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    Decretos que facilitam acesso à armas de fogo são vetados por ministra do Supremo Tribunal Federal, Rosa Weber Foto: arte de André Mello

    Feminicídio terá aumento expressivo se STF revogar decisão de Rosa Weber sobre armas, analisam especialistas

    Foto: Editoria de Arte/G1

    Senado aprova formulário de registro de violência doméstica e familiar

    Mulheres na corda-bamba. / LUSMORE DAUDALUSMORE DAUDA

    Quase metade das mulheres não decide plenamente sobre seu corpo

    "Mulheres aprendem que não são responsáveis só pelos próprios sentimentos, mas também pelo dos outros" (Foto: Getty Images)

    Por que nós, mulheres, estamos sempre pedindo desculpas? 

    Deputada estadual eleita Renata Souza (PSOL) (Foto: Caio Oliveira/Divulgação)

    13 de abril: dia de celebração e luta para as mulheres do samba

    Imagem: Getty Images/BBC

    Jovem denuncia motorista de aplicativo por se masturbar durante corrida em Salto

    Foto: Marcus Steinmayer

    Primeira biografia de Sueli Carneiro narra vida de lutas em prol da mulher negra

    Adobe

    A cultura do estupro e suas diferentes intervenções nos corpos negros

    VLT – Foto: Site “Mobilidade Urbana Salvador”

    Reflexões sobre interseccionalidade de gênero, raça e classe nas políticas públicas em Salvador

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      Vacinação completou dois meses em São Paulo | Magno Borges/Agência Mural

      São Paulo vacinou 3 vezes mais pessoas identificadas como brancas do que negras

      Atila Roque (Foto: Reprodução Fopir/Youtube)

      Setor privado tem oportunidade histórica para romper pacto racista

      Concurso visa à propagação do debate contra todas as formas de discriminação (Foto: Michelle Tantussi/Efe)

      Enajun seleciona artigos sobre questão racial e antidiscriminatória

      (Foto: @ Artsy Solomon/ Nappy)

      Eu e a Outra: experiências de racismo, sexismo e xenofobia

      Usain Bolt (Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil)

      Blog usa foto de Usain Bolt para notícia de roubo e reafirma racismo sistêmico do Brasil

      Foto: @pixabay/ Nappy

      E as nossas crianças negrxs da periferia?

      Luana Barbosa dos Reis morreu após abordagem da PM em Ribeirão Preto (Foto: Reprodução/EPTV)

      Negra, lésbica, periférica: morte de Luana Barbosa faz 5 anos sem resolução

      Anielle Franco (Foto: Bléia Campos)

      Educação e saúde: Será que é a hora de reabrir nossas escolas?

      O ator americano Will Smith na Califórnia, nos Estados Unidos, em 6 de outubro de 2019 - Valerie Macon/AFP

      Will Smith se recusa a gravar filme na Geórgia em protesto contra nova lei eleitoral

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      A população negra é a maior vítima da violência no Brasil (Getty Images)

      Brasil é ‘racista’ e parece executar ‘indesejados’ com conivência da Justiça, diz Comissão Interamericana da OEA

      Ivanir Dos Santos (Foto: Arquivo Pessoal)

      Ivanir dos Santos: Ainda há esperança em prol da tolerância

      Bandeira do orgulho trans hasteada em São Francisco, nos Estados Unidos. Foto: Flickr (CC)/torbakhopper

      Brasil segue no topo de ranking de assassinatos de pessoas trans no mundo

      Maíra Vida: Advogada, Professora, Conselheira Estadual da OAB BA e Presidenta da Comissão Especial de Combate à Intolerância Religiosa (Foto: Angelino de Jesus)

      Do crente ao ateu, não faltam explicações para o racismo religioso no Brasil

      Foto: Deldebbio

      Prefeito de Duque de Caxias é investigado por intolerância religiosa a crenças de matriz africana

      FÁBIO VIEIRA/ESPECIAL METRÓPOLES

      Após ser alvo de ataques transfóbicos e racistas, Érika Hilton irá processar 50 pessoas

      A parlamentar Laetitia Avia propôs a nova nova lei, enquanto o primeiro-ministro Jean Castex foi ridicularizado por seu sotaque (GETTY IMAGES)

      Por que a França pode criminalizar a discriminação pelo sotaque

      Adolescente de 16 anos foi espancada pelo pai por ser lésbica, na Bahia — Foto: Divulgação/Polícia Civi

