12 de novembro de 2025. Policiais militares entram armados na Escola Municipal Antônio Bento, localizada no Butantã, zona oeste de São Paulo. Desavisados poderiam imaginar que a ação desmedida (armas numa escola são coisas que não combinam em lugar algum) tivesse como objetivo interceptar a venda de drogas, ou então era o fechamento de uma investigação que desmantelava uma quadrilha que aliciava crianças e jovens. Mas não… o motivo era muito mais grave.
Como parte das atividades propostas para o grupo de ensino infantil, uma das crianças fez um desenho de Iansã – a orixá dos ventos e tempestades – no mural da escola. Ao saber que o desenho integrava um conjunto de atividades pedagógicas sobre religiões de matriz africana, o pai da criança procurou a polícia. Isso mesmo.
Alegando que religiões de matriz africana não deveriam fazer parte das atividades escolares, o pai deu queixa na polícia que achou que havia motivos suficientes para mandar quatro policiais até a escola – segundo testemunhas, um deles estaria portando uma metralhadora – para questionar a direção sobre o verdadeiro teor da atividade.
É difícil dissecar as muitas camadas de absurdo desse caso. Um pai que não entende a importância de sua filha – matriculada numa escola pública e laica – conhecer a diversidade com a qual a humanidade estabeleceu sua relação com o divino. Um pai que deve ignorar como o culto aos orixás foi fundamental para a construção e a resistência do maior percentual da população brasileira. No entanto, esse pai ocupa um lugar pequeno nessa escalada de absurdos.
Quatro policiais decidiram que a queixa tinha relevância. Nem um, nem dois: quatro. Quatro servidores públicos que ignoram ou simplesmente desconsideram por completo a existência de uma lei, promulgada em 2003 e ampliada em 2008, que OBRIGA que as escolas brasileiras (públicas e privadas) ensinem história e cultura africanas, afrobrasileiras e indígenas. No linguajar militar: a escola estava apenas cumprindo seu dever.
Nem isso esses policiais conseguiram enxergar, porque, para muitos brasileiros, é simplesmente insuportável conviver com qualquer manifestação que celebre as religiões afrobrasileiras ou afirme positivamente a presença negra na história e na cultura do país.

alizado na região da atual Alagoas. Recusando-se a ceder às pressões do rei português e às tropas coloniais, Zumbi foi assassinado em 20 de novembro de 1695, tornando-se símbolo da resistência negra à escravidão e à opressão.
O reconhecimento nacional da data ganhou grande impulso com a Marcha Zumbi dos Palmares, realizada em 20 de novembro de 1995, em Brasília. A marcha reuniu cerca de 30 mil pessoas e marcou os 300 anos da morte de Zumbi. Organizada por diversas entidades do movimento negro, a mobilização pressionava o Estado brasileiro por políticas públicas de combate ao racismo, igualdade de oportunidades e valorização da cultura afrobrasileira.
Esse ato histórico consolidou o 20 de novembro como uma data de luta e memória, e foi um marco na institucionalização das pautas do movimento negro no país. Depois da consolidação dessa data pelos movimentos negros, outras conquistas importantes foram feitas, dentre elas a promulgação da já citada Lei 10.639/2003 e das cotas raciais para as universidades públicas. Exemplos de que é o Brasil todo que ganha com o Dia da Consciência Negra .
Mestre e doutora em História Social pela USP, Ynaê Lopes dos Santos é professora de História das Américas na UFF. É autora dos livros Além da Senzala. Arranjos Escravos de Moradia no Rio de Janeiro (Hucitec 2010), História da África e do Brasil Afrodescendente (Pallas, 2017), Juliano Moreira: médico negro na fundação da psiquiatria do Brasil (EDUFF, 2020) e Racismo brasileiro: Uma história da formação do país (Todavia, 2022), e também responsável pelo perfil do Instagram @nossos_passos_vem_de_longe.