Carnaval do Rio terá a primeira mulher como mestre de bateria

Ela mede 1,62m e pesa 50kg, mas vira uma gigante quando está à frente dos cem ritmistas da escola de samba Feitiço do Rio. Thaís Rodrigues, de 30 anos, promete roubar a cena no carnaval carioca ao desempenhar uma função historicamente delegada aos homens: a de mestre de bateria.

Por Pedro Zuazo, do Extra 

Thaís Rodrigues é diretora de surdo na Acadêmicos da Rocinha, toca o instrumento na Unidos da Tijuca e comanda a bateria da Feitiço do Rio Foto: Leo Martins / EXTRA

Thaís será empossada neste domingo como mestre da Bateria Feiticeira. A escola, que disputará a Série E do carnaval, vai desfilar no dia 9 de março, na Estrada Intendente Magalhães, em Campinho, na Zona Norte.

Criada em uma família envolvida com o mundo carnavalesco, Thaís passou a frequentar os ensaios da Acadêmicos da Rocinha em 2003. Levada por um tio a um evento da escola de São Conrado, ela pegou um chocalho e acompanhou os ritmistas. O mestre de bateria gostou de sua desenvoltura. Naquele mesmo ano, ela já cruzou a Avenida pela primeira vez tocando um instrumento e nunca mais parou.

Atualmente, a jovem é diretora de surdo na bateria da Rocinha, que disputa a Série A, e toca o surdo de terceira na Unidos da Tijuca, agremiação do Grupo Especial. As duas escolas desfilam na Sapucaí. E a mestre de bateria da Feitiço do Rio garante que viver num universo onde os homens são maioria não é problema, porque ela sempre foi respeitada.

— Muitas meninas se espantam por eu ser a única menina no meio de um montão de homens tocando surdo, mas eu me divirto. Viro uma moleca. Eles brincam comigo e eu com eles. Sempre me respeitaram muito. No início recebi alguns olhares atravessados por tocar um instrumento pesado, mas com o passar do tempo eles me conheceram e aquilo passou — conta a mestre.

A aparência de Thaís engana. Apesar da silhueta fina, ela está acostumada a carregar instrumentos que pesam até 18kg na Avenida, mas ainda há quem duvide.

— Já aconteceu demais. Uma vez, quando ia gravar uma vinheta, fui pegar o surdo e alguém da produção perguntou se aquele era mesmo o meu instrumento. Normalmente acham que as mulheres só tocam chocalho ou tamborim e se espantam comigo. ‘Você, tão esmirradinha, tão magrela, toca o surdo?’. Hoje em dia eu não me incomodo mais. Simplesmente pego o instrumento e mostro o que sei fazer — diz.

Tradicionalmente, as mulheres sempre tiveram destaque à frente de baterias de escolas de samba, mas no posto de rainha ou princesa. Atualmente, já se tornou comum ver mulheres tocando instrumentos nos desfiles, mas ainda é raro encontrá-las comandando os ritmistas. No município de Campo Grande, em Mato Grosso do Sul, Nayara Thomas, de 24 anos, roubou a cena em 2015 ao se tornar mestre de bateria do G.R.E.S Igrejinha. Na capital carioca, a jovem Érica Santos atraiu os holofotes, em 2014, ao comandar a bateria da escola mirim da Unidos de Vila Isabel, a Herdeiros da Vila.

Embora não seja comum encontrar mulheres no posto de mestre de bateria, elas aparecem aos montes entre os ritmistas e até em cargos de diretoria. Uma das ritmistas mais antigas do carnaval carioca, Neide Tamborim, de 56 anos, que desde a década de 1970 toca o instrumento que virou seu sobrenome na Beija-Flor, ficou feliz ao saber que o Rio ganhará uma mestre de bateria.

— Quando comecei a tocar tamborim na Beija-Flor, há 41 anos, praticamente não tinham mulheres na bateria. Havia muito preconceito. Imagina, quatro décadas atrás, uma mulher entrar em um espaço dominado por homens! Hoje, esse quadro está mudando e fico feliz de saber que teremos uma mulher mestre de bateria. Ela já tem uma torcedora — vibra Neide.

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