      Adolescente é espancada pelo pai na BA e relata que motivo é ela ser lésbica; avó da vítima denunciou homem à polícia

      (Jonathan Alcorn/AFP/)

      Painel trata combate ao racismo como exercício de cidadania e justiça

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        Chadwick Boseman: Portrait of an Artist (Reprodução/Youtube)

        Ator de Pantera Negra, Chadwick Boseman ganha documentário da Netflix

        Foto: Imagem retirada do site HQ's com Café

        Livro: Negritude, Poderes e Heroísmos

        Foto: Duda Viana

        Cia. do Despejo faz crítica à necropolítica brasileira na videoarte online ‘IRETI’, inspirada na mitologia Iorubá

        O escritor Ousman Umar - Foto: Cadena Ser

        Enviar arroz à África nunca vai conter a migração para a Europa, diz escritor de Gana

        Dona Ivone Lara (Foto: André Seiti)

        Itaú Cultural celebra as primeiras 50 exposições da série Ocupação em publicação com textos de artistas contemporâneos sobre homenageados

        Historiadores vêm tentando resgatar a trajetória de pessoas negras escravizadas na época colonial a partir de um amplo leque de documentos da época (Getty Images)

        A luta de um homem negro pela liberdade entre Caribe, Brasil, África e Europa

        Milton Nascimento é tema de longa-metragem que será realizado pela produtora Gullane — Foto: Instagram/Reprodução

        Milton Nascimento anuncia que será produzido filme sobre trajetória dele

        Celeste (Foto: Sergione Infuso/Corbis/Getty)

        7 canções para conhecer Celeste, indicada ao Oscar 2021 por “Hear My Voice,” [LISTA]

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            Adolescente é espancada pelo pai na BA e relata que motivo é ela ser lésbica; avó da vítima denunciou homem à polícia

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              Boaventura: a grande disputa pelo antissistema

              Divórcio entre Capitalismo e Democracia produziu a enorme instabilidade política que marca o Ocidente. Muitos atacam o establishment. Mas quem vencerá: os que já não suportam as lógicas do capital, ou os que nunca admitiram a democracia?

              11/02/2021
              em Artigos e Reflexões
              Tempo de leitura: 15 mins read
              A A

              Fonte: Outras Palavras, por Boaventura de Souza Santos
              Imagem retirada do site Outras Palavras

              Imagem retirada do site Outras Palavras

              O crescimento global da extrema-direita voltou a dar uma nova importância ao conceito de antissistema em política. Para entender o que se está a passar é necessário recuar algumas décadas. Num texto deste tipo não é possível dar conta de toda a riqueza política deste período. As generalizações serão certamente arriscadas e não faltarão omissões. Mesmo assim, o exercício impõe-se pela urgência de dar algum sentido ao que, por vezes, parece não ter sentido nenhum.

              O binarismo sistema-antissistema está presente nas mais diferentes disciplinas, das ciências naturais às ciências humanas e sociais, da biologia à física, da epistemologia à psicologia. O corpo, o mundo, a cidade ou o clima podem ser concebidos como sistemas. Há mesmo uma disciplina dedicada ao estudo dos sistemas – a teoria dos sistemas. O sistema é, em geral, definido como uma entidade composta de diferentes partes que interagem de modo a comporem um todo unificado ou coerente. O sistema é assim algo limitado, e o que está fora dele tanto o pode rodear e influenciar (o seu meio-ambiente) como lhe pode ser hostil e pretender destruir (antissistema). Nas ciências sociais, ainda que algumas correntes rejeitem a ideia de sistema, são muitas as formulações do binarismo sistema/antissistema. Distingo duas formulações particularmente influentes. A teoria do sistema-mundo proposta por Immanuel Wallerstein defende que, historicamente, existiram dois tipos de sistema-mundo: o império-mundo e a economia-mundo. O primeiro é caracterizado por um centro político com amplas estruturas burocráticas e múltiplas culturas hierarquizadas; o segundo é caracterizado por uma só divisão do trabalho, múltiplos centros políticos e múltiplas culturas igualmente hierarquizadas. Desde o século XVI, existe o sistema-mundo moderno assente na economia-mundo do capitalismo, um sistema dinâmico, conflitual, com diferentes ritmos temporais que dividiu os diferentes países/regiões em três categorias – o centro, a periferia e a semiperiferia – definidas em função do modo como se apropriam (ou são expropriadas) das mais valias da produção capitalista e colonialista global. O sistema permite transferências de valor dos países periféricos para os países centrais, enquanto os países semi-periféricos atuam como correias de transmissão do valor criado da periferia para o centro (como foi o caso de Portugal durante séculos).

