Um recorde de candidaturas negras

Crescimento está ligado à intensificação da pressão dos movimentos sociais

Foi manchete na grande mídia que, nas eleições de 2022, o Brasil terá uma proporção recorde de candidaturas de mulheres e negros —49,3% são de pessoas negras, e as mulheres somam 33,4%, segundo o TSE (Tribunal Superior Eleitoral).

Esse crescimento tem a ver com a intensificação da pressão dos movimentos sociais, em particular do movimento negro, por maior representação política nos parlamentos e Executivos de todo o país. A luta é pela democratização desses espaços.

A contagem dobrada dos votos em candidatas mulheres e em candidatos negros para a Câmara dos Deputados, conforme decisão do TSE em 2021, na definição dos valores do fundo partidário e do fundo eleitoral repassados aos partidos políticos, tem potencial para modificar a realidade de que a política no Brasil sempre foi feita principalmente por homens brancos.

Hoje, os processos eleitorais, ainda que de maneira tímida e lenta, vão incorporando outros segmentos da população, que ao longo da história do país não participaram de decisões que afetam diretamente suas vidas e estão construindo coletivamente sua participação. Essa pluralidade na participação política
é expressiva do que pode ser considerado uma democracia.

A possibilidade real de mudanças no cenário político aumenta a violência contra essas candidaturas como forma de manter privilégios políticos, de não permitir posições diferentes das hegemônicas no cenário político ou ainda visando destruir qualquer oposição.

O relatório Desigualdade de Gênero e Raça na Política Brasileira, da Oxfam Brasil e do Instituto Alziras, nos revelou que nas eleições de 2020 foram comuns ameaças, discursos de incitação a violência e ódio, desmerecimento intelectual, críticas à faixa etária, ao pertencimento étnico-racial e, quanto às mulheres trans, negação de identidade de gênero.

O relatório mostrou ainda que os candidatos que receberam ataques foram ofendidos majoritariamente por suas atuações profissionais, como políticos e gestores públicos —com exceção de idosos e LGBTQIA+, que também foram alvo de ódio e agressões por essas características.

Desta forma, se houve uma ampliação recorde de vereadores e vereadoras negros e negras nas Câmaras Municipais, que passaram de 42,1% para 45,1% dos mandatos, esses parlamentares sofreram ataques justamente por serem aquilo que são.

E neste contexto, algumas situações se repetem, como o fato de que são os homens brancos o único grupo populacional onde a parcela de eleitos é maior do que a proporção de candidatos.

De outro lado, iniciativas da sociedade civil para ampliar o número de votos destes segmentos também são crescentes. A Rede de Ativistas pela Educação do Fundo Malala no Brasil se mobilizou para incentivar meninas brasileiras a se registrarem e votarem nas eleições gerais deste ano, por meio da campanha #MeninasDecidem.

Vale lembrar que o número de jovens entre 15 e 17 anos com novos títulos cresceu mais de 45%, segundo o TSE, correspondendo a 1 milhão de jovens com título.

É também objetivo deste fundo promover não só a ampliação do voto das jovens, mas também a educação pública de qualidade em regiões do país onde a maioria das meninas não frequentam o ensino secundário, principalmente as negras, indígenas e quilombolas, com vistas a mudanças políticas para garantir educação secundária a todas as meninas.

Todo este processo de crescentes esforços por parlamentos e Executivos que reflitam a multiplicidade cultural, religiosa, de gênero, raça e idade é a expressão também da confiança social na democracia.
Vai ao encontro da Carta de 2022, lida em 11 de agosto na maioria dos estados brasileiros, por estudantes jovens, periféricas, negras e trabalhadoras na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), destacando a importância de defender a Constituição, o Estado de Direito e a democracia.

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