Representação política no legislativo nacional brasileiro e eleições. Alguns marcos históricos para a pluralidade nacional ser vista e sentina no congresso

1.INTRODUÇÃO.

A representação no Brasil como Estado independente e soberano nasce com a constituição outorgada pelo imperador Dom Pedro I, filho do antigo rei colonizador que promoveu nosso país a Reino Unido alguns anos antes. Alguns anos prévios também começaram as discussões sobre a representação moderna e passaram a ter um significado um pouco diferente, especialmente entre uma parte da europa e américa. Há de se destacar as datas nesses processos, não por serem um “portal mágico” onde tudo muda de uma hora para outra, mas como marcos simbólicos e reais mesmo que parciais de uma época e lugar. Deste modo, alguns lugares e fatos foram primordiais para a formação do Brasil no que tange a formação do Estado, representação política e eleições. Devemos citar obviamente, Portugal, Reino Unido, França, Estados Unidos da América, o Haiti e o medo que suscitou no mundo escravista americano, as antigas colônias espanholas, algo como os atuais México, a antiga Grã-Colômbia e o antigo Vice-reino da Prata, além claro, das revoltas independentistas, autonomistas e emancipacionistas do território brasileiro em especial, a única que logrou êxito,  por um breve momento, é claro, pouco mais de 3 meses, durante período colonial de Reino Unido com Portugal que foi a chamada Revolução Pernambucana envolvendo alguns estados do atual nordeste brasileiro.

Assim começa então a primeira carta magna brasileira outorgada pelo primeiro imperador do Brasil em  Março de 1824,  que por isso mesmo foi alvo de várias críticas por não atender os requisitos básicos de ser um instrumento e construção da soberania popular mas do imperador. Um ano antes ele havia dissolvido a assembleia constituinte. Alguns movimentos ocorreram por isso, encabeçados pelo “ex-estagiário” da Revolução Pernambucana de 1817, Frei Caneca do Amor Divino Rabelo, ou para os mais íntimos, Frei Caneca, que agora já era titular de carreira na chamada Confederação do Equador de Julho de 1824, entre outros. Entretanto no final as dissidências foram apaziguadas e a carta outorgada seguiu vigente, claro que com alterações, até o advento da república brasileira no final do século XIX.

Voltemos então ao processo emancipatório de 1817, mais precisamente aos grupos que o formavam ou seus representantes, falo da cúpula pensante e escrevente dos manifestos e lei orgânica da revolução, que não era exatamente uma lei orgânica, mas também não tinha o nome de constituição, era um assunto talvez a se assentar. Esta cúpula era formada em sua maioria por homens e brancos, dentre eles senhores de engenho, clérigos católicos, comerciantes, advogados e militares, entretanto havia entre eles a presença de homens negros e militares. Este movimento teve muitos apoiadores entre a população local muitos deles negros, fossem libertos, livres ou escravizados empolgados com a possibilidade de liberdade e igualdade, mas que na prática foi tornando-se distante. A escravidão com seu fim era algo distante apesar das promessas e ventos liberais que aqui chegavam e tomavam firmeza no chão. Não somente eles apoiaram este movimento, os brancos pobres e demais animaram-se com a possiblidade de justiça entre as pessoas e uma certa cidadania que se propunha com fim de privilégios e tratamentos degradantes de punições e julgamentos, além de uma mudança no sistema de tributos. Outros aspectos alvoroçaram e ecoaram pela sociedade, a volta da liberdade religiosa e consciência já experimentada por curto período naquela região e a liberdade de imprensa e fim de censura de textos e livros, sem falar na liberdade de empreender, há mais de século. Todos esses aspectos estavam no consciente e inconsciente daqueles que fizeram a carta magna outorgada de 1824 seja para levar adiante esses ensinamentos ou para apaga-los e refutá-los.

