Por: FÁTIMA OLIVEIRA
SUS garante assistência e ainda dá ajuda de custo
Há uns dois anos, após um plantão pauleira, atendi em casa um telefonema de uma cunhada que mora em Apuí, no Amazonas, mas estava na capital de Rondônia, Boa Vista, fazendo consultas médicas. Um típico caso de que o que está ruim sempre pode piorar. Eu? Aos cacos, louca para tomar banho, deitar, comer… Ela queria vir para Belo Horizonte “se tratar”, pois há dois meses sentia uma dor na perna, mas não deu atenção. Não sofrera nenhuma pancada, mas estava quase sem poder andar. E, pior, apareceu um caroço na perna, que só aumentava.
“Entendi. E aí?”. Acrescentou: “O médico disse que pode ser um tumor, ‘aquela doença ruim’. Tenho de ir pra fora”. Perguntei: “Ele deu um encaminhamento?”. Foi cristalina: “Só disse que aqui não há recursos. Telefonei para dizer que vou para Belo Horizonte, pelas facilidades de você ser médica e morar aí”. Não foi fácil usar da mais absoluta franqueza. Disse-lhe que não poderia vir só porque sou médica; sou apenas médica, não dona de hospital, nem banqueira e nem teúda e manteúda.
Expliquei que há uma coisa chamada Tratamento Fora de Domicílio (TFD); que deveria pedir ao médico o encaminhamento; que eu não sabia a referência de Rondônia para o caso dela, mas se ela pudesse escolher, poderia vir para Beagá. Uma ziquizira familiar, cujos lances ninguém merece! Ouvi coisas do arco da velha, desde que abandonava um familiar doente a que eu era ruim mesmo. Segurei o tranco. Sempre que alguém pede algo que você se recusa a dar, seja porque não há como ou mesmo por não querer, você vira megera.
Resumo da ópera: ela, uma mulher simples da roça, mas que não é lajeiro e sabe se virar, correu atrás de seus direitos. Em outro telefonema, entre gargalhadas, contou que o médico ficou espantado quando ela voltou no dia seguinte falando que tinha direito a um TFD e deu até o número da portaria! O processo foi rápido. Foi encaminhada para São Paulo, acompanhada da mãe, com consulta marcada, passagens de avião e hospedagens pagas pelo SUS! Em menos de um mês, retornou feliz ao Apuí. Não era câncer (“aquela doença ruim”). E, o mais importante: acessou um direito e não ficou devendo favor a ninguém. Mas acha que deve a Lula! “Imagina, siazinha, se em outros governos, que não ligavam pra gente pobre, eu estaria contando essa história. E ainda conheci São Paulo!”.
O TFD é um direito do usuário do SUS, “instituído pela Portaria nº 55 da Secretaria de Assistência à Saúde do Ministério da Saúde; é um instrumento legal que visa a garantir, através do SUS, tratamento médico a pacientes portadores de doenças não tratáveis no município de origem por falta de condições técnicas. O TFD dá uma ajuda de custo ao paciente e, em alguns casos, também ao acompanhante, encaminhados por ordem médica a unidades de saúde de outro município ou Estado da federação, quando esgotados todos os meios de tratamento no local em que reside, desde que haja possibilidade de cura total ou parcial, limitado ao período estritamente necessário ao tratamento e aos recursos orçamentários existentes. Destina-se a quem necessita de assistência médico-hospitalar cujo procedimento seja considerado de alta e média complexidade eletiva”.
Quem precisa de tratamento que não existe onde mora tem direito a um TFD, que deve ser solicitado a quem fez a indicação do tratamento e protocolado na Secretaria Municipal de Saúde. Muitas prefeituras não informam a existência do direito e até proíbem seus médicos de indicarem o TFD!
Fonte: O Tempo