Em Robben Island, jogar futebol era um ato de resistência

No lugar onde Nelson Mandela foi preso durante a época do Apartheid, praticar o “balompié” se converteu no ato de resistência dos presos políticos. Desde o começo da Copa do Mundo a visita de jogadores e torcedores estrangeiros à ilha se multiplicaram ao ponto que muitos têm de reservar um lugar no ferry boat com vários dias de antecedência. Até o técnico da Holanda anulou uma sessão inteira de treinamento para ir com todo o time à ilha.

Pretoria. Durante o Mundial, os jogadores e turistas vão a Robben Island como numa visita de culto. No lugar onde Nelson Mandela ficou preso praticar futebol se converteu num ato de resistência dos presos políticos.

Nos anos sessenta, o complexo carcerário dessa ilha, a qual se chega em meia hora de ferry boat a partir da Cidade do Cabo, foi concebido para quebrar a resistência dos prisioneiros, tanto física como psicologicamente. Contudo, a paixão pelo futebol os ajudava a resistir.

Primeiro começaram a jogar de maneira discreta nas próprias celas, com bolas de trapos de pano ou de papel. Depois, graças à pressão da Cruz Vermelha Internacional, os presos adquiriram o direito a jogar no lado de fora, em campos improvisados. Em 1967, inclusive, os presos criaram sua própria federação, a “Makana Football Association”, cujo nome foi dado em homenagem a um profeta xhosa enviado à ilha em 1819 por se opor à colonização britânica, que se afogou tentando fugir de seu exílio compulsivo.

A estrutura aplicava ao pé da letra as mesmas regras da Federação Internacional de Futebol (FIFA), publicando todos os relatórios em suas reuniões, dando uma classificação oficial de seu campeonato e registrando por escrito as eventuais “transferências”.

Depois de se ter revelado um zagueiro rude mas disciplinado, o atual presidente sulafricano Jacob Zuma, que “residiu” durante uma déada em Robben Island se converteu em árbitro da Makana FA.

O mais ilustre dos presos da ilha, Nelson Mandela, que passou 18 de seus 27 anos de cativeiro lá, nunca pôde jogar, porque sua situação era de isolamento absoluto.

“Ele tinha o costume de nos observar da janela de sua cela, sobre uma cadeira ou uma caixa. Mas finalmente também isso lhe tiraram, comentou Mark Shinners, que foi hóspede durante 23 anos em Robben Island.

Em dezembro passado, a FIFA homenageou a todos os presos políticos do Apartheid ao organizar seu Congresso executivo na ilha.

“Em Robben Island se escreveu uma página da história da humanidade, uma página importante. Entre as coisas que os ajudaram a suportar (as condições do cativeiro) esteve a criação da Makana Football Association”, destacou na ocasião o presidente da FIFA, Joseph Blatter.

Desde o começo da Copa do Mundo a visita de jogadores e torcedores estrangeiros à ilha se multiplicaram ao ponto que muitos têm de reservar um lugar no ferry boat com vários dias de antecedência.

Além disso, em sinal de respeito, um grupo de torcedores ingleses fixou sua bandeira no que foi o jardim de Mandela. Até o técnico da Holanda anulou uma sessão inteira de treinamento para ir com todo o time à ilha.

Os jogadores puderam visitar as celas e a cancha de areia onde os presos políticos jogavam. “Quando abrimos o portão (de acesso), e sabendo de tudo o que ocorreu aqui, o silêncio se abateu sobre todos nós”, destacou o meio campo da “Orange” Mark van Bommel.

Tradução: Katarina Peixoto

 

Fonte: Carta Maior

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