Após 83 dias de investigações, mais de 100 pessoas ouvidas e um volume de aproximadamente 9 mil documentos, a CPI das Universidades chegou ao seu final nesta semana na Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp). Foram 37 audiências que produziram um relatório final de 194 páginas, nas quais foram relatadas uma série de barbaridades vividas no mundo acadêmico paulista. Alguns dados espantam.
por Thiago de Araújo no Brasil Post
Um dos pontos mencionados no relatório é a suspeita de 112 estupros ocorridos apenas na Universidade de São Paulo (USP) nos últimos dez anos, com base em um trabalho realizado pela professora Maria Ivete Castro Boulos, da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP). A maior instituição universitária da América do Sul, aliás, foi o carro-chefe dos trabalhos, que se estenderam a instituições do interior paulista.
“O que mais acho urgente é tirar tudo o que ocorre nos trotes violentos do atentado violento ao pudor, de elevar à categoria de tortura. Trote é uma forma de tortura”, disse o presidente da CPI, deputado Adriano Diogo (PT), também presidente da Comissão de Direitos Humanos (CDH) da Casa. Foi lá, após três audiências públicas, que surgiram denúncias de abusos cometidos na FMUSP, e que levaram à criação da CPI.
“A avaliação do aluno e da universidade é para quando ele for fazer concurso de admissão para bolsas, para financiamentos de pesquisa. Nenhum torturador que é treinado para ser torturador na escola pode ascender na carreira sem que apareça no seu currículo que ele participou de atividade de tortura. E como tortura não prescreve, é como nos crimes da ditadura: torturador tem que ficar marcado para o resto da vida, como as marcas que eles deixaram em seus torturados”, afirmou Diogo.
Além disso, o relatório final da CPI sugere que Centro Acadêmicos e Associações Atléticas sejam responsabilizados civil, penal e administrativamente por violações dos direitos humanos em festas ou eventos fora do campus. Isso vale para o polêmico Show Medicina – cujos trechos inéditos foram exibidos durante a sessão final da comissão – e atividades esportivas que descambam para violência, como a Intermede a Calomed.
“Vou encaminhar o relatório para a Promotoria de Justiça do Patrimônio Público e Social e para Promotoria de Direitos Humanos da Capital. Vamos compreender esse fenômeno e dessa compreensão tirar alguma providência que o Ministério Público possa adotar. As providências podem ser recomendações, termos de ajustamento de conduta, ajuizamento de ações civis públicas e o oferecimento de denúncias de natureza criminal”, comentou Rosa.
O relatório final também será enviado ao governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), ao Ministério da Educação (MEC), ao Congresso Nacional, à Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), à Corte Interamericana de Direitos Humanos da OEA e até mesmo ao Papa Francisco, já que há relatos assustadores envolvendo a unidade de Campinas da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), que tem ligação com a Igreja Católica.
Fim da ‘tradição’ na próxima legislatura
O deputado Carlos Giannazi (PSOL), um dos poucos integrantes da CPI a ter mandato na próxima legislatura, que começa no próximo domingo (15), se comprometeu a sugerir a formação de uma frente parlamentar contra o trote universitário e a criar uma subcomissão para dar prosseguimento aos trabalhos iniciados pela CPI. Para os parlamentares que deixam o Legislativo paulista, as descobertas da comissão são apenas a ‘ponta do iceberg’.
“(Sabe) qual é o maior problema? As universidades estão sempre do lado dos trotistas. Eles são os futuros dirigentes, serão aprovados nas melhores vagas na residência médica, eles serão promovidos nas escolas de engenharia como melhores gerentes, terão currículos para que as melhores empresas os contratem, porque os trotistas são os caras do silêncio criminoso, da cumplicidade. As universidades precisam se preparar para o que acontece fora da sala de aula. Educar não é só dar uma aula de biologia, de química, de matemática. Educar é uma coisa integral, e isso não ocorre (hoje)”, concluiu Diogo.
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