Vale ressaltar que o Brasil torna-se um país de fato e livre do julgo militar e colonial português em 1825 na última batalha neste território que ocorreu na Bahia. Disto isto, vamos ao congresso nacional vigente, as suas forças no senado e câmara dos deputados do império brasileiro. Ficou então definido que os homens livres que tivessem uma renda mínima poderiam votar. Os libertos não poderiam, todavia era permitido a seus filhos e netos votarem tendo o requisito da renda preenchido. Já no final do império algumas modificações tinham sido realizadas e uma das derradeiras foi a da exclusão do voto dos analfabetos. Com isso muitos afirmam que o eleitorado brasileiro caiu drasticamente. O legislativo ao longo dos anos do império teve alguns partidos são eles:  Partido Restaurador, Partido Regressista, Partido Moderado, Partido Liberal Exaltado, Partido Liberal Progressista, Partido Conservador, Partido Liberal e Partido Republicano Paulista. As regras eleitorais então foram sendo definidas, houve alguma polêmica sobre magistrados poderem candidatarem-se e exercerem cargos políticos ou não. O número de províncias, a então subdivisão do país, era menor do que o atual. Muitos nobres ocupavam os cargos legislativos, os donos de engenho,  fazendeiros e comerciantes de escravizados tinham seu espaço cativo, os profissionais liberais entre eles advogados, jornalistas e médicos por exemplo, integrantes do clero, e militares, todos homens. Muitas mulheres e homens não-brancos participaram nas articulações políticas, defesas identitárias, de classe e demais políticas, apesar de seu menor destaque.

Com o advento da primeira república a conjuntura muda um pouco em 1889, agora alguém que não é da família real pode chegar ao poder através do voto no cargo do executivo nacional como presidente e surge a figura do vice-presidente. Mas algumas coisas não mudaram muito. O Brasil agora é Estados Unidos do Brasil e suas províncias viraram Estados, naquela época 20, e com a república veio o federalismo junto. Agora era possível ter partidos regionais e assim surgiram os Partido Republicano Paulista, Partido Republicano Mineiro, Partido Republicano Rio-grandense, Partido Republicano Fluminense, etc; Partido Republicano Federal e Partido Republicano Conservador foram tentativa de criar partidos nacionais, contudo  foram breves; Partido Libertador, Partido Democrático, Partido Comunista do Brasil e Bloco Operário e Camponês, talvez o que conseguiram ter uma expressão nacional mas não tiveram muitos eleitos. A constituição agora, promulgada, foi acabada em 1891 pelo poder legislativo pátrio.

Alguns grupos que participaram da representação politica do império continuaram, mas outros novos vieram. A república começa com os militares no poder e depois passa aos civis. Os militares participam muito da representação nacional, os agora ex-nobres, os bacharéis de direito, demais profissões liberais, pessoas do campo e proletários em menor proporção, entre outros. Os negros agora são todos livres no papel, e a escravidão já não existe formalmente ao menos nos centros urbanos, as mulheres ainda ocupam quase o mesmo espaço político de antes, mas já tem horizontes mais expandidos para elas pelo mundo, entretanto ainda não podem votar.

Nesse período um negro conseguiu ser eleito vice-presidente  entre 1906 e 1909 e depois presidente por um mandato tampão de 1909 até 1910 com o lema pré-hippie de “Paz e amor”, foi ele Nilo Peçanha. Antes mesmo dos Estados Unidos com seu Barack Hussein Obama em 2008 e depois por outro mandato. Nessa época também de dificuldades e adaptações do povo negro numa sociedade escravagista de negros, ainda tínhamos as dificuldades do racismo científico em andamento e ascensão, que caíam como uma luva no Brasil, para aqueles que não queriam largar o poder. Apesar de tudo, Monteiro Lopes conseguiu depois de incessantes tentativas e atitudes de falsa burocracias desarrazoadas para que fosse diplomado e por fim após  uma campanha nacional formidável ele é empossado deputado federal em 1909. Ele é o primeiro negro a ocupar um lugar na Câmara dos Deputados. E por alguma estranha razão é o nome de um doce conhecido como bem-casado também. Pernambucano de família e criação, mas adotou o Rio de Janeiro como novo endereço e lá teve seu enterro. Monteiro Lopes foi antes Intendente Municipal eleito em 1903 na cidade do Rio de Janeiro. Já no final do período da república velha os partidos comunistas e operários tinham tomado corpo maior e estavam espraiados pelo país, um deles o BOC conseguiu fazer um candidato a presidência, era ele Minervino de Oliveira, um homem negro e operário sindicalista, o primeiro nestas duas características suas. Além dele BOC conseguiu eleger um deputado federal Azevedo Lima, contudo os anos desse partido foram curtos e não duraram até a etapa seguinte da política brasileira do movimento de 1930.

