Gabi é uma bloguista afro-brasileira. O seu discurso brilhante sobre as condições sociais da mulher negra no Brasil nos leva a refletir sobre os desafios da diferença e da aceitação.
Enviado por Fatou Ndiaye via Guest Post para o Portal Geledés
Quando e como você decidiu de ser uma bloguista ? Para você, é mais um passatempo ou uma maneira de transmitir suas ideias ?
A ideia surgiu em julho do ano passado, em 2015. Eu entreguei minha monografia em janeiro deste ano e ela foi pautada no papel das redes sociais na aceitação da mulher negra. Alguns meses depois surgiu em mim a vontade de criar um blog e um canal para passar de forma simples o que eu só tinha tido acesso quando entrei na universidade.
Porquê você escolheu o nome “DePretas” ? E importante reivindicar a sua identidade afro-brasileira no Brasil ? Porquê ?
Escolhi “DePretas” por considerar um nome forte e contestador também rs!
O nome já mostra a que veio: ele é no feminino, no plural e especialmente feito por e para mulheres pretas.
Claro que tenho um público bem variado, mas nós, mulheres negras, quase nunca temos algo para chamar de nosso, estamos sempre nos ajustando ao que é de outros, então, quem quiser entrar no “DePretas” já vai ter que começar abrindo mão do seu privilégio.
Qual é a situação dos afro-brasileiros ? O mundo sabe do racismo dos Estados Unidos através dos mass media, mas sabemos pouco do racismo no Brasil. Como é, na vida diária, na política, na cultura, no sistema educativo, na procura de emprego ?
O racismo no Brasil está em tudo, sendo que por muitos anos fomos enganados pelo chamado mito da democracia racial, onde se pregava que devido a nossa intensa miscigenação, o racismo aqui tinha sido eliminado.
Porém, quando olhamos para TV quase não vemos negros, mas quando olhamos as estatísticas dos mais pobres, dos que mais são assassinados pela polícia, dos que mais estão encarcerados, ali estão os negros.
Além disso, nos últimos meses, vários artistas brasileiros vêm sofrendo com ataques racistas em suas redes sociais e isso tem sido altamente veiculado nos jornais daqui.
Ouvi falar de um movimento de mulheres afro-brasileiras que militam para valorizar os cabelos e a pele negra. A mulher afro-brasileira sofre muito mais discriminações ?
As mulheres pretas no Brasil estão na base da pirâmide social. Elas morrem menos do que os homens pretos, mas morrem em vida. Muitas têm seus pais, seus maridos ou seus filhos mortos. Além disso, um dos temas que já até abordei do meu canal, é o da solidão da mulher negra. No Brasil, as mulheres negras são a última opção no quesito relacionamentos sérios.
Porém, mesmo com todas essas questões, nos últimos anos nós iniciamos o que acredito ser uma revolução que surge a partir da estética. Muitas mulheres negras, assim como eu, encontraram na transição capilar o primeiro passo para se encontrar com a sua negritude e ancestralidade.
Qual é importância da cultura afro-brasileira para você e como deve ser valorizada ?
A não ser que a pessoa negra tenha nascido em um lar politizado, a cultura afro-brasileira lhe é totalmente negada. Eu, particularmente, nem sabia o que era cultura afro-brasileira até chegar na faculdade e eu sou filha de pai e mãe negros.
Por isso a nossa luta hoje é imensa. Nós temos buscado a cada dia mais entender os referenciais que nos foram tirados quando nossos ancestrais foram trazidos para cá forçadamente.
Estamos caminhando nesse sentido, mas a caminhada ainda é longa.
Os afro-brasileiros tem uma relação com África e as culturas africanas ?
Como falei na resposta anterior, acredito que estamos a cada dia mais caminhando para uma relação mais próxima com a África e com as culturas africanas.
Hoje, existem vários grupos que compartilham escritos de autores e autoras africanas para que nós conheçamos um pouco mais desse vasto universo que nos foi tirado.