              A outra concepção de sistema (e de antissistema) tem sido desenvolvida sobretudo na ciência política e nas relações internacionais. O sistema é aqui concebido como um conjunto coerente de princípios, normas, instituições, conceitos, crenças e valores que definem os limites do que é convencional e legitimam as atuações dos agentes dentro desses limites. A unidade do sistema tanto pode ser local como regional, nacional ou internacional. Podemos dizer que, depois da Segunda Guerra Mundial, foram dois os sistemas nacionais dominantes: o sistema político de partido único ao serviço do socialismo (o mundo sino-soviético) e um sistema democrático liberal ao serviço do capitalismo (o mundo liberal). As relações internacionais entre os dois sistemas configuraram um terceiro sistema, a Guerra Fria, um sistema regulado de conflito e contenção. A Guerra Fria condicionou o modo como foram avaliados os dois sistemas nacionais/regionais: para o mundo liberal, o mundo sino-soviético era uma ditadura ao serviço de uma casta burocrática; para o mundo sino-soviético, o mundo liberal era uma democracia burguesa ao serviço da acumulação e da exploração capitalista. Com a queda do Muro de Berlim (1989), este sistema feito de três sistemas entrou em crise. A nível nacional passou a reconhecer-se um só sistema legítimo, o sistema liberal. A crise do sistema internacional da Guerra Fria atingiu o paroxismo com a presidência de Donald Trump. Vistas da longa duração do sistema-mundo moderno, estas transformações políticas, apesar do seu dramatismo, são variações epocais dentro do mesmo sistema, as quais, quando muito, podem estar a sinalizar uma crise mais profunda do próprio sistema-mundo.

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              31/01/2021

              São antissistêmicos os movimentos que se opõem radicalmente ao sistema dominante. Ao longo do século XX, foram antissistêmicos os movimentos que se opunham ao capitalismo e ao colonialismo (anti-sistema-mundo) e os que se opunham à democracia liberal (anti-mundo liberal). Alguns movimentos foram contra o capitalismo/colonialismo mas não contra a democracia liberal, caso dos partidos socialistas e a maioria dos sindicatos das primeiras décadas do século XX (socialismo democrático). Outros foram contra o capitalismo/colonialismo e a democracia liberal, caso dos movimentos revolucionários – comunistas, anarquistas – e muitos dos movimentos de libertação anticolonial, com adoção ou não da luta armada. Por fim, outros foram contra a democracia liberal, mas não contra o capitalismo/colonialismo. Foram os movimentos reacionários, nazistas, fascistas, populistas de direita que, ou não aceitavam sequer os três princípios da Revolução Francesa (liberdade, igualdade, fraternidade), ou viam na evolução da democracia liberal (alargamento do sufrágio, multiplicação dos direitos sociais e econômicos) e no crescimento do movimento comunista depois da Revolução Russa uma perigosa deriva que acabaria por pôr em causa o capitalismo. Estes movimentos propuseram um capitalismo tutelado pelo Estado autoritário (fascismo e nazismo).

              Foi sempre importante distinguir entre esquerda e direita, entre movimentos revolucionários e contra-revolucionários. Os primeiros, quando lutaram contra o capitalismo/colonialismo, fizeram-no em nome de um sistema social mais justo, mais diverso e mais igual e, quando lutaram contra a democracia liberal, foi em nome de uma democracia mais radical, mesmo que o resultado acabasse por ser a ditadura, como aconteceu com Stálin. Pelo contrário, os movimentos contra-revolucionários lutaram sempre contra as forças anticapitalistas e anticolonialistas, muitas vezes com o preconceito de estas serem protagonizadas por classes inferiores ou perigosas e, pelas mesmas razões, dispuseram-se a optar pela ditadura sempre que a democracia liberal significasse alguma ameaça para o capitalismo.

