Vereador gaúcho é indiciado por racismo após discurso contra baianos

Parlamentar, que admitiu ter se excedido, fez as declarações depois de caso de trabalho análogo à escravidão em vinícolas

A Polícia Civil do Rio Grande do Sul concluiu que houve crime de racismo no discurso proferido pelo vereador Sandro Luiz Fantinel (sem partido, à época no Patriotas) na Câmara Municipal de Caxias do Sul (RS) em 28 de fevereiro.

O indiciamento foi encaminhado ao Ministério Público. Se condenado pela Justiça, Fantinel pode pegar até cinco anos de prisão.

A fala dele teve relação com o resgate de trabalhadores baianos em condições análogas à escravidão que prestavam serviço a vinícolas de Bento Gonçalves (RS), seis dias antes.

Na tribuna, Fantinel aconselhou agricultores locais a não contratar mais “aquela gente lá de cima” que seria “acostumada com carnaval e festa”, dando preferência a argentinos. Disse ainda que “com os baianos, que a única cultura que eles têm é viver na praia tocando tambor, é normal que se fosse ter esse tipo de problema.”

O inquérito havia sido instaurado no mesmo dia do discurso. Antes de encaminhar o indiciamento ao Ministério Público, na segunda-feira (13), a Polícia Civil analisou as imagens, colheu o depoimento de duas testemunhas e do próprio vereador, no dia 9.

O resultado da investigação foi anunciado pelo delegado Fernando Sodré, chefe da Polícia Civil do Rio Grande do Sul, em Porto Alegre. Ele considera não ter dúvida sobre a ocorrência de crime de racismo.

Sodré destacou a questão de o vereador atacar a procedência nacional dos trabalhadores e o trecho em que o vereador fala em “tocar tambor”, entendida pelos investigadores como “mensagens subliminares de racismo referente à origem e a cor” e a “religiões de matriz africana”. O crime de racismo prevê pena de dois a cinco anos de prisão e é imprescritível.

Além da esfera criminal, Fantinel foi expulso do seu partido, o Patriota, e também enfrenta processo de cassação na Câmara Municipal. Na segunda-feira (13), ele entregou sua defesa prévia à comissão processante. Agora, os vereadores têm cinco dias para emitir um parecer, opinando pelo prosseguimento ou arquivamento da denúncia. .

Procurado pela Folha, o vereador enviou uma nota assinada pelos seus advogados, Vinícius de Figueiredo e Rodrigo de Oliveira Vieira. O texto diz que o parlamentar admitiu ter se excedido na fala. Diz ainda que o ” crime é considerado de médio potencial ofensivo” e que “a defesa trabalhará incessantemente na mitigação dos efeitos do indiciamento”.

Na época do discurso, Fantinel disse que “falou demais” e que voltaria à tribuna no dia seguinte para pedir desculpas. Em suas redes sociais, em 2 de março ele pediu desculpas, disse ter “muito apreço ao povo Baiano e a todos do Norte/Nordeste do país” e atribuiu a manifestação a um lapso mental do qual estaria “profundamente arrependido”.

Também na segunda-feira, a Brigada Militar (como é chamada a PM gaúcha), afastou do policiamento de rua o soldado Márcio Squarcieri, 39, suspeito de atuar como segurança privado para a Fênix Prestação de Serviços, empresa terceirizada que contratou 207 trabalhadores para a colheita da uva e que manteve os trabalhadores em condições degradante de alojamento, alimentação e trabalho.

Na quinta-feira passada (9), o MPT-RS (Ministério Público do Trabalho do RS) fechou um TAC (Termo de ajustamento de conduta) com as vinícolas Aurora, Garibaldi e Salton prevendo 21 obrigações e indenizações que somam R$ 7 milhões. A Fênix, que arcou com as rescisões de contrato, não fechou acordo com o MPT-RS e teve R$ 3 milhões retidos pela Justiça do Trabalho.

+ sobre o tema

Quando o assassínio de um negro fez mudar a lei

A morte de Stephen Lawrence, há 25 anos, foi...

Plataforma de denúncia de violência policial recebe prêmio internacional

DefeZap foi premiado por inovação no acesso à Justiça em...

para lembrar

Polícia identifica acusado de fazer ofensas racistas à cantora Ludmilla

Um dia após a cantora Ludmilla, do hit ‘É...

Racismo Ambiental: Povos tradicionais resistem à injustiça

      A expropriação de territórios e ausência do poder público...

Contardo Calligaris: Raças e cotas

por: CONTARDO CALLIGARIS As cotas só afirmam as diferenças com...
spot_imgspot_img

‘Redução de homicídios no Brasil não elimina racismo estrutural’, afirma coordenador de Fórum de Segurança

Entre 2013 e 2023, o Brasil teve uma queda de 20,3% no número de homicídios, de acordo com o Atlas da Violência, produzido pelo Fórum...

‘Não aguentava mais a escola’, diz mãe de aluna internada após racismo

A mãe da aluna de 15 anos que foi encontrada desacordada no Colégio Mackenzie (SP), contou ao UOL que a filha segue internada em um hospital psiquiátrico...

Risco de negro ser vítima de homicídio é 2,7 vezes maior no Brasil

Ser uma pessoa negra no Brasil faz você enfrentar um risco 2,7 vezes maior de ser vítima de homicídio do que uma pessoa não negra. A constatação...
-+=
Geledés Instituto da Mulher Negra
Privacy Overview

This website uses cookies so that we can provide you with the best user experience possible. Cookie information is stored in your browser and performs functions such as recognising you when you return to our website and helping our team to understand which sections of the website you find most interesting and useful.