Extermínio oficialmente anunciado

Sobre mortes pela polícia no Brasil, já ouvi de tudo. Mas nada tão sinistro como as declarações do secretário estadual da polícia civil do Rio de Janeiro, delegado Marcus Vinícius de Almeida Braga, neste mês de agosto de 2019. Sua Excelência proferiu que “o número de mortes provocadas por policiais deve aumentar até dezembro”. As razões que o secretário invoca para essa escalada criminosa são temerárias: “É um número que a tendência é subir até dezembro porque as ações estão sendo feitas. Sem citar dados, declarou que o número das mortes ainda é “alto” e “não é um número que a gente deseja”.

Por Paulo Sérgio Pinheiro, da Comissão Arns

Logo Comissão Arns

Os números – que a gente não deseja – são 434 execuções de janeiro a março deste ano, em média de sete mortes por dia pela polícia militar. Em 2018, foram 368 , o maior índice nos últimos 21 anos. E essas mortes correspondem a 40% dos homicídios no Rio de Janeiro e na Grande Niterói. Não há cidade, não há país no mundo (exceto talvez as Filipinas) que apresente tais números.

Essa previsão macabra do delegado escancara uma política de governo de execuções extrajudiciais baseada na tolerância e na impunidade das mortes. Não há nenhuma ligação direta entre mortes e eficiência no enfrentamento com a criminalidade. Como lembra o sociólogo Sebastian Roche, “uma boa polícia é antes de mais nada uma polícia que não mata nem fere, não uma polícia que mata e fere legalmente”.

Tais números são a estatística de uma política de segurança incompetente e criminosa, que põe em risco as vidas dos policiais e a população que habita nas favelas. E que não debela as organizações criminosas nem garante maior segurança para a população. Esse extermínio atinge principalmente adolescentes e jovens negros, alvos do racismo, do apartheid por parte das classes médias e dominantes brancas em relação à população das favelas – em sua quase totalidade, trabalhadores e respeitadores da lei.

É lamentável e deprimente que 30 anos de governos democráticos nas esferas federal e estaduais não conseguiram estancar essa mortandade porque não puderam ou não quiseram impor controles efetivos sobre a polícia através das instituições do Ministério Público e da Justiça, fortalecidos pela Constituição de 1988. Claro que a polícia vai sempre usar a força, mas o que vai qualificar seu caráter democrático é o controle, para citar Roche mais uma vez: “A distinção entre ditadura e democracia não se deve apenas ao nível de violência da política, mas à realidade do controle de suas ações”.

Justamente o que já está consolidado no Rio de Janeiro é a total falta de controle sobre a polícia. A licença para matar proposta pelo pacotão de Sérgio Moro virá legalizar de vez as execuções extrajudiciais pelas polícias militares no Rio e no Brasil, na transição lenta, gradual e segura da democracia para a ditadura.

Paulo Sérgio Pinheiro é integrante da Comissão Arns, cientista político, ex-ministro da Secretaria de Estado de Direitos Humanos.

+ sobre o tema

Era do rádio particular – por Cidinha da Silva

  Minha era do rádio durou da infância aos primeiros...

Brazil Progresso vs. Brasil Parasita ?

Por: Vitor Miranda Eu não gosto de comentar futebol junto com...

Combater desastres demanda análise de projeções climáticas

Em 1993, o número de desastres geológicos, hidrológicos, meteorológicos,...

Sem Multas: Liminar suspende propaganda partidária do PSDB em São Paulo com Serra

Uma liminar suspendeu nesta sexta-feira a veiculação da propaganda...

para lembrar

O voto como resposta

por: Carla Kreefft Em tempo de eleição e com...

Após 1 ano, mortes na Providência não tiveram indenização

Fonte: Folha de São Paulo -   Justiça determinou pensão...

Deputadas do PCdoB afirmam que votarão contra a PEC 37

As deputadas do PCdoB Jô Moraes (MG) e...

Homicídios são a principal causa de morte de crianças e adolescentes, diz estudo

Por dia, 29 crianças e adolescentes são assassinadas no...

Conselho de direitos humanos aciona ONU por aumento de movimentos neonazistas no Brasil

O Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH), órgão vinculado ao Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, acionou a ONU (Organização das Nações Unidas) para fazer um alerta...

Seminário promove debate sobre questões estruturais da população de rua em São Paulo, como moradia, trabalho e saúde

A Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), a Comissão de Defesa dos Direitos Humanos D. Paulo Evaristo Arns – Comissão Arns...

Dissecando a Operação Vingança

A política de olho por olho, dente por dente nas ações da polícia de São Paulo só tem feito aumentar a violência, provocando a intensificação...
-+=