O movimento de 1930 foi uma resposta ao revezamento de poder entre São Paulo e Minas Gerais nas diretrizes nacionais, dada por outros estados brasileiros, esse momento deu lugar a ascensão ao poder de Getúlio Vargas que vai ter uma era própria até 1945 com algumas nuances e a segunda guerra mundial neste período. Foi um governo de conformação social, mas autoritário e violento. A sua constituição de 1934 veio substituir a de 1891. Trouxe alguns avanços como permissão da capoeira antes proibidas e uma autonomia maior aos terreiros. O federalismo ocorreu, entretanto, veio a ser diferente do outro anterior e mais centralizador. Em 1932 foi criado o Código eleitoral, nesse período nasceram a Justiça do Trabalho e Eleitoral. O voto secreto e finalmente o voto e participação feminina nas candidaturas e votações partidárias.

Nesse meio período de tempo houve uma ditadura de Vargas e a feitura da segunda constituição outorgada, a de 1937 chamada de Polaca. Os partidos foram agora extintos e durará até 1945 quando saí Getúlio Vargas do poder e entra em 1945 uma nova assembleia. constituinte que põe em vigor a nova constituição em 1946. Mas antes disso, vale ressaltar alguns aspectos e conquistas destes períodos como a eleição da primeira mulher negra a ser eleita deputada no Brasil, como deputada estadual de Santa Catarina e até agora a única por lá, ela era professora e jornalista, filha de uma escravizada liberta. Exerceu seu mandato pelo Partido Liberal Catarinense de 1934 a 1937, foi também a primeira mulher e negra a dirigir uma Assembleia Legislativa no Brasil. Seu segundo mandato e disputa eleitoral ocorreu em 1945 pelo PSD( partido social democrático) primeiro suplência e depois em 1945 e o mandato então em 1947 até 1951. Só para se ter ideia o primeiro negro a ser eleito em Santa Catarina foi Sandro silva em 2012 pelo PPS, algumas décadas depois, segundo o site pioneirismo negro. A primeira constituinte mulher e deputada federal eleita foi Carlota Pereira de Queiróz em 1934 da mesma forma que a anterior. 

Já na década de 1940 os partidos eram então a UDN(União Democrática Nacional), PTB(Partido Trabalhista Brasileiro), PSD, PRP(Partido de Representação Popular) com os ex-integralistas, PDC(Partido Democrata Cristão), PSB(Partido Socialista Brasileiro) e PCB que sempre oscilou entre a legalidade em períodos democráticos e a ilegalidade, sendo um termômetro para isto muitas vezes. A volta democrática com o fim da segunda guerra mundial, tivemos uma assembleia constituinte e volta dos partidos políticos, assim dava-se inauguração a um novo período brasileiro. As eleições diretas para executivo voltaram. Foi a primeira constituição com participação do partido comunista, que foi perseguido algum tempo depois de sua promulgação. Fortalecia os direitos sociais e individuais, além do legislativo. Nesta época as forças políticas já estavam mais heterogêneas seja de grupos, classes sociais, profissões ou origens, claro que comparado aos períodos anteriores. Esse novo regime democrático durou de 1945 até 1964 com a chegada do golpe militar de 1964.

Essa nova época permitiu o acesso à presidência e outros cargos de forma vista já como natural dos imigrantes brasileiros e seus descendentes. A assembleia constituinte contou com um descendente de malês e imigrante italiano pertencente ao partido comunista brasileiro, Carlos Marighela, eleito deputado federal e constituinte por exemplo. Os negros e mulheres ainda que não em todos os lugares e em todos os cargos de forma constante, já começavam a aparecer, especialmente nos municípios onde o custo de capital político e recursos era menor e nos estados, a nível federal era mais difícil, entretanto acontecia desses grupos aparecerem por lá.

Com o advento do golpe militar em 1964 e com a cassação dos mandatos do legislativo a representação e a democracia ficaram prejudicadas. O poder militar criou uma constituição totalmente viciada em 1967. Quando o legislativo pode voltar a funcionar voltou na forma do bipartidarismo com a ARENA(Aliança renovadora Nacional), abrigando entre outros os antigos membros da UDN e a ala mais conservadora do PSD e o MDB( Movimento Democrático Brasileiro) onde abrigavam-se a oposição e aqueles pertencentes a partidos considerados clandestinos. E assim foi até a volta da legalidade dos partidos e volta do pluripartidarismo com a criação do que vão ser os mais antigos partidos em atividade na atualidade desde a década de 1980. É nesse período da ditadura que temos a eleição da primeira senadora, Euníce Michiles em 1979 pelo PDS. E também da suplente do senado que toma posse da cadeira em 1981 e torna-se a primeira mulher negra a ocupar vaga no senado, ela é Laélia Alcântara pelo MDB.