              1945-1989

              Entre 1945 e 1989 a dialética entre o sistema e o antissistema foi muito dinâmica. Nos países centrais do sistema-mundo, o que chamamos hoje Norte Global, o fascismo e o nazismo foram derrotados e apenas sobreviveram em dois países semi-periféricos da Europa, Portugal e Espanha. Na Rússia (e países satélites), a outra semi-periferia europeia, e na China, consolidou-se o sistema sino-soviético. Nos países europeus centrais a democracia liberal passou a ser o único regime político legítimo. Os partidos socialistas abandonaram a luta anticapitalista (em 1959, o SPD alemão dissociou-se do marxismo) e passaram a gerir a tensão entre democracia liberal (fundada na ideia de soberania popular) e capitalismo (fundado na ideia de acumulação infinita de riqueza), segundo a nova fórmula dada a um velho conceito: a social-democracia. Por sua vez, os partidos comunistas e outros partidos à esquerda dos partidos socialistas integraram-se no sistema democrático. Aliás durante a noite fascista e nazista, os militantes destes partidos (sobretudo os comunistas) foram quem mais dedicadamente lutou pela democracia, tendo pago um alto preço por isso. É bom recordar, a título de exemplo, que Álvaro Cunhal, secretário-geral do PCP, esteve preso durante 15 anos, 8 dos quais em regime solitário.

              Na periferia e na semi-periferia do sistema-mundo os movimentos anti-capitalistas e antidemocracia liberal assumiram o poder na China, Cuba, Coreia do Norte e Vietnam, e noutros países alimentaram durante muitos anos a luta antissistêmica, por vezes com recurso à luta armada, casos da Colômbia, Filipinas, Turquia, Sri Lanka, Índia, Uruguai, Nicarágua, El Salvador, Guatemala. O caso mais significativo de movimento anticapitalista mas não antidemocracia liberal foi o liderado por Salvador Allende no Chile (1970-1973), neutralizado por um golpe brutal planejado pela CIA.

              Em África e na Ásia, os movimentos de libertação anticoloniais conferiram uma nova complexidade aos movimentos antissistêmicos. Inspirados pela Conferência de Bandung de 1955, que reuniu 29 países asiáticos e africanos e conferiu força política ao conceito de Terceiro Mundo (o Movimento dos Não-alinhados), propunham-se fazer uma dupla ruptura na lógica sistêmica. Por um lado, rejeitavam tanto o capitalismo liberal como o socialismo soviético e dispunham-se a lutar por alternativas que combinavam o pensamento político europeu e várias estirpes de pensamento africano. Por outro lado, procuravam construir um regime político democrático de tipo novo assente no protagonismo dos movimentos de libertação. Grande parte desta experimentação política colapsou durante a década de 1980 por erros internos e pelo cerco do capitalismo global.

              1989 até hoje

              No período mais recente os traços mais significativos da política antissistêmica são os seguintes. Com o colapso da URSS pareceu que o mundo da democracia liberal tinha vencido a competição histórica entre sistemas e de maneira irreversível (“o fim da história”). Mas quem venceu? Como vimos, os dois pilares da luta antissistêmica foram nos últimos 150 anos o capitalismo/colonialismo e a democracia liberal. Em 1989 venceram o capitalismo e a democracia conjuntamente? Ou a democracia à custa do capitalismo? Ou, ainda, o capitalismo à custa da democracia? Para responder a estas perguntas é necessário examinar o que se passou no período anterior com os dois pilares e as mudanças convergentes que ocorreram neles.

              Tenhamos em mente que antes de 1945 o fascismo e o nazismo foram, em grande medida, uma resposta ao crescimento da militância das classes trabalhadoras (“a ameaça comunista”) combinado com altos níveis de desemprego e de inflação e o empobrecimento das grandes maiorias. Por sua vez, os limites da democracia liberal (limites do sufrágio, controle total das elites, ausência de políticas públicas universais) não permitiam nem gerir a conflitualidade social nem dar aos movimentos socialistas a oportunidade de consolidar alternativas. Era feroz o confronto entre dois tipos de alternativa: o reformismo e a revolução. Depois de 1945, e como resposta à consolidação do mundo sino-soviético, o mundo liberal dos países centrais procurou baixar a tensão entre democracia e capitalismo. Para isso, as classes capitalistas que o dominavam tiveram de fazer concessões inimagináveis no período anterior: impostos muito elevados, sectores estratégicos nacionalizados, co-gestão entre trabalho e capital nas grandes empresas (caso da então Alemanha Ocidental), direitos do trabalho robustos, políticas sociais universais (saúde, educação, sistema de pensões, transportes). Com isto surgiram amplas classes médias e foi com base nelas que o reformismo se consolidou. Na Europa Ocidental a compatibilidade entre democracia liberal e capitalismo ocorria por via da combinação de altos níveis de proteção social com altos níveis de produtividade. Nos EUA, o reformismo assumiu formas muito mais tênues. Ainda envolveu uma resposta à imaginada ameaça comunista (o macartismo), que aflorou na Alemanha Ocidental sob a forma de Berufsverbot (desqualificação para o exercício de certos cargos por parte dos comunistas e “extremistas radicais”). Mas a nova posição hegemônica dos EUA, a militância sindical e a pujança dos “trinta anos gloriosos” (1945-1975) garantiram a emergência de fortes classes médias.

