As plurais veredas de Maurício Tizumba: mineiro lança biografia em show com Sérgio Pererê

Religião, negritude, irreverência; música, teatro e dança. Esses talvez sejam os principais pilares que sustentam a plural trajetória de Maurício Tizumba. Uma das grandes pérolas culturais das Alterosas, o multiartista condensa sua rica trajetória na biografia “De Camarões: Veredas de Maurício Tizumba” (Nandyala) – cujo lançamento acontece na próxima sexta-feira, em um show com o parceiro Sérgio Pererê, no Centro Cultural Minas Tênis Clube.

Por Lucas Buzatti, do Hoje em Dia 

Foto: ÉLCIO PARAÍSO/BENDITA/DIVULGAÇÃO

Com pesquisa, entrevistas e projeto editorial assinados por Elias Gibran, Viviane Maroca e Pedro Kalil, o livro conta a história de Tizumba de uma forma gráfica e não linear. “Eu não gostava dessa ideia de escrever sobre mim. Sempre achei biografia um negócio para quem já está morto”, brinca Tizumba, hoje aos 60 anos, explicando o título da obra.

“Participei do filme ‘DNA África’, em 2016, que mostra como eu descobri que minha descendência é de Camarões e, a do Pererê, de Angola. O Gibran já tinha essa ideia do livro, aí resolvemos fazer. Não coube tudo, ficou muita coisa de fora. Mas deu para falar de música, teatro, dança, candomblé, igreja, congado. Tudo misturado, sem começo, meio e fim, até porque eu sou assim”, reflete.

Assim, nas 224 páginas do livro, a infância de Tizumba e sua formação sócio-cultural-filosófica-espiritual misturam-se, em meio a fotos, rabiscos e bilhetes, com histórias de sua caminhada artística na televisão, no teatro, nos bares e ruas de Belo Horizonte. “A música vem de criança, porque eu já era envolvido com o congado e o candomblé. Na infância, nas escolas e na televisão, eu cantava artistas negros como Agnaldo Timóteo, Jorge Ben e Simonal. Foi só nos bares que eu vi que podia misturar, no meu trabalho, influências das religiões de matriz africana”.

O começo da carreira nos bares – cujos bilhetes que recebia enfeitam o livro – são destaque para o artista mineiro. “O bar, para mim, é tudo. É o que deu o start na minha carreira. No bar, você não é o centro das atenções. As pessoas estão ali para namorar, beber, comer e, depois, pela música. Mas como minha música sempre foi muito performática, consigo subir uns graus nessa escala”, pontua. “Eu comecei a trabalhar para ser notado, não só para ser assistido. Queria que as pessoas vissem que ali tinha uma coisa diferente. E elas viam”.

Criador do grupo Tambor Mineiro e da companhia de teatro Burlantins, Tizumba dá peso igual para suas frentes artísticas. “Tudo sempre caminhou junto”, sublinha o artista, que conta com cinco discos de estúdio e já gravou mais de 30 atrações televisivas e cinematográficas, entre filmes e minisséries. Mas e o congado, também está no mesmo lugar? “O congado é outra coisa. É o pulso da minha história. Tem outro sentido, espiritual, de fé”, ressalta, refutando o posto de guardião. “Que toma conta do congado são os próprios congadeiros. Por eu ser artista e congadeiro, talvez eu dê visibilidade, mas quem cuida são eles, com sua forte fé em Nossa Senhora do Rosário. Até porque nunca quis tornar o congado um espetáculo. É sagrado”, diz.

MULTIFACETADO – Marcada pelas religiões de matriz africana, a história de Tizumba se divide em diferentes frentes artísticas (Foto: Patrick Arley/Divulgação )

Tizumba ressalta a importância de referenciar a luta e as manifestações culturais do negro

Um fator que aglutina as atuações artísticas de Tizumba é a negritude e a defesa das manifestações afro. “Com sete anos, eu cantava ‘Tributo a Martin Luther King’ sem nem entender a história. Meu envolvimento com a luta do negro aconteceu, mesmo, quando fui convidado a participar do

Movimento Negro Unificado (MNU), em 1978. Depois disso, virou o discurso do meu trabalho. Até porque não consigo fazer de outro jeito: é o meu corpo negro que está ali, no palco, na rua, na TV”.

O multiartista mineiro defende a importância das manifestações culturais e da luta do povo negro, frente ao racismo estrutural que assola o Brasil. “Veja hoje, como o racismo voltou com tudo. Por isso, não acho que o racismo vai acabar, porque o racista existe. O que tem que acabar é a falta de direitos, a falta de igualdade”, crava.

HISTÓRIA – Foto mostra Maurício Tizumba em Ouro Preto, em 1975, ano em que começou a tocar e cantar em bares (Acervo Pessoal)

“Desde que nosso povo foi sequestrado na África e jogado no mundo à própria sorte, existe uma defasagem muito grande, que só vai se resolver com as cotas. Mas o branco não entende que a gente precisa de reparação histórica. Não entende que o bisavô dele roubou o meu, que a pele clara dele abre portas, que ele pode roubar e colocar a culpa em mim”.

Nesta toada, Tizumba ressalta que é preciso referenciar as origens da cultura do tambor em BH, hoje alastrada pelo carnaval de rua – e que encontrou identidade no termo tilelê, popularizado por uma música sua. “As pessoas falam que são tilelês sem nem saber o que significa. Tilelê não é usar brinco e saia rodada. São refrões onomatopéicos de cantigas congadeiras. Têm vários tilelês, muita gente acha que é só o que eu gravei na música”, afirma. “Eu acho legal quando as pessoas se identificam e chegam para brincar e dançar. Afinal, a gente trabalha para isso. O que não pode acontecer é sequestrarem nossa arte e nossa fé para braquear a história”.

O show de Maurício Tizumba e Sérgio Pererê acontece na próxima sexta-feira, às 20h30, no Teatro do Centro Cultural Minas Tênis Clube (r. da Bahia, 2.244 – Lourdes). Os ingressos custam R$ 20 (inteira) e R$ 10 (meia-entrada). No lançamento, o livro será vendido a R$ 30.

 

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