Violência, insegurança e gestão falha resultam em uma morte a cada 10 minutos no Brasil

O Brasil investe mais em segurança pública do que os Estados Unidos e pouco menos do que a União Europeia, mas colhe resultados amplamente piores do que essas duas regiões do mundo. Mais nítido o problema de gestão, impossível. Esse é apenas um dos muitos dados apresentados pelo 8º Anuário Brasileiro de Segurança Pública, divulgado nesta terça-feira (11) em São Paulo.

 

Por:  no, Brasil Post 

 

O documento de 156 páginas traz como mais alarmante o dado que uma pessoa é assassinada a cada 10 minutos no País. Foram 53.646 mortes violentas só em 2013, um aumento de 1,1% em relação ao ano anterior. O número de estupros também não é nada animador: foram 50.320 registrados, embora a estimativa real aponte para 143 mil, já que boa parte das vítimas, por vergonha ou medo, não denuncia o crime.

Não menos alarmante é o fato de que 11.197 pessoas foram mortas por policiais entre 2009 e 2013 – o que corresponde a seis mortes atribuídas a policiais brasileiros/dia –, um número que a polícia dos EUA não conseguiu alcançar em um espaço de 30 anos (11.090). Já 75,3% dos policiais que foram mortos no Brasil– um total de 490 – não estavam em serviço quando foram assassinados, outro dado assustador e incomum a outros países.

“O fato é que o nosso sistema de Justiça e segurança é muito ineficiente em enfrentar tal realidade e funciona a partir de um paradoxo que mais induz a antagonismos do que favorece a indução de cooperação e a troca de experiências”, diz trecho do anuário, assinado pelos pesquisadores Renato Sérgio de Lima, Samira Bueno, Roberto Maurício Genofre e Elizabeth Leeds.

Fim de alguns mitos da segurança no País

Com base nos números apresentados pelo anuário, é possível pôr fim a alguns mitos que rondam a pauta política quando o assunto é segurança pública. Um exemplo é a aposta que reduzir a maioridade penal de 18 anos para 16 anos vai rapidamente diminuir o número de assassinatos no Brasil. Em 2012, dos 20.532 jovens cumprindo medidas socioeducativas no Brasil, apenas 11,1% deles tinham envolvimento com homicídios e latrocínios.

Outro mito que cai por terra é aquele popular “bandido bom é bandido morto”, presente majoritariamente no discurso reacionário da direita. Da população carcerária brasileira estimada em 574.207 – da qual 49% respondem por crimes patrimoniais e apenas 12% respondem por homicídios –, 215.639 (40,1% do total) são os chamados presos provisórios, que ainda aguardam julgamento. A letargia só agrava o alto déficit de vagas (220.057), fator que nada contribui em uma recuperação de indivíduos perante a sociedade.

Além disso, 81% das pessoas entrevistadas acredita ser fácil desobedecer as leis no Brasil. Em um dos gráficos, é possível perceber que a maioria dos que nisso acreditam estão em Estados do Centro-Sul do País, são homens, brancos, que ganham mais de oito salários mínimos e com alta escolaridade. Não por acaso, os chamados “crimes do colarinho branco” poderiam se encaixar justamente nesse perfil, o que os tornam ainda mais desafiadores.

Poderes também são alvos de críticas

O anuário ainda apresenta tons críticos contra os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, que contribuem, cada um a sua maneira, para o quadro ruim atual. Contudo, uma melhora da segurança no Brasil – a qual faz os pesquisadores pregarem que é possível reduzir em 65,5% o índice de homicídios até 2030 – dependem de atitudes diferentes destes três poderes, sempre em tom de “cooperação e mudança de práticas institucionais”, como prega ainda o documento para outros setores, como a polícia.

Falando em polícia, 4% dos deputados federais eleitos nestas eleições são policiais ou ex-policiais, o que ajuda a explicar que, nos últimos quatro anos, quase metade dos 35 projetos de segurança pública aprovados pelo Congressoestiveram exclusivamente ligados ao interesse corporativo das instituições policiais.

Já o Executivo é criticado por não conseguir definir de maneira clara políticas de segurança pública, que permitam eficiência na prevenção e repressão ao crime e ao abuso policial. Já o Judiciário se mostra ausente em várias esferas, mais notadamente na falta de articulação com demais setores para “modificar os padrões de encarceramento, sem implicar, evidentemente, em impunidade”.

“Falar hoje em segurança pública significa falar de um projeto de País; significa ter coragem política e institucional para liderar um pacto pela promoção de uma vida digna e em paz para parcelas majoritárias da população (…). O Brasil pode transformar retóricas eleitorais e discursos em novas práticas institucionais”, concluiu o anuário.

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