              Este compromisso entre democracia e capitalismo, combinado com a desintegração da URSS, foi o que garantiu a queda, nos países centrais, dos movimentos antissistêmicos, tanto de esquerda como de direita. Este compromisso entrou em crise a partir de meados da década de 1970 com a primeira crise do petróleo e a crítica dos conservadores ao “excesso de direitos” da democracia (direitos laborais, econômicos e sociais). A crise aprofundou-se dramaticamente depois de 1989. Em retrospecto pode dizer-se que em 1989 os derrotados foram tanto o comunismo soviético como a social democracia. Quem venceu foi o capitalismo à custa da democracia. Essa vitória traduziu-se na emergência de uma nova versão do capitalismo, o neoliberalismo assente na desregulação da economia, na demonização do Estado e dos direitos laborais, econômicos e sociais, na privatização total da atividade econômica e na conversão dos mercados em regulador privilegiado tanto da vida econômica como da vida social. O neoliberalismo começou por ser violentamente ensaiado no Chile e noutros países do Sul Global, presidiu às transições democráticas no sul da Europa na década de 1970 e na América Latina na década de 1980.

              Até então o Estado democrático ou social de direito era a expressão da compatibilidade possível entre democracia e capitalismo. A partir de 1989, a democracia passou a estar subordinada ao capitalismo e a ser defendida apenas na medida em que defendesse os interesses do capitalismo, a chamada “market friendly democracy”. A ela se contrapôs a social democracia que von Hayek caracterizara como “democracia totalitária”. Como o objetivo principal é a defesa do capitalismo, sempre que a burguesia nacional/internacional o considera em perigo a democracia deve ser sacrificada, um sacrifício que, segundo as circunstâncias, tanto pode ser total (ditaduras militares ou civis) como parcial (Itália do pós-guerra, golpes jurídico-parlamentares dos nossos dias). A diplomacia e a contra-insurgência norte-americanas têm sido os grandes promotores globais desta ideologia.

              Os movimentos antissistêmicos

              E os movimentos antissistêmicos neste último período? É de novo necessário distinguir entre movimentos de esquerda e de direita. Quanto aos movimentos de esquerda, os antigos movimentos revolucionários converteram-se em partidos democráticos e reformistas. A luta anticapitalista converteu-se na luta por amplos direitos econômicos, sociais e culturais, e a luta antidemocracia liberal converteu-se na luta pela radicalização da democracia: a luta contra a degradação da democracia liberal, a articulação entre democracia representativa e democracia participativa, a defesa da diversidade cultural, a luta conta o racismo, o sexismo e o novo/velho colonialismo. Estes partidos deixaram, pois, de ser antissistêmicos e passaram a lutar pelas transformações progressistas do sistema democrático liberal.