Em 1969 foi eleito o primeiro vereador indígena depois de 469 anos de invasão portuguesa, em Oiapoque, Amapá. Em 1976 Angelo Kretã consegue ser eleito vereador em Manguinhos no Paraná depois de muitos entraves desarrazoados e falsas burocracias como na época de Monteiro Lopes, contudo depois de empossado em 1980 ele é assassinado. E finalmente em 1982 Mário Juruna é eleito deputado federal pelo PDT, o primeiro indígena a chegar no congresso, exercendo seu mandato até 1986 vindo a falecer em 2002.Ele não conseguiu se reeleger mas continuou sua atividade política. A volta das eleições pluripartidárias dá-se ainda dentro do regime ditatorial em 1982.

Com a lei orgânica dos partidos de dezembro de 1979 o pluripartidarismo volta e com ele novos partidos ou antigos renovados, como o PDS que teve integrantes do antigo ARENA; os PMDB, Partido Popular(PP), Partido da Frente Liberal(PFL), além do antigo PTB que rachou e dividiu-se entre esta legenda antiga e o PDT, esses surgiram do MDB. Claro que da oposição legalizada tiveram outros partícipes de partidos que viriam a surgir mais tarde. O Partido dos Trabalhadores (PT) surge então de alguns movimentos de base religiosos, de trabalhadores do campo e da cidade em 1980. Com emenda constitucional em 1985 foram reestabelecidos os partidos extintos e abriu-se espaço para a criação de novos.

De 1986 até os dias  atuais as coisas mudam um pouco, os sinais da mudança já vem na assembleia constituinte que foi a mais plural e democrática das anteriores, ao menos em termos de participação e variedade de grupos. No meio disso, temos ai a constituição de 1988 que leva um novo marco legal para o Brasil, a chamada constituição cidadã. Nela houveram muitos debates públicos de vários grupos sociais, contou com  presença feminina, negra, indígena entre outros grupos. 

Entre os grupos de pioneiros está Benedita da Silva fundadora do PT, ex-vereadora do Rio de Janeiro e agora constituinte como primeira deputada federal negra em 1986 e reeleita na legislatura seguinte. Benedita da Silva ainda seguiu adiante na política e fez outro marco histórico, tornou-se a segunda senadora negra eleita no Brasil em 1994, a primeira no novo regime. Seguindo o pioneirismo não podemos deixar de falar de Abdias do Nascimento, um grande pensador, intelectual negro e ativista. Foi eleito o primeiro senador negro do Brasil em 1990 como suplente de Darcy Ribeiro que teve de se afastar do cargo e assim foi efetivado como senador em 1991 pelo PDT. Conseguiu exercer outros cargos no congresso, mais um tempo senador e deputado federal antes e depois do senado.

Falando dos povos indígenas, conseguimos ter nosso primeiro prefeito eleito em Oiapoque no Amapá em 1996, João das Neves do povo  Galibi-Marwono. O primeiro prefeito indígena do nordeste do Brasil só apareceu em 2020 na cidade de Pesqueira pelo partido republicanos, Marcos Xucuru. Vale ressaltar que somente em 2014 o TSE(Tribunal Superior Eleitoral) veio adotar o registro de etnia/cor nos candidatos. Em 2018 tivemos a primeira candidata a vice-presidente numa disputa eleitoral, fato realizado por Sônia Guajajara do PSOL(Partido Socialismo e Liberdade) que não ganhou, e tivemos também Jôenia Wapichana da REDE SUSTENTABILIDADE eleita para deputada federal, sendo a primeira indígena a fazê-lo.

Não podemos esquecer de outros pioneiros da população brasileira como Clodovil, deputado federal em 2006  pelo PTC(Partido Trabalhista Cristão), mas que em 2007 trocou de partido para o Republicanos. De Jean Wyllys, ex-psol, e eleito por essa legenda três vezes para deputado federal, desde 2010 , mas que na terceira deixou o mandato e a vaga foi preenchida por David Miranda do mesmo partido, homem gay e negro. Da mandata de Érica Malunguinho pelo PSOL na Assembleia Legislativa de São Paulo, uma mulher trans negra pernambucana eleita em 2018. E claro do primeiro senador assumidamente gay, Fabiano Contarato pela REDE, o mais votado do Espírito Santo em 2018.

