate ao racismo na base da mudança do sistema de educação público.

Historicamente, temos a sociedade civil, de ONGs a Oscips, em iniciativas e projetos que pautam a educação para a promoção da equidade racial. Há pouco mais de 20 anos, na Bahia, o Instituto Ceafro, idealizado no Centro de Estudos Afro-orientais da UFBA (Universidade Federal da Bahia), nos colocava a reflexão de que ancestralidade, identidade e resistência são princípios básicos da existência negra na diáspora.

E como pensar em transformação sem mergulhar na memória, sem pensar no passado da população negra e indígena, forjada no processo de escravização e dizimação? Como pensar em reparação sem referenciar as culturas afro-brasileiras e afro-indígenas?

Integrantes do coletivo de alunos negros da Faculdade de Medicina da USP; da esq. para a dir., Mariana Novaes,Thamires Alves, Rafael Marques e Larissa Alexandre – Karime Xavier – 19/11/2019/Folhapress

Há organizações como o Geledés – Instituto da Mulher Negra, de São Paulo, que coloca em seu programa de educação a “ação para proteger, assegurar e expandir os direitos educativos de negras e negros”, e luta para que “os sistemas de ensino desenvolvam uma educação adequada a todas as pessoas”.

Sendo um dever da sociedade civil, a defesa da educação pública de qualidade bem como de mais investimentos em educação (impactados diretamente pelo teto de gastos) deveriam ser dever do Estado brasileiro e não de forma isolada, também de funcionários ou municípios: a implementação das leis, a formação de profissionais em relações étnico-raciais e a publicação de materiais didáticos voltados para o enfrentamento ao racismo.

No sentido de reduzir estas lacunas, iniciativas não governamentais buscam investir e visibilizar a pauta da promoção da eq​uidade racial nas escolas e no ensino superior.

Neste mês, por exemplo, o Fundo Baobá para a Equidade Racial lançou o edital Educação e Identidades Negras: Políticas de Equidade Racial, com apoio da “Imaginable Futures” e da Fundação Lemann, organização de investimento social privado, para incentivar organizações, grupos e coletivos negros que atuam no combate ao racismo e na promoção da equidade racial em Educação.

O edital, com inscrições até 6 de setembro, aportará R$ 2,5 milhões em dez organizações, grupos e coletivos negros que ampliam e fortalecem intervenções em espaços educacionais formais e não formais.

Já o projeto Opará Saberes, idealizado pela intelectual Carla Akotirene, lançou sua terceira edição com objetivo de visibilizar a entrada de estudantes negros e negras em cursos de pós-graduação (mestrado e doutorado) em universidades públicas.

Neste ano, conta com apoio do Projeto Seta (Sistema de Educação por uma Transformação Antirracista), iniciativa que tem como objetivo construir um sistema de educação público antirracista no Brasil, com financiamento da Fundação Kellog e que tem como executoras sete organizações: ActionAid Brasil, Ação Educativa, Campanha Nacional pelo Direito à Educação, Geledés – Instituto da Mulher Negra, Conaq, Uneafro Brasil e Makira Eta (Rede de Mulheres Indígenas do Amazonas).

Ainda precisamos, enquanto população, mas, sobretudo, os tomadores de decisão, superar os desafios do reconhecimento das desigualdades, para que a pauta do enfrentamento ao racismo, da valorização das culturas negras e indígenas sejam contempladas em sua totalidade.

Igualdade é diferente de equidade. E a luta da sociedade civil é para que os espaços de educação também contemplem a lógica de que o desejo é de igualdade em direitos, mas com garantia de oportunidades para as pessoas que mais precisam, em maior contexto de vulnerabilidade, de acordo com suas diferenças e especificidades.


​Midiã Noelle

Jornalista, mestra em cultura e sociedade, idealizadora da COMMBNE (comunicação baseada em inovação, raça e etnia)

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