              Os movimentos antissistêmicos de esquerda continuaram a existir mas, por definição, fora do sistema partidário. E pode mesmo dizer-se que se ampliaram, dado o mal-estar social crescente causado pela subordinação incondicional da democracia ao capitalismo, traduzido em repugnante desigualdade social, discriminação racial e sexual, catástrofe ecológica iminente, corrupção endêmica, guerras irregulares, e ainda pela incapacidade dos partidos de esquerda de frearem esse estado de coisas. Aos antigos movimentos revolucionários e sindicais sucederam os novos movimentos sociais a nível local, nacional e mesmo global (Via Campesina, Marcha Mundial das Mulheres, e várias articulações globais surgidas dentro e fora do Fórum Social Mundial que se reuniu pela primeira vez em 2001 no Brasil). Novos acores sociais emergiram, nomeadamente os movimentos feministas, indígenas, ecológicos, LGBTIQ, de economia popular, de afro-descendentes. Muitos destes movimentos têm objetivos anticapitalistas e visam formas de democracia radical. Alguns deles têm conseguido realizar estes objetivos a nível local, transformando-se, assim, em utopias realistas. Até agora não lograram ter uma influência política mais consistente nem a nível nacional nem global por dificuldades nas articulações translocais e pelo fato de o sistema político democrático liberal estar monopolizado pelos partidos. São movimentos pacíficos, guiados pela ideia de democracia de base intercultural, e pela valorização das economias populares e dos saberes ancestrais das comunidades camponesas, indígenas e, no contexto americano, afro-descendentes.

              Por sua vez, os movimentos antissistêmicos de direita (a extrema-direita) ganharam igualmente um novo ímpeto no último período. A derrota do nazismo e do fascismo (em Portugal e Espanha, só entre 1974-1976) foi avassaladora. Quando sobreviveram foi de forma muito atenuada, como no caso do peronismo na Argentina e do varguismo no Brasil, sem ditadura nem glorificação da violência política nem ódio racial. Foi este sistema híbrido que se designou originalmente por populismo. Depois de 1989, assistimos à emergência ou crescente visibilidade de grupos de extrema-direita, quase sempre envolvidos em retórica e ações de ódio e violência racial. Em 2020, segundo um relatório da plataforma Antifa Internacional, houve 810 ataques provocados por “fanáticos, fascistas e violência de extrema-direita” de que resultaram 325 mortes. Muitos destes movimentos mantiveram-se na ilegalidade ou exploraram zonas cinzentas ou híbridas que tenho designado por alegalidade. Nos últimos vinte anos estes grupos assumiram nova agressividade, procuraram a legalidade e a própria conversão sistêmica ao converterem-se em partidos, que conseguiram legalizar com artifícios de linguagem e com a cumplicidade dos tribunais. Quando isto aconteceu, mantiveram estruturas clandestinas formalmente separadas da estrutura partidária, mas organicamente articuladas como fontes da mobilização política que os partidos por si não têm capacidade de garantir. Com a chegada de Donald Trump ao poder os movimentos de extrema-direita ganharam um novo fôlego e diversificaram-se internamente. Os grupos de extrema-direita e as milícias norte-americanas tinham, entretanto, aumentado, sobretudo depois que Barak Obama chegou ao poder. O respeitado Southern Poverty Law Center identificou, em 2018, 1.020 “grupos de ódio”. Alguns são názis, estão fortemente armados e reivindicam-se da herança dos movimentos de linchamento racial do século XIX (o Ku Klux Klan). Fora dos EUA, grupos paramilitares e milícias na Colômbia, Brasil, Indonésia e Índia chegam perto do poder institucional. Por outro lado, assumiram uma dimensão global que antes não existia ou não era visível. O agente mais visível desta promoção, na Europa e nas Américas, é Steve Bannon, uma figura sinistra e criminosa que tem sido bajulada pela comunicação social ingênua ou cúmplice.

              Estes movimentos conquistam espaço social, não graças à exaltação dos símbolos názis (a que também recorrem), mas por meio da exploração do mal-estar social que a subordinação crescente da democracia ao capitalismo provoca. Ou seja, exploram as mesmas condições sociais que mobilizam os movimentos antissistêmicos de esquerda. Mas, enquanto para estes o mal-estar social decorre precisamente da sujeição da democracia às exigências do capitalismo, exigências cada vez mais incompatíveis com o jogo democrático, para os movimentos de extrema-direita o mal-estar decorre da democracia e não do capitalismo. É, por isso, que, tal como na década de 1930, a extrema-direita é acarinhada, protegida e financiada por setores do capital, sobretudo pelo capital financeiro, o mais antissocial de todos.

