Passei a semana passada viajando pelos Estados Unidos da América. Foi uma experiência marcante em minha vida, sobretudo para quem esteve pela primeira vez em solo americano. Inicialmente estive na cidade de Nova York, local que impacta todo visitante inexperiente como eu, marcado pelos seus imponentes arranha-céus e seus letreiros em neons. Em seguida, conheci a capital do país, Washington, DC.
Minha viagem se deu por uma circunstância muitíssimo especial: participei do colóquio literário intitulado “Carolina de Jesus, a escritora do Brasil”, sobre a vida e a obra da escritora mineira Carolina Maria de Jesus (1914-1977), em três instituições americanas diferentes. Os dois primeiros ocorreram na Universidade de Columbia e na The People’s Forum, uma organização não-governamental que luta por questões de direitos humanos. O terceiro, não menos importante, aconteceu no imponente campus da Universidade de Georgetown, na capital do país.
Esta não é a primeira vez que Carolina Maria de Jesus é alvo de debates e atenção nos Estados Unidos. Em 1962, quando da tradução do seu livro, então best-seller por aqui, “Quarto de Despejo”, por lá conhecido popularmente como “Child of the Dark”, ela foi notícia nos principais e mais importantes veículos de imprensa locais, a exemplo do New York Times Book Review e da revista Times.
Falando para professores, estudantes, ativistas afro-americanos e brasileiros residentes no exterior, constatei o interesse ainda bastante vivo pela literatura e pelo legado de vida deixado pela escritora brasileira. Nas três ocasiões, dividiu o centro dos debates comigo a filha da escritora, a professora paulistana Vera Eunice de Jesus Lima, que trouxe depoimentos marcantes sobre a trajetória da mãe, do nascimento na cidade mineira de Sacramento à favela do Canindé, em São Paulo, onde foi descoberta pelo repórter Audálio Dantas, responsável pela publicação dos seus primeiros livros no Brasil.
Carolina Maria de Jesus é, diferente de muitas autoras brasileiras, sobretudo negras, uma das mais editadas fora do nosso país. Até hoje, o seu livro “Quarto de Despejo” continua sendo estudado nas universidades americanas, como Columbia e Georgetown.
O movimento social negro de mulheres, tendo à frente as ativistas brasileiras Suzane Senna, empreendedora ligada à organização cultural Osupa Production, a professora Ana Cláudia Dias, a produtora Luciana Kornaleswski e a multiartista Nalü Romano —estas do coletivo Mulheres da Escrita, integrado por jovens autoras de língua portuguesa—, tem pautado ações e iniciativas para promover e projetar a literatura de afrobrasileiras no país americano.
Todas as atividades contaram com o apoio de instituições culturais americanas e da diplomacia brasileira, através do consulado e da nossa embaixada. Foi possível absorver parte do clima beligerante da campanha presidencial, na disputada polarizada entre Kamala Harris e Donald Trump, com manifestações de rua e exposição das marcas partidárias dos dois candidatos à presidência.
Outro ponto marcante de minha ida aos EUA foi a visita à ONU (Organização das Nações Unidas), onde conheci a obra “Guerra e Paz”, do extraordinário brasileiro Cândido Portinari, acompanhado do filho do pintor João Cândido Portinari e as instalações do National Museum of African American History & Culture, em Washington, DC. Foi, de fato, uma viagem marcante.
Tom Farias – Jornalista e escritor, é autor de “Carolina, uma Biografia” e do romance “Toda Fúria”