Vira e mexe nós encontramos pessoas que condenam a reserva de vagas em concursos públicos para pessoas negras. Conforme definido na Lei 12.990/2014, os certames na esfera federal do governo devem preservar 20% de suas vagas para pessoas pretas e pardas. São as famosas cotas raciais.
Muitas vezes, inclusive, eu vejo os termos “cota” ou “cotista” serem usados com cunho pejorativo. O que me intriga é que boa parte das pessoas que condenam as reservas têm uma elevada formação e, pasmem, nunca questionaram as cotas para brancos e ricos previstas desde a promulgação da Constituição Federal de 1988.
Não sabe do que eu estou falando? Deixe-me explicar. A CF/88 instituiu o chamado “Quinto Constitucional”, que reserva 1/5 das vagas nos tribunais regionais ou superiores para advogados e procuradores. Ou seja, eles podem se tornar desembargadores e julgar, primordialmente, os recursos interpostos contra as decisões das varas de primeira instância sem nunca terem sido juízes. Sem nunca terem feito concurso para a magistratura.
Agora me diz uma coisa: a maior parte dos advogados e procuradores é formada por que classe social? Pois é, apesar das mudanças, ainda temos uma maioria de brancos e ricos ocupando tais posições.
E por que eu nunca vi ninguém questionar isso? Afinal, 1/5 são os mesmos 20%. É por que o termo “quinto constitucional” é mais elegante do que “cotas”? Procuradores e advogados que entram no Poder Judiciário por meio do Quinto podem então ser considerados cotistas. Então quer dizer que cota para branco e rico pode, e para negro e pobre, não?
Só vou deixar explicado que não estou aqui condenando o Quinto. Ele pode sim cumprir o papel da pluralidade no Judiciário. O mesmo papel que a reserva para negros visa a cumprir. Só que na próxima vez que você achar justo questionar as cotas para negros, lembre-se também de questionar as cotas para as elites.