Esses são alguns exemplos de pioneirismo na representação popular nos mandatos eletivos que mostram as dificuldades de uma pluralidade de grupos de ocupar esses espaços dominados por mais ou menos as mesmas populações que não refletem as ruas e corpos do povo brasileiro, mas, de uma parte que sempre se repete muitas vezes e já tem lugar cativo e solitário por pelo menos pelos quase 100 anos de inauguração do Congresso Nacional por exemplo. Em 1824 foi criado e em 1909 foi ter algum corpo diverso, com pensamento mais plural daquilo que foi há 86 anos.

2. DESENVOLVIMENTO

 Para Urbinati a representação é agir pelo representados de uma maneira responsiva a eles, geralmente seus eleitores quando falamos de Brasil. A democracia representativa seria menos propensa a guerra do que a democracia direta, segundo a autora. De fato, se fazemos algo pelas próprias mãos com os ânimos exaltados, já estamos a um passo de tomar as vias de fato, enquanto que nos apropriando de algo a distância ou indiretamente conseguimos apaziguar as coisas, de ter tempo para refletir, ou até pela distância, impossibilitados de fazer algo mais rapidamente ou impulsivamente. Quando tomamos conta de algo alheio supostamente temos mais cuidado ou deveríamos ter, e assim para ela, a democracia representativa e representação se fazem mais fortes e adequadas aos nossos dias, além do poupar de tempo para fazer outras atividades quotidianas dos representados. Segundo Habermas a esfera pública é o lugar ideal para a deliberação, então o mais adequado para esses momentos seriam uma variedade de setores para que a representação potencialmente tenha mais qualidade e aproxime-se da realidade do todo ou ao menos ponha em discussão debates relevante seja na forma de ideias vencidas ou aprovadas, assim como propostas rejeitadas para a sociedade. O procedimento formal não é suficiente, claro por não dar conta da vida e das contínuas e variadas mutações da sociedade, algumas forças ficam na penumbra da ascensão de outras. Esses grupos vão sempre buscar articular-se e a depender de como, podem sair das vias democráticas para retornar ao poder por exemplo.

No século XVIII já era admitido que as assembleias deveriam refletir a diversidade da sociedade, Burke e Abade Siéyes eram um desses partidários. Na representação o consenso vai ser sempre fruto de uma maioria para o Abade e para Locke, não necessariamente fruto da verdade. Nos primórdios da representação moderna, os representantes eram pessoas que inspiravam deferência, importantes, conhecidas e estava ligado aos eleitores por interesses ou geograficamente, a personalidade, com toda certeza influía em sua escolha por eleições, segundo Bernard Manin. Numa segunda fase, os eleitores e número de votantes aumentaram e com isso foi diminuída a possibilidade de relação entre representante e representado, já no século XIX. Aqui a partir de fim do século XIX seguramente, o eleitor já vota em quem carrega suas bandeiras, neste momento apesar de a representação continuar elitista ela já começa a apresentar diversidade. A representação aqui já ganham outras figuras como líderes partidários. Os representantes independente de quem sejam, se forem do partido de escolha serão os corretos, a representação aqui já chega com uma lista de deveres e regras a se cumprir pelo partido por estarem no poder, pois esta foi a condição para estarem lá. O terceiro ponto da representação seria a representação do público. Nessa fase a representação está ligada mais a aspectos midiáticos e mais ligado a personalidade do candidato do que sua filiação partidária ou ideia propostas. Os debates e falas dão-se sempre sob muitos holofotes de preferência e até assuntos fora de interesse público real. O representante deste modo não está tão amarrado aos programas propostos e partidários e tem uma margem maior de manobras de atuação de acordo com o caso concreto que aparecer sobre, no seu mandato e atuação como representante.

Nesta terceira  fase o momento da escolha é crucial para a escolha de seus representantes. Os políticos tendem a ser mais ou menos parecidos. Imagem é tudo neste cenário. Pontos eventuais que suscitarão debates mais acalorados, as pesquisas de qualquer coisa sobre políticos e cenários políticos influem e são inarredáveis da representação agora são outros aspectos visíveis. O eleitorado é flutuante apesar de bem mais informado do que nos séculos anteriores. Claro que isso são tipologias base que na realidade são mescladas de formas diferentes de acordo com  o espaço e tempo indo mais de uma fase ou outra, ou menos daquela acolá.

