No último domingo, junto a outros dez moradores, fomos à Macega, uma das regiões mais precárias da comunidade da Rocinha. A Macega, ou “T.L” – Terra da Lama, como é conhecida por alguns moradores, fica localizada na encosta do morro Dois Irmãos. O grupo foi realizar uma ação social, levando agasalhos, cobertores e um café da manhã para tomar junto aos moradores desta localidade.
Por Davison Coutinho, do Jornal do Brasil
O acesso à Macega é por meio de becos e escadarias, sem infraestrutura, íngremes e poluído por vazamentos de esgotos e lixos. É uma longa subida que pode ser feita a partir da Rua Um. Depois da caminhada com as caixas de agasalhos recolhidos na PUC-Rio e na própria comunidade, nos deparamos primeiramente com o cenário da Macega: casas de madeira em situação de risco e, onde várias famílias vivem em extrema pobreza.
É impressionante como uma cidade que tem o título de “maravilhosa” permita que pessoas continuem vivendo em situação de extrema pobreza, e tudo isso a poucos quilômetros de dois dos bairros mais nobres da cidade: São Conrado e Gávea. Da Macega os moradores têm uma vista panorâmica da praia, dos prédios e dos hotéis de São Conrado. Uma desigualdade que não tem como esconder, mas que já está naturalizada.
Cada história que ouvíamos era uma emoção diferente. Cada família com suas dificuldades, e nós mesmo como moradores da Rocinha sentíamos o tamanho da desigualdade na própria comunidade. São muitas famílias sem nenhum acesso aos serviços públicos e totalmente abandonadas pelo Governo Federal, Estadual e Municipal. E tudo isso acontecendo bem pertinho dos cartões postais da cidade e dos lugares que irão receber os turistas para os jogos olímpicos. Uma cidade não pode se dizer olímpica se não é boa para todos.
Não posso negar os benefícios e o legado da Olimpíada para o país e para a cidade. Mas jamais posso concordar que esse legado não contemple as favelas. Não é justo que todo esse investimento bilionário não contemple essas pessoas que mais precisam. São 38,6 bilhões os custos estimados das olimpíadas e nem 1 real foi gasto com a Rocinha que espera pelo PAC2, orçado em 1,6 bilhão e que melhoraria a qualidade de vida dos moradores.
Voltando à ação na Macega, fomos, como de costume, muito bem recebidos pelos moradores, que ao nos encontrar no caminho já nos cumprimentava e avisavam aos outros que teria ação no campinho. Os moradores, apesar de todos os problemas, são muito alegres e enfrentam as dificuldades do dia a dia de forma muito honesta.
Após distribuir as doações, foi a hora do lanche e das conversas, principalmente com as crianças. A ação foi muito produtiva, e muito mais importante que levar as doações foi se colocar disponível para ouvir, dar voz e visibilidade a esses moradores que são invisíveis em uma cidade dividida.
Agradeço aos voluntários e parceiros envolvidos e também às pessoas que tiveram a solidariedade em doar os materiais. Nosso compromisso maior não é assistencialista, mas sim de buscar melhorias para qualidade de vida nestes locais, oferecendo independência aos moradores.
* Davison Coutinho, morador da Rocinha desde o nascimento. Bacharel em desenho industrial pela PUC-Rio, Mestre em Design pela PUC-Rio, membro da comissão de moradores da Rocinha, Vidigal e Chácara do Céu, professor, escritor, designer e liderança comunitária na Comunidade