              Duas perguntas surgem neste contexto. Primeira: por que é que reemerge agora a extrema-direita se, ao contrário dos anos 1920-1930, não há ameaça comunista nem grande militância sindical? Esta ameaça era uma das respostas à grave crise social e econômica que se vivia então. Hoje essa resposta não existe, mas a crise dos próximos anos ameaça ser tão grave quanto a daqueles anos. Os think tanks capitalistas globais (incluindo os chineses) têm vindo a assinalar o perigo de desestabilização política decorrente da iminente crise social e econômica, agora agravada com pandemia. Sabem que a ausência de alternativas anticapitalistas ou pós-capitalistas não é definitiva. A longo prazo, podem surgir e é melhor prevenir do que remediar. A resposta tem vários níveis. O mais profundo é o aperfeiçoamento do capitalismo de vigilância que, com a quarta revolução industrial (inteligência artificial), torna possível desenvolver controles eficazes da população. A nível mais superficial, promove-se a ideologia intimidatória, antidemocrática, racista e sexista. A linguagem do passado é, neste caso, mais eficaz que a do presente e, por isso, a retórica de extrema-direita fala do novo perigo comunista, que tanto vê nos governos democráticos como no Vaticano do Papa Francisco. Nos EUA, o Partido Democrático, de centro-direita, é invectivado como esquerda radical, confusamente ligada ao grande capital e às tecnologias de informação e de comunicação. No Brasil, a extrema-direita instalada no poder federal fala do perigo do “marxismo cultural”, um slogan názi para demonizar os intelectuais judeus. O que se pretende é maximizar a coincidência da democracia com o capitalismo através do esvaziamento do conteúdo social da democracia, fraca em proteção e forte em repressão. Os think tanks sabem que todos estes planos são contingentes e que os movimentos antissistêmicos podem lançá-los no lixo da história. Daí que mais valha prevenir que remediar.

              Segunda pergunta: a extrema-direita tem ou não uma vocação fascista? A extrema-direita não é monolítica nem se pode avaliar exclusivamente pela sua face legal. Daí a complexidade do julgamento. A história ensina-nos duas coisas. A democracia liberal não sabe defender-se dos antidemocratas e, aliás, desde 1945, nunca como hoje se viu com tanta frequência antidemocratas serem eleitos para altos cargos. São antidemocratas porque, em vez de servirem a democracia, servem-se dela para chegar ao poder (tal como Hitler) e, uma vez no poder, nem o exercem democraticamente nem o abandonam pacificamente se perderem as eleições. Contam inicialmente com o apoio das mídias convencionais e, a partir de certo momento, com os seguidores nas redes sociais, intoxicados pela lógica da pós-verdade e dos “fatos alternativos”.

              Mesmo antes de qualquer desenlace ditatorial, a extrema-direita de hoje tem dois dos componentes fundamentais do názi-fascismo: a glorificação da violência política e o discurso do ódio racial contra as minorias. Falta apenas a ditadura, mas alguns elogiam a tortura (Jair Bolsonaro no Brasil) e promovem as execuções extra-judiciais (Rodrigo Duterte nas Filipinas). O perigo destes dois componentes pode ser maximizado por três fatores. Primeiro, a cumplicidade dos tribunais com um entendimento equivocado (ou pior) da liberdade de expressão. Segundo, o deslumbramento das mídias com a retórica “pouco convencional” dos proto-fascistas e o protagonismo dos ideólogos de direita que separam artificialmente a mensagem política, que aprovam, do que consideram ser excessos descartáveis (prisão perpétua, esterilização de pedófilos, deportação de imigrantes, segregação das minorias), silenciando que são precisamente estes “excessos” que atraem parte dos seguidores. Terceiro, a legitimação que lhes é dada por políticos de direita moderada, transformando-os em parceiros de governo na esperança de poder moderar tais excessos. Na Alemanha pré-názi ficou tristemente famoso Franz von Pappen que, em 1933, teve um papel crucial em vencer a resistência do Presidente Paul von Hindenburg em nomear Hitler para o cargo de chefe do governo e, tendo ele próprio integrado esse governo, se mostrou totalmente incapaz de controlar o “dinamismo” golpista názi.

              A defesa da democracia

              A defesa de democracia contra a extrema-direita passa por muitas estratégias, umas de curto prazo, outras de médio prazo. A curto prazo, ilegalização, sempre que a Constituição é violada, isolamento político e atenção à infiltração nas forças policiais, no exército e nas mídias. A médio prazo, reformas políticas que reenergizem a democracia, políticas sociais robustas que tornem efetiva a retórica de “não deixar para trás” nem ninguém nem nenhuma região do país; num país como Portugal, fazer o julgamento político dos crimes do fascismo e do colonialismo para, com isso, descolonizar a história e a educação, promover novas formas de cidadania cultural e respeitar a diversidade que dela decorre. Acossada pela ideologia global da extrema-direita, a democracia morrerá facilmente no espaço público se não se traduzir no bem-estar material das famílias e das comunidades. Só assim a democracia impedirá que o respeito dê lugar ao ódio e à violência, e a dignidade dê lugar à indignidade e à indiferença.