Um corpo no mundo dentro de uma sociedade já pode ser um indício de ao menos similaridade de experiências entre o representante e o representado, mas é claro que nem gêmeos idênticos passam pelas mesmas coisas, assim como partidos e pessoas de determinadas facções dentro do mesmo partido. É daí que pode estar o entrave, a distância em perspectivas e detalhes entre os políticos e a população no geral. Tudo bem que nem nos municípios isto é possível, mas, por uma outra série de motivos mas a níveis mais gerais como estados e nacional seria salutar fazer esta análise. E essa é a proximidade que muitas vezes dentro de uma plêiade de opções parecidas pode ser um critério de desempate e até de captação de votos pelos partidos.

A questão da crise sanitária pela pandemia de Covid19, as atitudes dos incumbentes e os influxos dos resultados das eleições nacionais e estaduais mais recentes, deixam um rastro de influência para as eleições municipais segundo Lavareda. O tempo de acesso a horário eleitoral gratuito de televisão e rádio apesar da sua queda pelo advento da popularização do acesso à internet ainda são fatores importantes para a eleição dos candidatos com a soma desse novo meio de difusão de ideias e propaganda segundo Felipe de Moraes Borba. Apesar da crescente perda de poder eleitoral dos partidos de direita, com o advento do golpe parlamentar no segundo mandato de Dilma Rouseff como presidente do Brasil, a direita teve uma tendência crescente com os governantes seguintes do Brasil até a atualidade, além do fato do fim das coligações partidárias para o legislativo segundo Silvana Krause. Já Helcimara de Souza Teles acha que os influxos político-eleitorais não tem influído nas eleições municipais e que essa ascendência da direita pode não se repetir nessas eleições de 2020, ledo engano, os votantes serão os interessados pelos riscos da pandemia, os outsiders deverão não ter tanta força nesse pleito. Para Érica Anita Baptista além da quantidade de tempo do horário eleitoral gratuito o importante é o recurso disponível para a campanha e o acesso ao candidato e as informações sobre ele, entretanto em eleições municipais o boca a boca entre outras dinâmicas tem força também. E apesar de alguns partidos serem negacionistas estes e outros apostaram em candidatos da área da saúde.

As candidaturas indígenas vem numa crescente, entretanto só temos registros delas pelo Tribunal Superior Eleitoral de 2014 para cá, segundo Adriano Codato em eleições municipais os candidatos indígenas tendem a distribuir-se em vários espectros ideológicos-partidários e nestas a escolaridade em média é mais baixa dos candidatos em sua maioria com ensino médio completo. A raça é fundamental para conhecimento de qualquer dinâmica Brasil segundo Andrea Lopes da Costa. Clóvis pensa sobre as estratégias eleitorais desenvolvidas por grupos de negros em 2002 e faz um bom apanhado bibliográfico, além disso ele busca entender como o fenômeno racial manifesta-se materialmente nas eleições, pois estes são de partidos políticos e fazem parte de grupos de pressão.

A exemplo o que explica um estado com percentual de população negra pequena ter tantos negros pioneiros em determinadas posições como no Rio Grande do Sul e Porto Alegre e a Bahia e Salvador, com percentual de negros maior não conseguirem eleger um governador ou prefeito negro e até candidatos? Olívia Santana foi eleita a primeira negra deputada estadual na Bahia em 2018 e foi candidata a prefeitura de Salvador mas perdeu em 2020. Esses são alguns fatores que chamam a atenção das pessoas que seria interessante elucidar as razões.

3.CONCLUSÃO

A questão da representação no Brasil definitivamente não é para amadores. Recebe várias influências a política nacional, é claro pelos fatos históricos aqui ocorridos e isto obviamente descamba na atividade básica da humanidade e de modo mais restrito numa nação como a nossa. É indelével e salutar explicar como algumas maiorias não se veem nos ambientes de representação e algumas minorias reais conseguem quebrar algumas barreiras e ocupar espaços de forma necessária. A representação deveria na sua forma mais perfeita ser um reflexo exato de sua população ou qualitativa pelos grupos plurais que a compõem, entretanto ela continua sendo um reflexo de poder e demais estrutura que outras ciências sociais tentam explicar. O importante é que apesar de entraves e dificuldades a representação no Brasil está conseguindo ter corpos e rostos novos nestes quase dois séculos de grito da independência.

