As Nações Unidas declararam que, entre 2015 e 2024, a comunidade internacional deveria estar convocada a promover ações de reconhecimento, justiça e desenvolvimento para os povos de ascendência africana. Conhecida como Década Internacional de Afrodescendentes, essa convocação busca promover direitos e ampliar liberdades para os afrodescendentes, que só nas Américas somam mais de 200 milhões de pessoas.
O Brasil é o país com o maior número de pessoas autodeclaradas negras (pretas e pardas) fora do continente africano. Pessoas negras representam 56,2% da população brasileira, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad 2019) —não obstante, é também o grupo onde se observa, com mais evidência, as desigualdades de toda ordem e a violação constante de direitos.
Para fazer frente a essa situação de desrespeito e desequilíbrio gritante é preciso conhecimento sobre quantos são, onde estão e em que condições vivem —cada grupo que forma uma determinada comunidade. O melhor instrumento para fazer essa fotografia em alta definição é o Censo, a espinha dorsal do sistema estatístico brasileiro.
O Brasil é uma referência para o mundo nesse tipo de coleta, ordenação e análise de dados populacionais, e as pesquisas com intuito de conhecer e reconhecer a nação brasileira a partir do quesito étnico-racial são antigas. Antes da abolição da escravatura, o Brasil já observava e contabilizava as pessoas entre livres e escravizadas e segundo raça/cor. Nos períodos subsequentes, o país seguiu produzindo esse tipo de investigação e, a partir da década de 1990, o quesito raça/cor foi aprimorado, incluindo também a população indígena, e a autodeclaração se estabeleceu.
Os dados permitiram que a sociedade civil brasileira —especialmente o movimento social negro, a academia e os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário— apresentassem uma série de políticas públicas, programas e ações de enfrentamento ao racismo e promoção da equidade étnico-racial, evidenciadas a partir dos anos 2000.
Essas políticas são muito conectadas aos princípios dos direitos humanos e aos compromissos firmados na 3ª Conferência Mundial de Combate ao Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia e Intolerância Correlata, realizada em 2001 em Durban, na África do Sul, da qual o Brasil é signatário e teve um papel muito relevante.
Agora, o Censo 2022, que acontece em um contexto de pandemia e pode apresentar uma nova leitura em termos demográficos sobre brasileiras e brasileiros, incluirá, pela primeira vez, a população quilombola.
Essa inclusão, que abre a possibilidade de o país dar um salto rumo à equidade, é resultado de um longo processo conduzido pelo IBGE em diálogo com as representações de quilombolas e com o apoio do Fundo de População da ONU.
Com o resultado dessa ação, o Brasil terá a oportunidade de reparar séculos de apagamento desses povos, sistematizar da melhor e mais moderna forma possível as informações que poderão subsidiar a sociedade civil organizada e o desenho e a execução de políticas públicas de acordo com as necessidades e potencialidades dos quilombolas, respondendo e se direcionando, com uma ação propositiva, rumo à Década Internacional de Afrodescendentes.