Nascido no interior de São Paulo, na cidade Colina, Paulo Eduardo de Oliveira [1950-1999], foi um poeta, escritor, teatrólogo, tradutor, ativista político e cultural , referencia seminal do movimento negro brasileiro desde meados dos anos 1970, quando com Oswaldo de Camargo e Abelardo Rodrigues formou o trio informalmente chamado de “Triunvirato”, tendo como quartel-general o “Bar e Restaurante Mutamba” espaço em que discutiam e teorizavam textos relacionados à literatura negra, em especial a partir de uma produção que começava a circular não só em São Paulo, mas por todo o Brasil, de autoria por escritores e escritoras negras.
Produção literária – capturada em plena ebulição, com a constituição, em 1978, do projeto editorial “Cadernos Negros” e, em 1980, do coletivo poético-literário e político “Quilombhoje Literatura” – que se dava em sentido de manifestação por uma existência social, política e cultural contrária, além de oposição, tanto aos cânones literários vigentes, quanto ao ideário de democracia racial e harmonia social que se fazia imperar enquanto a “verdadeira” alma da sociedade brasileira, além também de política ideológica do regime ditatorial militarista [1964-1985] então vigente.
Um autor, que a partir da imprensa alternativa passa a ter seu nome em circulação, ampliando sua rede de contatos e de recepção a sua obra. Ao mesmo tempo em que desenvolvia e radicalizava a percepção pela necessidade de as escritas autorais negras serem reconhecidas como parte fundamental do melhor da produção da literatura nacional, sem perder a sua identidade étnico-racial e social, nesse processo simultâneo de inserção cultural e reconstrução de negritudes.
Literatura em seu sentido emancipatório mais amplo e irrestrito, sem medo ou pudores de se assumir enquanto política e militante. Realidade negra urbana que captura em seu livro de contos “Fogo Cruzado” [1980], em perfeita sintonia com as mudanças políticas e sociais pelas quais passavam o país, que levariam ao final da ditadura militar, resultando na constituição da chamada “Nova República”, com os movimentos negros tendo atuação chave nesse processo. Colocando em destaque os dilemas das pessoas negras, como solidão, violências [urbana, física e psicológica] em meio a cidades de concreto e aço sem alma ou coração. Em constante e pleno exercício de não se deixar apagar, de não perder a sua humanidade, de deixar de existir e de ser quem é.
Processo que ganha maior visibilidade e alcance com a publicação de seu livro “AXÉ: Antologia Contemporânea de Poesia Negra Brasileira” [1982], vencedor do prêmio da APCA [Associação Paulista de Críticos de Artes], na categoria melhor livro de poesia. Obra em que apresentava a produção poética negra que se dava em todos os cantos, em todas as regiões do país. Para além dos estereótipos e das normativas racistas estruturantes da sociedade brasileira.
Paulo Colina capturou o espírito de sua época e deu-lhe formas e sentidos para além do que se imaginava até então. Inaugurando junto a seus pares geracionais, uma nova era não só para a literatura negra em si, mas para a própria literatura nacional. Não sendo mais possível se fazer negar a existências de pluralidades e diversidades que não se enquadram nos parâmetros racistas e discriminatórios de nosso ideário de branquitude.
Um conjunto literário ímpar e original, ao qual Colina continuou a lapidar e fazer atuante aos meandros de nossa cultura nacional, que continua mesmo após o seu falecimento, a ecoar e reverberar em nosso cotidiano. Sendo uma obra mais viva e contemporânea do que nunca! Que sua obra seja cada vez mais [re]conhecida e [re]lida, para isso devendo ser cada vez mais [re]publicada. Pois ainda têm muito a nos falar e ensinar!
Ontem, hoje e sempre, salve ao gigante Paulo Colina! Eterno escritor das negritudes brasileiras!
Referências Bibliográficas:
COLINA, Paulo. AXÉ – Antologia Contemporânea de Poesia Negra Brasileira. Organização de Paulo Colina. São Paulo: Global, 1982.
COLINA, Paulo. Fogo Cruzado. São Paulo: Edições Populares, 1980.
Christian Ribeiro – Sociólogo, mestre em Urbanismo, doutorando em Sociologia pelo IFCH-UNICAMP. Professor titular da SEDUC-SP, pesquisador das áreas de negritudes, movimentos sociais negros e pensamento social no Brasil
** ESTE ARTIGO É DE AUTORIA DE COLABORADORES OU ARTICULISTAS DO PORTAL GELEDÉS E NÃO REPRESENTA IDEIAS OU OPINIÕES DO VEÍCULO. PORTAL GELEDÉS OFERECE ESPAÇO PARA VOZES DIVERSAS DA ESFERA PÚBLICA, GARANTINDO ASSIM A PLURALIDADE DO DEBATE NA SOCIEDADE.