Antes de mais nada,  vale citar e remarcar algumas datas e momentos nacionais para que fique visível algumas barreiras que existiram por um tempo e que depois de dissolvidas realmente mostraram a conquista de grupos diversos. Irei resumir em somente aqueles a nível nacional:

.1824 é estabelecido o primeiro congresso.

.1894 é a primeira eleição direta para os homens negros e demais homens. 70 anos depois da primeira.

.Em 1910 é eleito o primeiro deputado federal negro. 86 anos depois dos primeiros deputados federais e demais congressistas.

.1934 é a primeira eleição aberta para candidaturas e votação para as mulheres. 110 anos depois da primeira eleição brasileira.

.1934 é eleita também a primeira mulher deputada federal no Brasil, uma mulher branca e primeira constituinte.

.1945 é eleito o primeiro constituinte negro pelo PCB, Carlos Marighela.

.Em 1979 Eunice Michiles foi eleita a primeira senadora do Brasil pelo PDS. 155 anos depois do primeiro mandato de senadores no Brasil e 35 anos de que as mulheres pudessem votar e serem votadas.

.Em 1981 Laélia Alcântara pelo MDB antiga suplente assume a cadeira em 1981 e torna-se a primeira senadora negra do país. Dois anos depois da anterior.

.1982 Mário Juruna entra para a história como o primeiro indígena a ocupar o cargo de deputado federal no Brasil pelo PDT. 158 anos depois da primeira eleição para o congresso nacional.

.1986 temos a eleição da primeira deputada federal negra eleita de nosso país e constituinte de 1988, Benedita da Silva pelo PT. 162 anos após a eleição de 1824 e 54 de que as mulheres poderem votar e ser votadas. Tornou-se a segunda senadora eleita e a primeira do novo regime do Brasil em 1994.

.1988 temos a constituição mais plural em elaboração e promulgada do nosso país, 164 anos depois da primeira outorgada.

.1991 ocorre a ocupação da vaga de senador, antigo suplente, no congresso nacional por Abdias do Nascimento, o primeiro senador negro, eleito pelo PDT. 167 anos da primeira eleição e 103 da abolição formal da escravidão no Brasil.

.2006 Clodovil foi eleito pelo PTC e o primeiro assumidamente gay no congresso nacional. Em 182 anos de congresso nacional.

.2018 foi o ano de eleição de Fabiano Contarato pela REDE SUSTENTABILIDADE o primeiro senador assumidamente gay do país. E da primeira deputada estadual trans e negra do Brasil pelo estado de São Paulo, a pernambucana Érica Malunguinho do PSOL. Em 194 anos de legislativo na nação brasileira.

. Em 2018 também foi eleita a primeira deputada federal indígena Joênia Wapichana pela REDE. 194 anos das primeira eleições legislativas e 84 anos do voto e candidatura feminina.

É interessante perceber como diz Cloves Luiz Pereira Oliveira a razão de lugares com mais população branca conseguirem eleger negros e lugares com população majoritária negra terem dificuldade para eleger negros e facilidade para brancos por exemplo. Mas isto é reflexo da nossa história e cultura. Vale citar um trecho da obra do autor polonês Isaac Bashevis Singer.

“Os mortos não vão a lugar nenhum. Eles estão todos aqui. Todo homem é um cemitério, todas as nossas avós e avôs. Um verdadeiro cemitério, onde estão nossas avós e avôs. O pai e a mãe, a esposa, a criança. Todos estão aqui todo tempo.” Isaac Bashevis Singer.

Ou seja, como brasileiros somos fruto de nossas trajetórias coletivas e individuais, inconsciente ou conscientemente, para estar onde estamos. E o passado acompanha o presente e certamente estará no futuro. É esperado que com quase 200 anos de grito da independência consigamos ter um representação mais aberta e participativa com os representados e plural como representantes, já é possível ver o salto de lá para cá no progresso desse instituto no Brasil de modo formal, mas ainda é necessário torna-lo prático especialmente em cargos ditos mais elevados e que demandam mais gastos de campanha como estaduais e nacionais. A grande maioria do congresso nacional continua sendo de homens brancos, casados e maduros. A igualdade de candidatura e votação já existe e é uma realidade por todos os grupos, ao menos na forma da lei. Cabe agora aos eleitores, partidos e candidatos mostrarem como será o futuro.


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