               

              BOAVENTURA DE SOUSA SANTOS
              Doutorado em Sociologia do Direito pela Universidade de Yale e Professor Catedrático Jubilado da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra. Diretor do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra e Coordenador Científico do Observatório Permanente da Justiça Portuguesa.
              Fonte: Outras Palavras, por Boaventura de Souza Santos

               

              Leia também:

              Boaventura: o Fado Bicha como metáfora de Portugal

              Da Ilha da Maré a outro mundo possível. Artigo de Boaventura de Sousa Santos

              O colonialismo insidioso, por Boaventura Sousa Santos

              Tags: Boaventuracapitalismodemocraciaextrema direita
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              • Na coluna desta semana, Marina Vieira de Carvalho investiga a trajetória da poeta Gilka da Costa Machado e a luta pelo reconhecimento da produção intelectual das mulheres negras no pós-abolição. A despeito da qualidade de suas letras, Gilka não escapou ao silenciamento imposto pela sociedade patriarcal brasileira. Esse silenciamento, observado na trajetória de Gilka, é presente, ainda hoje, no desafio enfrentado pelas intelectuais negras contemporâneas. Mas o texto (re) apresenta Gilka da Costa Machado e a potência de sua obra feminista ao público. Confira um trecho do artigo"Musas Negras: raça, gênero e classe na vida de Gilka da Costa Machado":"Imagine o escândalo que foi (e ainda é para muitas pessoas) a visibilidade de uma mulher cujos poemas não eram considerados"femininos" - como as"flores", o"lar", o"recato" - e sim de letras deliberadamente eróticas. E se essa escritora, além disso tudo, fosse afro-brasileira e periférica? Aí começamos a entender os significados dos medos e esperanças que atravessam a revolução chamada Gilka da Costa Machado". Acesse o texto e o vídeo completos no Portal Geledés e no Acervo Cultne. https://youtu.be/GAwq2GaugGY A Coluna Nossas Histórias é uma parceria entre a Rede de HistoriadorXs NegrXs, o Geledés e o Acervo Cultne. #Raça #Genero #Classe #GilkadaCostaMachado #EscritorasNegras #HistoriadorasNegras #NossasHistórias
              • O Itaú Cultural lança, em seu site www.itaucultural.org.br, a publicação Ocupação Itaú Cultural 50 – uma celebração, que comemora a marca de 50 exposições, alcançada em dezembro de 2020, desta série realizada pela organização desde 2009. Saiba mais em www.geledes.org.br
              • A designer Taís Nascimento faz uma análise de sobre a importância de mulheres negras ocuparem o mercado tecnologico Confira um trecho:"A imagem da mulher negra não está associada à imagem do sucesso profissional, das profissões mais bem remuneradas e ainda mais longe está das ciências e da tecnologia. Dito isto, entendo que antes de pensar nós mulheres negras enquanto trabalhadoras da tecnologia é importante refletir sobre nós mulheres negras na sociedade..." Leia o artigo completo em: www.geledes.org.br A seção Coletiva Negras que Movem (@negrasquemovem), traz artigos de integrantes do Programa de Aceleração do Desenvolvimento de Lideranças Femininas Negras: Marielle Franco, do Fundo Baobá (@fundobaoba).
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              • "A Poesia Slam de autoria negra refere-se à busca por tudo que foi apagado ou minimizado pela escravidão. No slam, o apelo da alma desafiada pelas violências sociais é ouvido, mais do que isso, é aprendido e refletido por variadas pessoas." Leia o Guest Post de Natali Chaves Mota em www.geledes.org.br
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              Senado aprova formulário de registro de violência doméstica e familiar

              16/04/2021
              Primeiro dia do circuito comercial do documentário "O Caso do Homem Errado" Imagem: Reprodução/Facebook

              Um casulo, diversas borboletas e muitos conteúdos nacionais

              16/04/2021

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