Unicamp registra maior nº de mulheres aprovadas desde 2014 e calouros fora de SP sobem 65%

Por Fernando Pacífico, do G1

Unicamp implementou vestibular indígena na edição 2019 — Foto: Reprodução / EPTV

A Unicamp encerrou o vestibular 2019 com o maior número de mulheres matriculadas em cursos de graduação em cinco anos e aumento de 65% na quantidade de calouros residentes fora de São Paulo, no comparativo com exame anterior, segundo perfil socioeconômico divulgado na tarde desta terça-feira (23) pela comissão organizadora da prova (Comvest). Além disso, houve alta de 34% em matriculados com renda familiar de até dois salários mínimos e a universidade atualizou os resultados sobre ingressantes autodeclarados pretos e pardos e/ou oriundos da rede pública.

O quadro geral de matriculados inclui resultados da modalidade tradicional do processo seletivo e outras formas de ingresso implementadas na edição, entre elas, o vestibular indígena, o ingresso via desempenho no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) e as vagas reservadas para premiados em olimpíadas ou competições de conhecimentos. Além disso, para tentar elevar a inclusão social, ela ficou marcada por oferecer pela primeira vez a opção de cotas étnico-raciais.

O formato tradicional da prova passou a ser aplicado em Salvador (BA) e Curitiba (PR), e foram mantidas na lista da Unicamp, além de São Paulo (SP), outras três capitais: Belo Horizonte (MG), Brasília (DF) e Fortaleza (CE). A universidade já definiu o calendário para a edição 2020.

Presença das mulheres

O total de mulheres matriculadas em cursos de graduação chegou a 1.435 nesta edição, maior número absoluto desde 2014, quando foram contabilizadas 1.556. No comparativo com o ano anterior, quando foi registrado número mais baixo em 11 anos, o crescimento equivale a 7,5%.

  • 2019 – 1.435
  • 2018 – 1.334
  • 2014 – 1.556

Ao G1, o coordenador executivo da Comvest, José Alves de Freitas Neto, explicou que o aumento de mulheres matriculadas na edição 2019 do vestibular ocorreu, em parte, por causa de estudantes que fizeram o ensino médio na rede pública e ocuparam as cadeiras onde o critério de seleção aplicado foi o desempenho nas provas do Enem. Nesta modalidade foram reservadas 645 cadeiras.

“Há uma grande disparidade de concluintes do ensino médio entre homens e mulheres. Na escola privada os números de concluintes e inscritos, por sexo, são equilibrados”, destaca o professor do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) ao ponderar que o grupo de mulheres, em classes socioeconômicas mais baixas, é mais escolarizado que o de homens, segundo indicadores oficiais.

O coordenador executivo da Comvest, José Alves de Freitas Neto — Foto: Alex Matos

“Muitas vezes os rapazes, por ajudarem [com trabalho], fazerem algum bico, há uma outra realidade social e isso faz com que tenham menor frequência. Os índices de evasão, desistência ou repetição de homens nas escolas públicas são muito maiores […] provavelmente as garotas que se inscreveram pelo Enem tiveram rendimento superior e isso ajudou a alavancar”, diz o docente.

Freitas Neto avaliou o resultado de forma positiva e ponderou que o fato dos cursos de exatas terem “grande peso no perfil de ofertas” da Unicamp também provoca reflexos nos indicadores.

“Ficamos satisfeitos que tenha maior presença das mulheres na universidade, porque afinal de contas também queremos ter uma adequação ao perfil educacional no sentido de que, se mais mulheres concluem o ensino médio, é natural que tenhamos maior presença nas universidade […] Numa época de falar de tantas conquistas de direitos para os diferentes grupos, e ao mesmo tempo as ameaças que eles têm, ter espaço para mulheres é muito mais do que bem-vindo.”

De acordo com ele, quase metade das cadeiras na graduação é destinada para áreas de exatas, sobretudo engenharias e tecnologias. “São perfis que tradicionalmente as mulheres não frequentam muito. Queremos que isso mude ao longo do tempo, mas é uma realidade da experiência no mundo como um todo, onde elas não são estimuladas a frequentar estas áreas. É um desafio para pensarmos em perspectivas e inclusões futuras”, pondera o coordenador.

Edição 2019

  • sexo masculino: 1.993 (58,1%);
  • sexo feminino: 1.435 (41,9%);

Edição 2018

  • sexo masculino: 1.993 (59,9%);
  • sexo feminino: 1.334 (40,1%);

Calouros de fora de SP

As mudanças implementadas pela universidade também resultaram em aumento de calouros residentes fora de São Paulo. Na edição encerrada em janeiro foram contabilizados 408 estudantes, total que significa elevação de 65,1% em relação aos 247 matriculados no exame de 2018.

  • Edição 2018: 247 matriculados
  • Edição 2019: 408 matriculados

Para Freitas Neto, o “mix de sistemas” ampliou a diversidade territorial desejada pela Unicamp – sobretudo quando ele pondera sobre resultados do vestibular indígena, inclusões de duas capitais na lista de provas e as oportunidades para premiados em olimpíadas. “O Enem, que também tem abrangência nacional, contribuiu menos do que o esperado em termos de outras unidades da federação. Mas permitiu chegar a municípios menores do estado”, ressalta o professor.

Inclusão social

A implementação das cotas étnico-raciais também se refletiu no perfil econômico dos ingressantes. Os dados mostram que, entre os novos alunos, 508 (14,9%) têm renda familiar de até dois salários mínimos (R$ 1.996), enquanto foram 379 no ano anterior. A diferença representa aumento de 34%.

“Há uma forte correlação entre a adoção das cotas e o perfil alcançado. Sabemos que as desigualdades existentes no país impacta, sobretudo, a população negra. Nesse sentido, mesmo a adoção ter sido pelo critério étnico-racial, o resultado é também social e econômico”, pondera.

Os maiores grupos, por outro lado, estão concentrados nas faixas de famílias com renda mensal de três a cinco salários mínimos (22,7%), e entre cinco e sete (16,7%), segundo o relatório.

Freitas Neto destacou que a tendência é de manutenção da taxa integral de R$ 170 no vestibular 2020. O prazo para pedidos de isenção fica aberto até 6 de maio, segundo a universidade.

Dados atualizados

Nesta tarde, a Unicamp atualizou dados sobre total de candidatos autodeclarados pretos e pardos aprovados para cursos de graduação na Unicamp. A prévia havia sido divulgada em fevereiro.

Estes grupos representam 35% dos ingressantes deste ano, percentual próximo ao de 37,5% estabelecido como meta pelo Conselho Universitário (Consu), e supera índice anterior de 23,9%.

“A Unicamp trabalhou seriamente, com estudos, grupos de trabalho, debates e análises que permitiram chegar a estes dados”, avalia Freitas Neto. Já o índice de estudantes oriundos da rede pública chegou a 47,9%, enquanto que no vestibular anterior ele alcançou 49,2%.

De acordo com a Comvest, elevar este índice é um desafio. “Apenas se houver incremento de candidatos. Esse é um ponto complexo em todas as universidades, o fenômeno da auto-exclusão. Aproximadamente 600 mil estudantes concluem o ensino médio em escolas públicas no estado e pouco mais de 20 mil se inscrevem no vestibular”, pondera o coordenador executivo.

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