Quenianos poderão processar Reino Unido por torturas coloniais

Por Estelle Shirbon

 

LONDRES, 5 Out (Reuters) – Três idosos quenianos que foram vítimas de torturas coloniais pelas forças britânicas receberam autorização judicial para processar o governo do Reino Unido, o que pode estimular pessoas de outros países do antigo Império Britânico a fazerem o mesmo.

O governo britânico, que durante três anos tentou impedir o processo, disse nesta sexta-feira que está frustrado e vai recorrer da decisão.

Paulo Nzili, de 85 anos, Wambugu Wa Nyingi, de 84, e Jane Muthoni Mara, cerca de 73, sofreram castração, violação sexual e agressões na década de 1950, período em que estiveram presos como parte da repressão das forças britânicas e de seus aliados quenianos contra o Movimento Mau Mau, que lutava por terra e liberdade.

O trio quer que a Grã-Bretanha faça um pedido de desculpas e financie benefícios sociais para vítimas quenianas de torturas da época colonial. O grupo não estava no tribunal para ouvir a decisão, mas deve se pronunciar numa entrevista coletiva em Nairóbi.

Defensores deles se abraçaram e choraram de alegria ao escutarem a decisão do juiz Richard McCombe no prédio neogótico da Real Corte de Justiça, em Londres.

“Um julgamento justo dessa parte do caso continua possível”, já que o governo e os militares mantiveram registros minuciosos sobre os casos, disse o juiz em seu veredicto.

O governo britânico inicialmente alegou que a responsabilidade por abusos contra os ativistas mau maus havia sido transferida para o Quênia quando da independência desse país africano, em 1963. McCombe rejeitou essa tese em 2011, e então o governo britânico passou a adotar como linha de defesa a prescrição dos crimes.

Martyn Day, advogado dos acusadores, disse que o governo deveria deixar de usar brechas jurídicas e negociar um acordo rapidamente, já que os autores da ação estão velhos e frágeis.

“Indubitavelmente haverá vítimas de tortura colonial da Malásia ao Iêmen, de Chipre à Palestina, que lerão esse julgamento com grande cuidado”, disse.

A chancelaria britânica disse que não nega a ocorrência de maus tratos contra os quenianos, mas que vai recorrer da decisão por causa das suas “abrangentes consequências jurídicas”.

Nzili passou seis meses no Mau Mau, em 1957, e foi castrado num campo de prisioneiros após ser preso quando ia para casa. Nyingi nunca participou da guerrilha, mas foi detido em 1952 e passou nove anos preso sem acusação formal.

Ele sofreu agressões severas, inclusive num caso em que 11 detentos foram espancados até a morte, e passou três dias tido como morto, numa pilha de cadáveres. Mara, então uma menina de 15 anos, sofreu abusos sexuais, inclusive um estupro com uma garrafa de refrigerante cheia de água fervente.

Esses fatos ocorreram durante a chamada “Emergência Queniana” (1952-61), período em que combatentes do Movimento Mau Mau atacavam alvos britânicos, causando pânico entre os colonos brancos e alarmando o governo em Londres.

Dezenas de milhares de rebeldes foram mortos pelas forças coloniais, e estimados 150 mil quenianos, muitos deles sem ligação com a rebelião, foram presos em locais que um importante historiador do período comparou aos “gulags” (campos soviéticos de trabalhos forçados).

 

 

Fonte: Reuters 

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